terça-feira, setembro 18, 2007

Aquilino no Panteão

Os restos mortais de Aquilino serão trasladados amanhã, 19 de Setembro, para o Panteão Nacional. Não sei se ficarão na melhor companhia, se ao escritor lhe seria grata a ideia, nem isso é especialmente importante. Aquilino já em vida não se pertencia, como deixou de ser pertença da sua família após a morte. Aquilino, a sua obra, que é a do maior prosador português do século XX, há muito que é património nacional. Com o gesto de amanhã, o Estado mais não faz do que consagrar algo que é pacificamente apreendido pela comunidade. O monumento literário que o autor de Andam Faunos pelos Bosques nos legou aprofunda-nos e dá-nos mais consistência enquanto portugueses, do mesmo modo que as crónicas de Fernão Lopes, Os Lusíadas e Mensagem, as obras de Camilo e Eça; tal como sucede com o Mosteiro da Batalha e a Torre de Belém, os Painéis de Nuno Gonçalves e os retratos de Columbano, a Sinfonia n.º 1 de Luís de Freitas Branco e os Verdes Anos de Carlos Paredes. É densidade desta que o milagre do talento de Aquilino nos acrescenta como povo e como pátria.
É por isso, neste caso, duma total irrelevância saber se Aquilino era de esquerda ou de direita, monárquico ou republicano, hetero ou gay, casto ou dissoluto, preto ou branco ou outras ninharias. É um grande escritor, um dos maiores cultores da nossa língua, disso deixando abundante testemunho ao longo de meio século de livros publicados.
E eu, que não sou nada nacionalista, acho muito bem que a Pátria de Aquilino, depois de em vida lhe ter feito mais mal que bem, reconheça através desta homenagem o muito que lhe deve -- que será sempre incomensuravelmente mais do que todo e qualquer preito que se lhe possa fazer.


retrato de Aquilino por Diogo de Macedo
tirado daqui

2 comentários:

ana v. disse...

Ámen, vizinho. Subscrevo em absoluto. Porque é que teremos sempre que ser mesquinhos, quando se trata de reconhecer os nossos talentos?

Ricardo António Alves disse...

Viva, vizinha! Pois claro! Pouco sei do Aquilino Ribeiro homem, que admito tenha sido impoluto e digno; mas O Aquilino escritor é algo que deixou de estar amarrado àquela entidade física cheia de complexidade que é um homem.