segunda-feira, maio 31, 2010

caderninho

Confiar-se a alguém é Natureza: acolher aquilo que se nos confiou, tal como foi transmitido, é Cultura. Goethe

Máximas e Reflexões (tradução de Afonso Teixeira da Mota)

sem bússola

«Entrámos no século sem bússola.», incipit do último livro de Amin Maalouf. A bússola era o socialismo, sequestrado pelo marxismo-leninismo nos países da órbita soviética, e suas dissidências. Após a derrocada, e a metamorfose chinesa, resta (resta?) o pensamento único e transnacional das corporações e as santas religiões. Contra isto, só um máximo de liberdade, o debate permanente, a multiplicação dos movimentos cívicos, culturais, ecológicos, a consciência e o empenho individual.

O Vale do Riff - Duke Robillard, «Blues For T-Bone»

e você?

também já foi sondado pela direita católica para candidatar-se à Presidência da República?

domingo, maio 30, 2010

Luís Má-Sorte

Louis La Guigne (em português, Luís Má-Sorte), grande bd, argumento de Frank Giroud e desenhos dos malogrado Jean-Paul Dethorey. Um saboroso misto de Bernard Prince e Corto Maltese.

Maio, maduro Maio

António José Saraiva, exilado em França, viveu o Maio de 68. Dele deixou testemunho em Maio e a Crise da Civilização Burguesa, que acabei há pouco de ler. Primeira impressão: o mesmo estofo intelectual que se vê nos seus trabalhos de história da cultura; o ex-militante comunista, tido por guardião da ortodoxia jdanovista nos tempos da Vértice, surge liberto, aspirando a grandes golfadas o ar livre da insurreição; clara atracção pelo anarquismo; crítica lucidíssima ao sovietismo.

releituras

Na Patagónia, de Bruce Chatwin, e O Papagaio de Flaubert, de Julian Barnes, dois dos primeiros títulos da Quetzal, em 1989. Comprei-os logo, seduzido pelo formato e fascinado pelas capas soberbas de Rogério Petinga. E não me arrependi. O livro de Barnes e uma digressão cheia de espírito pelo criador da Madame Bovary; o de Chatwin é talvez o mais fascinante livro de viagens que me foi dado ler. Voltei a pegar nele, vinte e um anos passados, e o encantamento ressurgiu de imediato.

sábado, maio 29, 2010

acordes diurnos

O Anjo de Auschwitz

Leio uma resenha biográfica da autoria de Elisa Areias, n' A Batalha, sobre Irena Sendler, a enfermeira polaca que salvou duas mil e quinhentas crianças do extermínio.
Quem não acredita em anjos? Eu acredito.

figuras de estilo - Artur Queiroz

Os tipos levavam um ar de justiça pré meditada.


Kapitupitu -- A Verdadeira Estória dum Anarquista Fuzilado

quinta-feira, maio 27, 2010

homenagens a Nicot

desenho de Carl Barks

O Vale do Riff - Jackie Paris, «Detour Ahead»

Quando Portugal desaparecer

Disse Bernard Emery, ontem, no colóquio sobre Ferreira de Castro: «Se Portugal desaparecesse, ficava o Manuelino...».
Quando Portugal desaparecer, quando o português for língua morta, o que fica? O Manuelino, sem dúvida; uma música estranha e plangente; versos soltos, bocados de poemas, alguns adágios, tal como hoje sucede com os autores latinos.
Quando Portugal desaparecer, só os vestígios do espírito, só a Arte deixará marcas palpáveis da existência de um povo.

quarta-feira, maio 26, 2010

terça-feira, maio 25, 2010

Um rio é a infância da água. As margens, o leito, tudo a protege. Na foz é que há a aventura do mar largo.
Ruy Belo

O Vale do Riff - America, «Horse With No Name»

segunda-feira, maio 24, 2010

Que l´ont vive à Paris on vit tous en province quand on vit trop longtemps
Jacques Brel

O Vale do Riff - Abel Ganz, «Launching The Albatross»

domingo, maio 23, 2010

sexta-feira, maio 21, 2010

(incon)sequências, (ex)citações

José Régio -- Na disposição de espírito em que viera, não só a tinham importunado, como quase assustado as insistentes atenções do cavalheiro amável. «Vêem uma rapariga só...» -- pensava ela com a sua psicologia de pouco afeita aos caminhos de ferro e aos desembaraços da mulher moderna. Agora, não havia perigo em compensar o seu aliás respeitoso admirador com esse olhar e um sorriso. -- Davam Grandes Passeios aos Domingos
Aquilino Ribeiro -- Abriu muito os olhos o abade e só então se apercebeu duma mocinha -- corpo que acaba de espigar na adolescência -- que às mãos ambas cobria o rosto e soluçava. -- Andam Faunos pelos Bosques
José Saramago -- E não faltam ao mundo cheiros, nem sequer a esta terra, parte que dele é e servida de paisagem. Se no mato morreu animal de pouco, certo que cheirará ao podre do que morto está. Quando calha estar quieto o vento, ninguém dá por nada, mesmo passando perto. Depois os ossos ficam limpos, tanto lhes faz, de chuva lavados, de sol cozidos, e se era pequeno o bicho nem a tal chega porque vieram os vermes e os insectos coveiros e enterraram-no. -- Levantado do Chão


O Vale do Riff - Ron Carter, «Bag's Groove»

quarta-feira, maio 19, 2010

Antologia Improvável #432 - Ed. Bramão de Almeida (5)

NOSTALGIA

Que linda, esta Avenida à Beira-mar
Contornando a formosa Guanabara!
A natureza, em tanto ponto avara,
Torna aqui prisioneiro o nosso olhar.

A famosa baía, à luz solar,
(Nunca o mar, como ali, me fascinara!)
Parece uma esmeralda imensa e rara,
Sob o fogo do céu a faiscar.

Trecho da natureza ainda vi
Que ao meu olhar enfeitiçasse tanto
Como o cenário que deparo aqui.

Perdão! Lembrou-me agora esse recanto
Da aldeia portuguesa onde nasci,
-- E já a Guanabara perde o encanto.

Maré Alta

O Vale do Riff - Anders Osborne, «Pleasin' You»

terça-feira, maio 18, 2010

caderninho

Procura-se retiros no campo, à beira-mar, na montanha; e também tu costumas desejar estas coisas no mais alto grau. Mas tudo isso é sinal de uma grande simplicidade de espírito, porque se pode, sempre que se queira, retirar em si próprio. Em parte alguma se encontra retiro mais tranquilo, mais isento de agitação, que na própria alma, sobretudo quando ela encerra esses bens sobre os quais basta a gente debruçar-se para recobrar logo toda a liberdade de espírito [...]. Marco Aurélio
Pensamentos para Mim Próprio (tradução de José Botelho)

O Vale do Riff - Dr. Ring Ding & The Senior All Stars, «Save a Bread»

domingo, maio 16, 2010

caracteres móveis - Amin Maalouf

Ou nós conseguimos neste século uma civilização comum com a qual cada um possa identificar-se, unificada pelos mesmos valores universais, guiada por uma fé poderosa da aventura humana e enriquecida com todas as nossas diversidades culturais, ou pereceremos juntos numa barbárie comum.


Um Mundo sem Regras
(tradução de Carlos Aboim de Brito)

sábado, maio 15, 2010

(incon)sequências, (ex)citações

Vitorino Nemésio -- Estavam quase ao alcance da respiração um do outro: ela debruçada num muro de pedra de lava; ele na rampa de terra que bordava a estrada ali larga, acabando com a fita de quintarolas que vinha das Angústias até quase ao fim do Pasteleiro e dava ao trote dos cavalos das vitórias da Horta um bater surdo, encaixado. -- Mau Tempo no Canal (1944)
Eça de Queirós -- O solo final da Africana, com a sua lenta desolação aflita, seria grandiosamente belo no meio desta paisagem severa, cheia das coisas infinitas! / Ao outro dia, no fim do mar azul, aparecia, recortando no profundo céu as suas linhas rectas, fresca e branca, Cádis. -- O Egipto (1869 / 1926)
Alves Redol -- Minha mãe fez-me um almoço de pão de milho e azeitonas, meteu-me tudo num cesto que enfiei no braço e, enquanto o meu pai aparelhava a burrita, dei uma corrida a casa da avó Caixinha para me mostrar. Fez-me uma grande festa, riu-se e chorou, pôs-me ao colo e deu-me umas passas de uvas, oferta que ela sabia ser da minha predilecção. -- Fanga (1943)







quinta-feira, maio 13, 2010

Antologia Improvável #431 - Lourdes Borges de Castro (4)

PRIMAVERA

Quando o vento amainar
E a brisa vier em seu lugar;
Quando a roseira branca
-- Toda ela castidade --
Ao dar botões perder a virgindade;
Quando as ondas do mar
-- Curvilíneas sereias --
Vierem espreguiçar-se,
Ensonadas e calmas,
Sobre as fulvas areias;
Quando a relva do prado
For uma verde alfombra,
E o céu, de um puro azul,
Não tiver uma sombra;
Quando o manso rebanho
Deixar cedo o redil,
E o ar, morno e odorífero,
Nos disser que é Abril;
Então é Primavera!
E então, ó meu Amor,
Então é que estarei à tua espera!...


Eterna no Tempo

O Vale do Riff - Slim Gaillard, «Dunkin Bagel»

quarta-feira, maio 12, 2010

caderninho

O gato olha para as visitas como se a conversa lhe desse sono. Ramón Gómez de la Serna
Greguerías (tradução de Jorge Silva Melo)

O Vale do Riff - Nat King Cole, «I've Growned Accustomed To Her Face»

terça-feira, maio 11, 2010

capismo

capa de António Domingues
para a 1.ª edição portuguesa de Gabriela, Cravo e Canela, de Jorge Amado,
com prefácio de Ferreira de Castro
Lisboa, Publicações Europa-América, 1960

O Vale do Riff - Melanie, «Brand New Key»

caracteres móveis - João Cabral de Melo Neto

Na origem da atitude que aceita o predomínio do trabalho de arte está muitas vezes o desgosto contra o vago e o irreal, contra o irracional e o inefável, contra qualquer passividade e qualquer misticismo, e muito de desgosto, também, contra o desgosto pelo homem e sua razão.


Poesia e Composição

domingo, maio 09, 2010

está mais gente no Marquês,

A águia Vitória
que num 13 de Maio em Fátima.

(incon)sequências, (ex)citações

Branquinho da Tamanho do tipo de letraFonseca -- Posso fazer algumas economias e, durante o mês de licença que o Ministério me dá todos os anos, poderia ir ao estrangeiro. Mas não vou. Não posso. Durante esse mês quero estar quieto, parado, preciso de estar o mais parado possível. Acordar todas essas trinta manhãs no meu quarto! Ver durante trinta dias seguidos a mesma rua! Ir ao mesmo café, encontrar as mesmas pessoas!... Se soubessem como é bom!... Como dá uma calma interior e como as ideias adquirem continuidade e nitidez! -- O Barão (1940)
Manuel da Fonseca -- Estão ambas junto da lareira apagada, sentadas nos mochos, sumidas nos vestidos pretos. Em redor, sombras espessas diluem as paredes e os recantos numa só mancha circular. Apenas as cantarias da lareira, batidas pela lua que vem da porta, se salientam aprumadas. -- Seara de Vento (1958)
Dinis Machado -- «É óbvio», disse Mister DeLuxe, «não estou a falar dos burriés, estou a falar das idiossincrasias de Molero». Debruçou-se sobre a secretária e virou uma folha do calendário de mesa. -- O que Diz Molero (1977)

32

Benfica Campeão, pela 32.ª vez!

sábado, maio 08, 2010

oh!, os quadradinhos

Chamam destino ao rifão do acaso / e chamam à fraude boa fortuna. /Crêem no Batman e na Virgem Maria. (José Miguel Silva)

O Vale do Riff - Walter Trout, «Reason I'm Gone»

quinta-feira, maio 06, 2010

Antologia Improvável #430 - Reinaldo Ferreira

Feliz do que é levado a enterrar,
Tão indiferente como quem nasceu!
Feliz do que não soube desejar,
Feliz, bem mais feliz do que sou eu!

Feliz do que não riu para não chorar,
Feliz do que não teve e não perdeu!
Feliz do que não sofre se ficar,
Feliz do que partiu e não sofreu!

Feliz do que acha bela e vasta a terra!
Feliz do que acredita a fome, a guerra
Terrores imaginários de crianças!

Feliz do que não ouve o mundo aos gritos,
Feliz! Felizes todos e benditos
Os que Deus fez iguais às pombas mansas...


Poemas / No Reino de Caliban III
(edição de Manuel Ferreira)

O Vale do Riff - Ray Charles, «Georgia On My Mind»

quarta-feira, maio 05, 2010

caderninho

Considerando a monotonia e consequente insipidez da vida, acabaríamos por a considerar insuportavelmente entediante ao fim de um considerável período de tempo, se não fosse o contínuo progresso dos conhecimentos e do discernimento intuitivo, e a aquisição de um entendimento ainda melhor e mais claro de todas as coisas, o que, em parte, é fruto da experiência, e em parte resultante das mudanças que nós próprios sofremos no decurso das diferentes fases da vida, devido às quais os nossos pontos de vista estão, até certo ponto, a ser continuamente modificados, e as coisas nos revelam facetas que desconhecíamos. Desta forma, apesar do declínio dos nossos poderes mentais, dies diem nocet [o dia ensina o dia] continua a ser incessantemente verdade, dando à vida um fascínio sempre renovado, segundo o qual aquilo que é idêntico parece ser algo novo e diferente. Arthur Schopenhauer
Aforismos (tradução de Alexandra Tavares)

O Vale do Riff - The Orobians

boas maneiras

Aaron Copland
foto: Erica Stone

terça-feira, maio 04, 2010

mais uma bofetada no portugaleco pequenino e manhoso

Inês de Medeiros prescinde das ajudas de custo a que tem direito. E o que leva alguém a prescindir de algo que a lei lhe confere? O não ter estômago para as manifestações recorrentes de portuguesice no espaço público: @s plumitiv@s que arrastam pelas colunas dos jornais um chinelar indecoroso e reles; uma exposição de patetice e boçalidade, suficientemente estúpida para não causar urticária, numa coisa que dá pelo nome de facebook; não esquecendo, mais uma vez, o oportunismo político manifestado pela Dona Coisa do BE e do Gajo Qualquer do PSD, a que se juntou um CDS desnorteado pelo afundanço nas sondagens, com resultado correspondente nas urnas, se Nosso Senhor quiser.
Ler, a propósito, a coluna de Vital Moreira, hoje, no Público.

O Vale do Riff - Hugh Hopper & Delta Saxophone Quartet, «Kings And Queens»

segunda-feira, maio 03, 2010

figuras de estilo - Mário Domingues

Dona Leonor, ainda nova, dócil de temperamento, facilmente se moldou ao espírito do marido. Respeitava-o, não porque o estimasse, mas porque ele era o senhor, o chefe da família, a quem devia submissão. Nunca, num perdoável devaneio próprio da mocidade, o vulto de outro homem, porventura mais atraente, ocupou a sua alma toda entregue ao cumprimento estrito dos deveres conjugais. Fora honesta por hábito, por educação, mais do que por natureza.



O Preto do Charleston

(caricatura de Albuquerque)

O Vale do Riff - Christian McBride, «Cherokee»

também

E sem capitalismo também -- mesmo que estivéssemos umas décadas atrás em desenvolvimento tecnológico.
Mas isso seria pedir-nos que fôssemos outra coisa, e não o que de facto somos: animais dotados de raciocínio que, como sucede com os irracionais, querem estabelecer o domínio sobre os congéneres. Ao contrário daqueles, porém, a nossa bestialidade não se satisfaz com o espaço territorial próprio: há que ampliá-lo mais e mais. O Outro é um obstáculo que se remove ou domestica -- de preferência tornando-o uma oportunidade de negócio.

bem melhor

O mundo seria melhor sem religião.

domingo, maio 02, 2010

pois lá fui à feira, e trouxe

Aldeia das Águias, de Guedes de Amorim (Minerva)
Contos Vermelhos e Outros Escritos, de Soeiro Pereira Gomes (Avante!)
Diário Português, de Mircea Eliade (Guerra e Paz)
O Essencial sobre Eduardo Lourenço, de Miguel Real (Imprensa Nacional)
Impressão Indelével, de Camilo Castelo Branco (Guerra e Paz)
Pensamentos, de Jonathan Swift (Licorne)
Retratos e Ficções -- Júlio Pomar e a Literatura (Argusnauta)
Sonetos Luxuriosos, de Pietro Aretino (Guerra e Paz)
Sobre as Fronteiras, de Jean Claude Mézières & Pierre Christin (Meribérica)

sábado, maio 01, 2010

boas maneiras

Albert Ayler
foto: Valerie Wilmer