Não há maior glória para um poeta que ver os versos adoptados e apropriados pela comunidade a que pertence(u), nela se inscrevendo e com ela se fundindo para a posteridade. Mesmo se a utilização que deles se faça resulte nalguma trivialidade, mesmo resvalando para o lugar-comum, como tantas vezes sucede. Os legados camoniano e pessoano são disso o melhor exemplo.
O mesmo se dirá dos fragmentos poéticos aplicados a propósito de tudo e de nada, do jardim à beira-mar plantado de Tomás Ribeiro ao batem leve, levemente de Augusto Gil, do sei que não vou por aí! de José Régio ao Portugal, meu remorso de todos nós, de Alexandre O'Neill.
Falo desta transmissão oral, de pais para filhos, de professor a aluno. Se considerarmos o nosso moderno cancioneiro urbano, então a poesia ganha uma difusão enorme. Basta lembrarmos Povo que Lavas no Rio, de Pedro Homem de Melo, cantado por Amália Rodrigues, Pedra Filosofal, de António Gedeão, musicado por Manuel Freire, Queixa das Almas Jovens Censuradas, de Natália Correia, tão superiormente divulgado por José Mário Branco.
Por muito irritante que possa ser o abuso elocutório decorrente desta "vulgarização", é-o menos que a afectação pindérica com que diariamente tropeço na imprensa. Não irei tão longe como Pedro Homem de Melo, e do justificado gáudio autoral com que assistia à (sua) poesia subindo até ao povo; por mim, muito prosaicamente, acho já excelente esse pó de oiro que cai, vindo não se sabe donde, por cima do quotidiano compromisso de viver.
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