O comendador Aragão era célebre em toda a Amazónia, pela sua enorme fortuna, vastidão de negócios e curiosa biografia. Fora dos que viera de tamancos, rude, analfabeto, as nádegas juvenis sempre expostas aos pontapés dos superiores, nessa época, ainda não muito distante, em que o comércio português dentro e fora da metrópole, se caracterizava por vida autoritária e rotineira. Casando a humildade com a esperteza, de marçano ascendera a caixeiro e, mais tarde, o amo, tendo de ir curar o fígado a Portugal, entendera que a melhor forma de não ser desfalcado pelos empregados, enquanto estivesse ausente, era fazer de um deles seu sócio. Aragão levara o negócio a grandes prosperidades e quando, anos depois, o abandonou, foi para se dedicar a outro mais rendoso. À mercearia sucedera um escritório de comissões e consignações -- porta aberta para todas as grandes fortunas, nesse tempo em que não era simples metáfora chamar-se oiro negro à borracha.
Cap. III, 32ª ed., p. 68.
Nota: um retrato de self made man, retrato mesquinho, sem o lado negro que se verá em Juca Tristão. É em Manaus que Alberto pede emprego ao «comendador» Aragão, chegando a invocar a sua condição de exilado político. O mesquinho Aragão, ao contrário do que esperara Alberto, recrimina-o por não tratar da sua vidinha, em vez ter andado «aos tiros e às revoluções». Para aliviar a consciência da recusa, oferece uma esmola a Alberto, que orgulhosamente recusa.
Fiquemos, para já, com um primeiro retrato de Juca Tristão, o dono do seringal «Paraíso»:
Baixo e com o sangue megro, graças a sucessivos cruzamentos, já insinuando apenas a sua remota existência, o dono do Paraíso, de mãos papudas rebrilhando anéis, mal disfarçava, sob o sorriso que lhe abria as faces largas, o olhar duro e enérgico, agora sombreado pelo chapéu.
Cap. IV, 32ª ed., p. 84.
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