domingo, março 22, 2009

figuras de estilo - Abel Botelho

E o mesmo homem pequenino e curvo, logo cobrada a confiança, escancarava a porta para o interior da sua misérrima toca. -- Um acanhado recinto, surrado e negro, simultaneamente sala e cozinha, atramochado de coisas sem brilho, pelintras, reles, a mais formal negação do asseio e do conforto. Em cima da mesa havia um candeeiro de petróleo, de folha, com a chaminé partida. Junto à lareira, sobre um a arca, enovelava-se uma velha com um gato ao colo. E num recanto à esquerda, protegida por um ténue resto de cortina de chita, farpada, correndo sobre uma corda, jazia uma enxerga ignóbil afogada num monte de farrapos, entre os quais aflitivamente se debatia estrebuchando, arfando, como tenalhada nas garras imateriais dalgum pesadelo, uma rapariguita apenas núbil, esgalgada, anémica, o cabelo raro e sem brilho, afilado e branco o nariz, e uns grandes olhos de cor de cinza no rosto oblongo, mordido das bexigas.


Amanhã

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