A minha cela levou hoje uma barrela mestra!
Durante três horas andaram dois presos encarrapitados num escadote, e a palmilhar a lagariça do chão, descalços, encharcados até aos ossos, numa esfrega desenfreada de escova, pano, sabão e potassa, que deixou tudo num brinquinho, do tecto à porta!
Como não eram obrigados a tanto esforço, disse-lhes que ia entregar 3 escudos à Secretaria, onde eles poderiam recebê-los.
-- Nada, não senhor! responderam ambos. Não iremos!
Insisti. Mostrei-lhes que a fartura não era grande, que nada os obrigava ao que tinham feito, que estavam ambos exaustos de cansaço.
-- Muito agradecido, atalharam eles mantendo a sua recusa. Isto que nós fizemos não é nada...
-- Não nos deu trabalho algum, acrescentou o mais velho, arfando de fadiga.
Ainda tentei convencê-los. Não houve meio. Mantiveram-se intransigentes.
-- E além disso, concluiu um deles com ar embaraçado, nem era bonito a gente aceitar...
Intrigado, perguntei-lhe porquê.
-- Porque a gente sabe muito bem que o senhor... o senhor também vive com dificuldades!
E sem quererem ouvir mais, deitaram o escadote aos ombros e abalaram pela porta fora, a escorrer como uns pintos!
Um deles, por alcunha o Marreco, está condenado por ladrão.
O outro, por alcunha o Bilau, está condenado por incendiário. (*)
(*) -- Este Bilau era um recluso com bom comportamento. Condenado por crime de fogo posto num palheiro, jurava estar inocente, e o seu co-réu, autor do crime, confirmou sempre a verdade desse juramento. Bilau tentou a revisão do processo, mas faltaram-lhe os meios para isso. Morreu em 1929.
O outro ainda se encontra preso e é igualmente bem comportado.
Durante três horas andaram dois presos encarrapitados num escadote, e a palmilhar a lagariça do chão, descalços, encharcados até aos ossos, numa esfrega desenfreada de escova, pano, sabão e potassa, que deixou tudo num brinquinho, do tecto à porta!
Como não eram obrigados a tanto esforço, disse-lhes que ia entregar 3 escudos à Secretaria, onde eles poderiam recebê-los.
-- Nada, não senhor! responderam ambos. Não iremos!
Insisti. Mostrei-lhes que a fartura não era grande, que nada os obrigava ao que tinham feito, que estavam ambos exaustos de cansaço.
-- Muito agradecido, atalharam eles mantendo a sua recusa. Isto que nós fizemos não é nada...
-- Não nos deu trabalho algum, acrescentou o mais velho, arfando de fadiga.
Ainda tentei convencê-los. Não houve meio. Mantiveram-se intransigentes.
-- E além disso, concluiu um deles com ar embaraçado, nem era bonito a gente aceitar...
Intrigado, perguntei-lhe porquê.
-- Porque a gente sabe muito bem que o senhor... o senhor também vive com dificuldades!
E sem quererem ouvir mais, deitaram o escadote aos ombros e abalaram pela porta fora, a escorrer como uns pintos!
Um deles, por alcunha o Marreco, está condenado por ladrão.
O outro, por alcunha o Bilau, está condenado por incendiário. (*)
(*) -- Este Bilau era um recluso com bom comportamento. Condenado por crime de fogo posto num palheiro, jurava estar inocente, e o seu co-réu, autor do crime, confirmou sempre a verdade desse juramento. Bilau tentou a revisão do processo, mas faltaram-lhe os meios para isso. Morreu em 1929.
O outro ainda se encontra preso e é igualmente bem comportado.
António Bandeira, os Grandes Armazéns da Desventura, Lisboa, Imprensa Libânio da Silva, 1931.
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