sexta-feira, outubro 02, 2020

Inducação para a cidadania, alguns tópicos

1. Algo está profundamente errado quando o Ministério Público é compelido a devassar uma família funcional e integrada na sociedade, porque essa família decide viver de acordo com os seus valores conservadores e a moral religiosa que professa, neste caso a católica. Que se saiba, digo eu, que sou ateu praticante e não ando a papar missas nem acredito em parvoíces, como os católicos envergonhados com a hierarquia --, ainda se pode ser conservador neste país, sem que o Estado se imiscua na esfera privada e familiar. 

2. Algo está profundamente errado quando o Estado procura exercer represálias sobre crianças (é disso que estamos a falar), de resto comprovadamente excelentes alunos e escolhidos pelos colegas para delegados de turma, pretendendo não só bloquear-lhes a passagem de ano como obrigá-los a regredir dois anos. É uma monstruosidade, que não deve passar em claro.

3. Algo está profundamente errado quando um secretário de Estado vem com ar pimpão para os media dizer que assim será, sem ter a noção da sua insignificância e de como mais depressa ele irá borda fora do governo a que pertence, por indecente e má figura, do que as crianças, em relação às quais mostrou estar-se nas tintas -- por muito que agora venham dizer o contrário, tentando disfarçar a nódoa da prepotência pimpona e totalitária.

4. Decorre na sociedade portuguesa um clima de guerra civil ideológica que a cada dia se exacerba. A educação para a cidadania deve ser neutra, ou seja, não pode pretender impor uma mundividência de uma parte da população contra outra. Há um vasto campo comum entre a esquerda e a direita, entre liberais e conservadores que permitem que a escola transmita valores que estão consensualizados na sociedade --  os Direitos Humanos, para usar duas palavras que resumem tudo.

5. A questão é simples. Neste momento está a haver um intolerável cerco do Estado a uma família e, mais concretamente, há duas crianças que estão a ser sujeitas a um abuso por parte do poder transitório que governa. Eu apostaria, dobrado contra singelo, que não lhes vai acontecer nada do que o lamentável secretário de Estado pimponou. Há um Presidente da República, que eu saiba, e que não pode tolerar uma ignomínia destas. E ainda há força e massa crítica no país que o impeça.

6. Técnicas de intimidação: quem pensa o contrário é catalogado como sendo de extrema-direita ou até protofascista. Além de insidiosa é estúpida: objectivamente, estes entusiastas da fluidez de género e outras parvoíces que tontinhos militantes e burocratas de améns tiveram a ousadia de tornar em "disciplina" obrigatória, são os melhores aliados deste Ventura e dos venturas por vir. Ninguém os trava. Ou melhor, travam-nos o bom senso, que o PR já mostrou em várias ocasiões, e os democratas que não se deixam intimidar.

7. Argumentos intelectualmente desonestos: "ah, eu não concordo com o programa de Português, de História, de Filosofia, portanto os meus filhos não frequentam". É só esta aldrabice que têm para argumentar?

8. Leis estúpidas e iníquas, ou mal feitas, alteram-se, combatem-se, incumprem-se. Vou por isso assinar os abaixo-assinados todos. Ou pelo menos, este. É impressionante como esta criatura ainda é membro do Governo.

18 comentários:

Jaime Santos disse...

Perguntei à minha sobrinha que já a teve, o que se estuda no programa de Educação para a Cidadania no que diz respeito à Educação Sexual. Métodos Contracetivos, disse-me ela! E é isto que causa tanto escândalo? Ou que devemos respeitar as escolhas pessoais de cada um?

Ainda me lembro quando nos idos de 80, provocou escândalo entre alguns colegas mais conservadores que eu tivesse perguntado à Professora de Biologia do 11º, quando estudámos os aparelhos reprodutores do homem e da mulher, qual era o período de tempo em que a mulher permanecia fértil após a ovulação e quanto tempo o esperma sobrevivia no seu corpo (a pobre senhora corou dos pés à cabeça)...

Ainda bem que os nossos adolescentes sabem bem mais do que nós sabíamos...

Quem o explicou bem foi o MST, aqui: https://estatuadesal.com/2020/09/12/o-que-importa/. E se o meu caro se quiser juntar aos tais 85, pois está no seu direito, se a companhia não o incomoda...

A Lei em questão por acaso é do tempo do Passos Coelho, a tal que determina a exclusão por faltas, já agora... Aconselho-lhe também a leitura do artigo que Fernanda Câncio escreveu há uns tempos sobre isso.

Parece que para certos progenitores, os petizes não podem ser expostos a certas ideias, porque isso coloca em causa a formação que eles recebem em casa. É ela assim tão frágil? Eu ficaria muito mais preocupado com o que eles podem aprender a partir do seu tablet ou telemóvel (e que está errado na maioria das vezes, ainda por cima).

Tem razão, há um clima de Guerra Ideológica, mas não é a Esquerda que o impõe.

E quanto aos programas, bem, será que um aluno filho de pais criacionistas deve ser dispensado do programa da disciplina de Biologia quando se ensina a Teoria da Evolução? A pergunta é perfeitamente legítima e não é de todo desonesta.

Esta Teoria é, aliás, um desafio muito maior às suas crenças do que o conhecimento de que há pessoas com diferentes opções sexuais, algo que vem descrito na Bíblia, muito embora o que é preconizado em relação a elas não seja, digamos, recomendável à luz dos valores contemporâneos...

Existe uma escolha ideológica no programa da Escola Pública e claramente pende para valores que chamaríamos de iluministas. É assim há muito tempo (e ainda bem) e parece que só agora, com a inclusão das questões de género, é que há quem fique incomodado com isso (ou se queira aproveitar politicamente de tal coisa).

Cabe ao Estado pugnar para que os alunos sejam expostos a um conjunto de ideias, incluindo algumas que podem não agradar aos seus Pais. Chama-se Educação Pública. Até porque, desde logo, os Pais não são donos do que vai na cabeça dos miúdos...

R. disse...

Meu caro,
tenho resposta para todas as suas questões, e a algumas até teria bastante gosto em abordá-las, mas não quero desviar-me do essencial, que é o seguinte:

O conselho de turma ou lá o que é decidiu que as crianças transitassem de ano; há uma criatura, um idiota que ocupa o lugar de Secretário de Estado da Educação que, nas tintas, para as crianças, ultrapassa a escola e decide impor, como imbecil que é, não apenas a retenção como o retrocesso destas crianças -- e aqui nem me interessa que sejam alunos exemplares -- dois anos. Dois anos! Não sei se pensou bem na violência e nos traumas para aquelas crianças que aquele tontinho poderia causar. E não sei se viu o ar pimpão de idiota com que assumia gozoso aquela assinatura, de quem tem as costas largas de 'l'air du temps'.

Entretanto, como o tribunal deu provimento à providência cautelar, um braço armado qualquer, um organismo de burocratas, numa provocação intimidatória, apresentou queixa no Ministério Público.

Só em relação às companhias. Sinto-me muitíssimo bem ao lado de algumas daquelas pessoas, doutras nem tanto, mas isso é irrelevante. mas teria vergonha em assinar um manifesto em defesa daquela jigajoga a que chamam educação cívica desprezando as crianças que estão no centro deste turbilhão.

Faça-me o favor de fazer o exercício de ver onde está o chamado "superior interesse" (como dizem para aí) daquelas crianças. Ou o "superior interesse" não passa de palavreado oco?

Jaime Santos disse...

Uma vez que o meu caro quer limitar a sua resposta ao que diz ser o essencial, muito embora o seu artigo vá além disso, deixe-me que lhe responda a isso já:

Há providências cautelares e depois há quem se queixe na PGR? Óptimo, vivemos num Estado de Direito onde até quem move 'provocações intimidatórias' (a sua opinião) pode apresentar queixa e vê-la julgada improcedente (se o meu caro tiver razão).

Quem não deve não teme. Os tribunais estão cá para nos proteger dos abusos de poder dos organismos do Estado, se os houver, claro.

Agora, a desobediência civil é crime. É bom que quem a ela quer recorrer se lembre disso. É por isso que é preciso coragem para o fazer. As Leis, mesmo as más, são para se cumprir.

Admito, no entanto, que a decisão (ou a Lei, se ela a isso obrigar) será injusta (para além de revelar uma total falta de bom-senso, até político) se punir os menores em lugar dos seus Pais, a quem cabe a responsabilidade pela violação do regulamento. Mas não estamos exactamente perante uma instância não passível de apelo, como fiz notar acima...

E corrijo o que disse mais acima ainda, o Governo de Passos Coelho foi, isso sim, responsável por uma resolução que privilegia “ações na área da educação enquanto pilar das políticas para a igualdade”, justamente o contrário do que o cidadão Passos Coelho defende agora (mas mudar de opinião é o direito de cada um):

https://estatuadesal.com/2020/09/09/a-abjecao-de-eterno-retorno/

O artigo é particularmente interessante porque mostra que a jurisprudência europeia não parece nada apoiar a opinião de quem é contra esta disciplina por motivos ditos de consciência.

Quanto ao suposto 'ar pimpão' do Secretário de Estado, não vi, e se for verdade, não me impressiona. Não leio mentes e logo não faço processos de intenção. Até há mesmo quem tenha ar de idiota por defeito...

É algo ainda mais irrelevante do que as companhias (mesmo um salafrário pode estar do lado certo da razão, é verdade).

Mas, desviando-me agora do que diz ser o essencial, eu cá assinaria por baixo qualquer manifesto que defendesse que se deve tratar os outros com o mínimo de boa educação (a essência dos Direitos Humanos, se se quiser).

Não sou da opinião que a liberdade de expressão ou crença justifique tudo e acho mesmo que há coisas que não se devem dizer. E considero ainda que os Pais não são donos do que vai na cabeça dos filhos.

Eu acho extraordinária, com franqueza, a hipocrisia dos conservadores sociais. Finalmente dizem aceitar a existência de pessoas com opções de vida que não as da maioria, mas depois não se pode falar disso que se contamina a cabecinha das criancinhas...

Mais valia que fossem honestos e dissessem como o Gentil Martins disse em tempos (discordamos então sobre se isso era censurável), que o que se deve fazer é mesmo praticar a discriminação...

Aquilo que é refrescante nos Ventura desta vida é que eles dizem em voz alta o que vai na cabeça de muito boa gente... O perigo desta falta de vergonha é que a vergonha actua como uma tremenda limitação à acção...

Mas se calhar até se ganha alguma coisa quando essas pessoas tiverem que olhar para o espelho e confrontar-se com o facto de que o amor ao próximo que advogam é um amor bastante limitado...

R. disse...

Ora aí está: os ideais são nobres, a generosidade não tem limites, os princípios sublimes até, mas chega-se ao concreto e o indivíduo não interessa nada, que se lixem aquelas duas crianças, não é?

Sim, concordo consigo. Há muitos que têm vergonha, receio, rebuço em dizer o que pensam. Normalmente estão na praça pública e procuram proteger-se. É da natureza humana.

Os pais não são donos, mas muito menos o é o Estado. E as crianças devem ser formadas principalmente em família, os que têm a sorte de ter uma funcional. Os que não têm, aí entra o Estado com as casas pias e o resto.

Faz.me um bocado de impressão que para si, o sec ter-se sobreposto à decisão da escola seja aceitável, ainda por cima no sentido em que o fez, puramente punitivo, estúpido e cruel. Mantê-lo no Governo diz muito do próprio Governo, e já agora do PM. Quanto à minha apreciação do comportamento do dito, é pessoal e não partilhável. Não vamos perder tempo com semelhante criatura.

Diz você que a desobediência civil é crime, mas o direito a resistir também está consagrado. Não vou entrar por especificidades jurídicas por impreparação e falta de tempo para a colmatar. E pode-se acusar os pais de muita coisa, não de falta de determinação e a manterem a posição de coragem.

Manda-me para a Câncio. Cheguei a admirá-la, agora nem consigo lê-la. estou farto de lhe apanhar desonestidades intelectuais, e pelo que vi agora em diagonal, a pecha mantém-se. Portanto, agradeço o seu cuidado, mas é alguém que não me interessa ler. Não por discordar, leio tudo da esquerda à direita, desde que reconheça rigor e honestidade. Mas se fizer muita questão, irei lá ler aquilo de fio a pavio, e depois digo...

Quanto à boa educação, ela de pouco vale se for emanada por um qualquer patife. Eu conheço vários, educadíssimos, atenciosos até.

A cabecinha das criancinhas… A escola é demasiado séria para se perder tempo com parvoíces. Se lá vai o activista LGBT vender o seu paixe, porque não o padre, o imã, o gajo da iurd? Digo-lhe aqui o que já disse em privado a algumas pessoas: se houvesse alguma ameaça séria à comunidade lgbt eu estaria num gay pride a solidarizar-me. Mas não gosto de ver as criancinhas como objecto de inculcação, como disse e bem Sérgio sousa Pinto. E os conservadores sociais podem aceitar umas coisas e não aceitar outras. É o meu caso, que me sinto cada vez mais conservador, ou talvez apenas honesto comigo mesmo.

Calculo que a percentagem dos pais que se preocupam com a educação dos filhos seja relativamente baixa. Desses, uns defendem umas coisas outros defendem outras diferentes. A escola deve estar à margem do que divide a sociedade. Se uma parte quer impor as suas posições à outra, não estamos mal, estamos péssimo.

Jaime Santos disse...

Não sei se é aceitável o SE sobrepor-se à Escola. Desconheço se a Lei obriga à reprovação por faltas injustificadas. Se obriga quando a responsabilidade não é dos menores, então é estúpida. Se não obriga e é uma decisão do SE, é uma decisão estúpida, que os tribunais devem reverter. Está satisfeito?

Relativamente ainda ao SE, perguntou-me o que pensava da atitude e classificou-o como um imbecil (opinião pessoal e não partilhável). Concordo que não devemos perder tempo a discutir essa atitude.

Mas alguma consequência a decisão dos Pais deve ter porque se se abrisse uma excepção, amanhã poderia invocar-se a objecção de consciência relativamente à Biologia ou à Educação Física.

Mas objecto de inculcação, a Disciplina? Porque se fala de Sexualidade (diversidade, direitos, saúde sexual e reprodutiva)?

E quanto à discriminação, o Expresso de 3/10 referia que os casais homossexuais têm muitas dificuldades em alugar casa… O racismo ou a homofobia podem até ser só larvares (?), mas devem à mesma ser combatidos...

Gostava de perceber porque a obrigatoriedade da frequência de uma Disciplina com conteúdo tão anódino justifica o direito de resistência? Para que serve a Escola Pública senão para dar aos Cidadãos uma Educação onde se deve incluir mesmo o conhecimento que não agrada aos Pais?

Factos simples como o de o Universo ter 13 mil milhões de anos, ou a vida ter surgido na Terra por processos naturais, ou o homem e o macaco descenderem de um antepassado comum que se parecia com o segundo, ou as pessoas terem opções sexuais distintas, fruto da genética e da história pessoal, ou o aquecimento global de origem antropogénica ser uma verdade científica... Quem quiser negar isto e quiser ser coerente, que abandone o tablet e o automóvel e vá viver como os Amish...

Diria o mesmo de um ateu que impedisse os filhos de se informarem sobre as religiões (consta do programa). Gostaria de saber o que diriam os subscritores destes manifestos nesse caso...

Quanto à coragem, ela é uma virtude moralmente neutra e deve ser elogiada se servir uma boa causa. Essa não é a minha opinião aqui...

E o padre já lá vai (e o gajo da IURD também pode). Existe uma Disciplina de Religião e Moral, é ensino confessional na Escola Pública. É facultativo, mas suportado pelo Estado. Defendo que assim se mantenha.

Quanto à participação de sacerdotes nas aulas de EC, no módulo sobre diversidade cultural e religiosa, com certeza. O que eu gostaria mesmo era que se ensinasse História das Religiões. Contribuiria para destruir mitos, a começar pelos que existem na mente dos crentes (sobre as religiões dos outros e a sua própria). Mas seria ainda mais polémica que a EC...

Só a boa educação não faz de alguém um bom carácter, mas todo o bruto é um mau (Mt 5, 20-26). Exclui-se o uso de impropérios retóricos, claro.

Quanto a Câncio, incluí o link porque confio no que diz sobre as decisões judiciais europeias e sobre a volubilidade de pessoas como Passos Coelho ou David Justino. Existe uma Direita pronta a saltar para o comboio das guerras culturais, mesmo se há pouco defendia o oposto... Mas se calhar isto sou eu a fazer processos de intenção, eles sofreram foi uma conversão paulina de 2015 para cá...

Eu nada tenho contra os Conservadores. O meu problema é com a hipocrisia, a tal defesa dos valores cristãos que não se praticam. Quando Jorge Sampaio não quis ser recebido por João Paulo II sem a esposa porque recebê-los seria contra o protocolo (é divorciado), um prelado português disse, 'o único protocolo é o Evangelho!'... Por oposição temos Manuel Clemente, que recebe Ventura, que defende o confinamento dos ciganos e que se tratem migrantes a pontapé, o que o nosso Patriarca não nota (a posição da Igreja e de Francisco sobre isto é clara e admirável), mas o Patriarcado andou em 2019 a coligir os diversos programas eleitorais nos temas ditos fracturantes e a dar nota máxima ao Chega!, e Clemente agora defende que a Educação para a Cidadania deve ser facultativa. Mas esta Direita indigente não tem mais nada para fazer?

R. disse...

Estou satisfeito, pois considero-o um tipo com bom senso, não apanhado pela cegueira ideológica que não cuida dos "danos colaterais", o que é uma típica formatação mental decorrente do totalitarismo.

Esse argumento é falacioso. Estamos a falar de verdadeiras disciplinas, onde, por exemplo, a educação sexual deve ter lugar. E concorodo com uma verdadeira disciplina de educação cívica: estrutura e funcionamento do estado, etc. os Direitos Huamnos têm perfeito cabimento em aulas de História que deveriam se tão importantes quanto o Português e a Matemática. Aí se falaria nos vários processos de emancipação huamana. Enfim, coisas sérias.

Inculcação. A coisa não é neutra como você a pinta. A educação deve ser dada pela família; O Estado só deve substituir-se àqueles que não a têm ou se como não a tivessem. Pois tudo o que você diz; já não acontece com com os que pretendem negar a masculinidade e a feminilidade, o azul e o cor de rosa, a endoutrinação idiota. E aqui vejo-me na companhia da ministra brasileira -- deve ser por causa do apelido ahahah... E não há história pessoal ou se é hetero ou homo, o que nem invalida experiências por que razão seja com indivíduos do mesmo sexo. Haverá bissexualidade, mas já é um domínio que vai para além da minha compreensão. Não estudei o assunto, por isso não sei.

Eu sou radicalmente ateu e radicalmente livre. Tenho quatro filhos nunca os endoutrinei a não ser no valor da verdade, da honestidade e do brio. Quanto ao resto estou-me nas tintas. Os meus filhos foram e são livre para terem as crenças que quiserem ou não terem nenhuma. Claro que eu acho que a religião devia ser varrida do ensino. O seu lugar é nas aulas de História.

Eu só não concodo com o Keopotkine que diz que a única Igreja que ilumina é a que arde, por que há o património. Mas só por isso.

Os meus filhos foram aconselhados por mim a justarem-se e não me fazerem perder tempo com padres. A mais velha não me ligou nenhuma e casou-se pela igreja. E eu fui feliz levá-la ao altar. Foi a sua decisão, eu só tive de respeitar a sua liberdade.

Também sou contra a propriedade fundiária, um roubo como diria o Proudhon. Aí está uma boa matéria para essa pretensa disciplina.

Em suma não quero activistas na sal de aula a venderem o o seu peixe. Quero uma escola séria com professores, nem gajos a falar de fuidez de género nem do Corão ou da Bíblia. Estes são para as aulas de História e Filosofia, aquela, para a Biologia ou Psicologia -- outra cadeira suscpetível de abordagem séria dessas questões. Agit prop nas aulas com os filhos dos outros à revelia dos pais e da família, como diz o outro, bardamerda (estou com vontade de escrever um post com este título, se tiver tempo...)

Consequências para os pais: o Estado que avance e logo se verá a força que tem.

Em relação ao Justino não sei, mas ao Passos, sim é estranho. Mas é verdade que pode mudar, será estranho se voltar outra vez a defender o oposto. Mae eu desconfio da Câncio; como lhe disse, não a acho intelectualmente honesta.

O Sampaio é credor de toda a minha admiração, nessa questão, o Clemente, não; aliás ele recebeu-o a contragosto: teve medo de o receber e depois medo de não o receber.

Mas chamo-lhe a atenção para a reacção da Pastoral dos Ciganos, violentíssima contra o palhaço do Ventura. A Igreja também não é toda igual, como sabe.

Jaime Santos disse...

Não falava de si, sei que não sujeitaria os seus filhos às suas ideias. Mas há quem os sujeite, ateu ou crente, e também é para contrariar isso que existe a educação pública.

E quanto a activistas na sala de aula, não sei de nada disso, só do episódio ridículo, da associação LGBT que foi fazer uma palestra, a que assistia quem queria, a uma escola, e que pediu uma contribuição para os transportes e os professores tiveram a ideia peregrina de a pedir aos alunos (50 cêntimos). O representante da associação recusou-a e bem. Não me parece que um caso sirva de exemplo.

Aliás, ou ando muito alheio a estas questões ou não me parece que estejamos a falar da mesma disciplina que, como notou a Bárbara Reis, dedica 3 horas por ano à Educação Sexual. Não sei quem anda a negar a masculinidade e a feminilidade, o azul e o cor-de-rosa, nas escolas... Se há, sou contra. Cá fora, cada um é livre de acreditar nos disparates que quiser...

Sou sim, a favor de que se ensine que a orientação sexual é uma realidade e que devemos respeito a quem calha de ser diferente de nós. E se isso ofende a sensibilidade de alguns progenitores, pois paciência.

Não tenho é tempo para quem anda à procura de guerras culturais à conta de ideias que deveriam ser consensuais, até porque fazem parte do cânone científico há muito (tirando talvez para Gentil Martins, mas esse tem desculpa, a da idade). O Estado deve ser neutro em relação às religiões mas não tem que ser neutro em relação às ideias, sobretudo aquelas que dizem respeito aos direitos humanos.

Quanto à religião na escola, desde que seja voluntária, defendo que o Estado a pague, desde que não se transforme numa madrassa. Mas para isso existem os programas. Nada garante que eles sejam seguidos, mas cabe às escolas manterem-se vigilantes, não seguindo o exemplo da FDUL que deixou que um doido varrido fosse ensinar num Mestrado que a violência doméstica é disciplina doméstica...

Também não tenho nada contra a que os nossos alunos, que nem sequer sabem em que consistem os dogmas do Catolicismo que, goste-se ou não, faz parte do humus da nossa Pátria, para mal e para bem, ficassem a perceber quais são os principais preceitos dessa e de outras confissões (não se consegue perceber o Eurico, o Presbítero, ou o Crime do Padre Amaro, sem isso!). Também ajudaria a começar a acabar com os preconceitos de que se alimentam o Chega e quejandos...

Agora, gostaria de saber se o Clemente, ou os Pais destas crianças, ou os Conservadores Religiosos em geral, concordariam com a ideia de que deveria ser cada confissão a pagar a educação religiosa na escola.

É que se eles defendem o direito de opção, então eu tenho que dar razão ao Livre, as pessoas seculares também têm um direito de opção de não quererem pagar impostos para suportar a educação religiosa.

Somos parte de uma comunidade. O regime político pós 25 de Abril decidiu, e bem, que não queria as guerras religiosas da I República e manteve a Concordata. Se eu, que sou agnóstico, concordo com isso, os Conservadores Religiosos bem expor os seus petizes a ideias com as quais não concordam.

Eles chegam a casa, e os Pais podem então explicar-lhes porque não é assim e os miúdos decidem. De outro modo, suspeito que não ouvirão falar dessas coisas de todo...

A sua posição é perfeitamente coerente, mas aposto que a deles não é... E só por causa dessa hipocrisia é que lhes tenho mais sarna do que a todos os activistas LGBT que não têm poder nenhum, mau grado os gritos histéricos do Nuno Melo...

E quando falo dessa gente, não incluo lá todos os Católicos, sequer todos os prelados, bem entendido. O Papa Francisco é uma das autoridades morais do nosso tempo (porventura a única) e é acima de tudo um homem bom.

E entre nós temos o Torgal Ferreira, deliciosamente desbocado, ou o actual bispo de Leiria... E, bem entendido, a posição da Pastoral dos Ciganos foi aquela que deveria ter sido. A pergunta que fica é porque não foi mais apoiada...

R. disse...

Sou a favor que se ensine o respeito pelos outros, seja gay ou do Sporting
Direitos humanos, meu caro,não é andar a levar às criancinhas parvoíces como a fluidez de género ou lá o que é. Cada um tem tempo para descobrir o quão fluido é.
Religião na escola, também não. Completamente fora, todas.

Jaime Santos disse...

Repito-lhe o que disse, dê-me lá um exemplo de uma criancinha que tenha levado com a fluidez de género :) ...

É que eu olho para o programa da disciplina, por exemplo aqui: https://www.e-konomista.pt/educacao-para-a-cidadania/ e não leio lá nada disso, só leio coisas com as quais não poderia estar mais de acordo...

Aliás, se risco houver é que o programa da disciplina contém tanta coisa que muito dificilmente algo poderá ser ensinado que não seja pela rama... Mas é melhor do que nada...

É que uma coisa é criticarmos algo por aquilo que é, outra é criticá-lo por aquilo que pensamos que é...

E continuo na minha. Sou a favor da religião na escola porque sou a favor da liberdade dos pais religiosos terem os seus filhos a aprenderem a doutrina da religião que os progenitores professam. Só não sou a favor de que eles aprendam só aquilo com que os Pais se sentem confortáveis.

E muito embora isso viole o princípio da laicidade, até aceito que essa educação seja paga pelo Estado, como consta segundo creio da Concordata, precisamente porque gostaria de a manter. Só não gosto da hipocrisia dos Católicos (de alguns).

E mais, sou a favor de que todos os alunos aprendam os preceitos das grandes religiões porque são elementos centrais da cultura humana (sem os quais não se entende muita da grande literatura, como disse) e desconfio que se não fosse o pouco que aprendem na escola, provavelmente não aprenderiam nada (tal como com as questões da sexualidade, aliás).

Eu sei que os sportinguistas têm sido mal tratados, até pelas arbitragens, mas vamos lá a ver, o grau de discriminação a que ainda estão sujeitos os gays é de uma outra ordem de magnitude, como no caso dos negros, ciganos, etc...

Estou obviamente a brincar. Mas o ponto é que as discriminações não nascem iguais e é bom que os miúdos percebam porque elas existem...

Mas chamo a atenção para a tomada de posição de Francisco. É exactamente assim que eu penso que um cristão deve pensar. Eu, não o sendo, fico-me, como você, pelo valor do respeito (até porque se pode desprezar quem se ama)...

R. disse...

Meu caro, como calcula, não ando em cima do tema, mas não embarco em ingenuidades.
E regresso ao princípio. A escola deve ser um lugar de aprendizagem e, portanto, não uma porta aberta para as agendas e o peixe de ninguém.
A religião não deve estar na escola. Para isso há a catequese e que cada um que se avenha com o que os paizinhos os puseram a aprender. Há o discernimento de cada um, uns com mais outros com menos; é assim em tudo. Sabia que pelos meus onze, doze anos, no colégio de padres onde andei era escolhido para ler na missa, porque tinha boa voz? E lá ia eu todo contente para o púlpito…
Claro, o ensino das religiões em aulas de História. Sabe que o livro que levaria para a ilha deserta seria sempre a Bíblia? E claro que não seria para salvar a "alma"...
Sim, o papa será aquilo a que se chama um verdadeiro cristão. E, portanto, não me espanta nada o seu enunciado, que aliás só vem confirmar o discurso oficial da Igreja, não deixando de ser, numa perspectiva mais cínica, uma forma mais ou menos hábil de tentar salvaguardar a instituição familiar, em crise, muito menos por causa de "valores" e mais pelo tipo de sociedade de consumo que criámos, essa sim, a rebentar com as famílias e geradora de disfuncionalidades várias. Se calhar uma inevitabilidade, infelizmente.

Jaime Santos disse...

Bem, meu caro, eu não embarco nem em ingenuidades nem em processos de intenção. De toda esta discussão ainda estou para ver um caso que seja de uma pobre criancinha endoutrinada pela madrassa LGBTQ... E garanto-lhe que se os houvesse, um que fosse, as vozes da Direita religiosa já os teriam tornado públicos.

Se tivesse que escolher um livro, um só para levar para uma ilha deserta, provavelmente levaria as 'Meditações' do Marco Aurélio e não a Biblia, simpatizo mais com os estóicos do que com o Cristianismo.

Ou talvez o Hamlet, cujo solilóquio contém seguramente mais poesia e filosofia que todos os livros sagrados do mundo e cujo espírito céptico e pessimista combina mais comigo. Claro, teria menos que ler, mas isso não seria necessariamente uma desvantagem... A Bíblia repete-se muito :) ...

O Christopher Hitchens, que era um filho da mãe, mas igualmente um escritor de língua afiada e resposta pronta (e um ateu militante), dizia que não fora o preconceito moral das religiões contra a homossexualidade, elas apoiariam o casamento gay, porque o casamento é uma instituição conservadora, melhor que o amor livre a que estavam condenados os homossexuais.

Julgo que é dessa perspectiva que Francisco justamente fala. Ele seguramente que preferiria que os gays praticassem a castidade (recorda-me de uma passagem deliciosamente hipócrita de um texto religioso, porventura o catecismo, em que isto lhes é recomendado, porventura com a ajuda de 'uma amizade desinteressada') mas é sobretudo um homem prático e bom, sabe que a santidade não é para todos e aceita o mal menor (como ele o vê).

Convenhamos, isso é bastante melhor que a sanha persecutória dos prelados conservadores que, como apontava um jornalista francês que publicou um livro recentemente sobre isso, quanto mais homofóbicos, mais suspeitos são de serem gays de armário e a quem, se calhar, o que mais interessa é que a homossexualidade permaneça um tabu.

Afinal, num mundo em que ela é um tabu, os abusos dos mais frágeis permaneceriam escondidos, qual seria o ex-noviço ou o rapaz de altar que teria a coragem de denunciar o padre que o abusou, para ser acusado de ser um pervertido a seguir?

R. disse...

Pois, é uma coisa que prefiro não ver, além de achar deslocado esse tipo de visitas de estudo ao invés.

Bíblia, Antigo e Novo Testamento; mas gabo-lhe as escolhas.

O casamento é um contrato que a burguesia adocicou. Para mi não tem grande valor, já a família sim.

Essa do jornalista francês é velha, e é uma alegação muito usada por certos homossexuais, e até simplória. E a cada um as suas razões. Haverá disso, mas principalmente há conservadorismo, uma certa noção de decoro -- que muitos homossexuais têm -- e se quiser uma estética. Para além de que a maioria das pessoas é hetero, embora se defenda, creio que desde o Freud, que somos todos bissexuais o que se confirmaria se eu olhasse para o cu de um gajo; enquanto que o rabo de uma mulher, que de possibilidades... -- e quem diz rabo, diz coxas, seios, pernas, mãos, olhos, cabelo. Isto são coisas que não se disfarçam intimamente, embora possam reprimir-se.

Mas quanto aso prelados, eu sou dos que acham que a Igreja está cheia deles- Um padre hetero é cada vez mais uma raridade. Há praì bispos que mais parecem bispas. Ou como dizia um amigo, aquilo não são bichas, são trichas... Mas os abusos de crianças creio que vai para além da questão da homossexualidade, é uma patologia, uma entorse de personalidade provocado sabe-se lá por que traumas; enquanto que a homossexualidade é um desvio à norma, um bocado como ter o cabelo cor de cenoura -- pode calhar-nos a todos

Jaime Santos disse...

Não identifico a pedofilia com a homossexualidade, Deus me livre. O que quero dizer é que numa sociedade repressiva e em que tudo o que se desvia da norma é tabu, os abusos podem ser mais facilmente escondidos. Imagine os abusos que um jovem homossexual, em particular, poderia sofrer num seminário. A vítima perfeita, porque facilmente sujeita a chantagem...

Já o Voltaire comentava, creio, que os padres demonstravam o seu afeto pelos acólitos de formas assaz curiosas. Isto não é de hoje. E os abusos não se resumiam os abusos sexuais, basta pensar nas Magdalene Sisters na Irlanda. A queda a pique da crença no Catolicismo na Irlanda, fator de identidade nacional num País antes ocupado por Protestantes, também se deve à denúncia desses abusos...

Só quando se começa a falar abertamente de sexualidade é que as pessoas perdem o medo de falar dos abusos.

A revolução sexual dos anos 60 pode ter sido importante mas só mais recentemente é que se começou a discutir até que ponto os mais fracos (a começar pelas mulheres) eram objetos de abuso, incluindo durante a dita revolução. O caso de Polanski, em particular, insere-se no espírito do tempo (só o juiz, judeu como ele, aliás, é que não foi na conversa e deu-lhe uma sentença de prisão efetiva). O perigo é que se reverta ao puritanismo, mas todos os avanços implicam riscos...

Não tenho nenhuma competência em Freud, mas no seu tempo a homossexualidade era ainda vista, por ele inclusive, como um sinal de uma personalidade erótica não plenamente desenvolvida. Creio que a ideia que refere aparece com o Kinsey, mas não é tema que me interesse, para além da leitura ocasional de um artigo de jornal ou de revista... Nem sei o que a moderna psicologia pensa disso exatamente...

Quanto à Bíblia, depende. Antigo Testamento, prefiro o Eclesiastes, o Cântico dos Cânticos (uma celebração do amor carnal se lido literalmente, o que se calhar era mesmo a intenção do autor) e alguns dos Salmos. No Novo Testamento, as cartas de Paulo pela poesia e os Evangelhos pela Doutrina. Sou de leituras curtas, mesmo se os profetas incluem passagens lindíssimas...

O casamento é, como diz, um contrato, que normalmente dá segurança a uma das partes porque vincula a outra. União, união, realmente só quando aparecem os filhos e as responsabilidades...

R. disse...

Quanto aos abusos escondidos, tem razão, embora eu creia que o abuso do forte contra o fraco, que é talvez o que se passe nesses universos, é susceptível de coacção pela ameaça e pelo medo.

Leituras curtas mas criteriosas, pelo que tenho visto...

Jaime Santos disse...

Sem dúvida, mas o medo está menos presente se a vítima souber que existe alguém que a ajudará e que a levará a sério.

O aumento de denúncias sobre violência doméstica também se deverá a isso, não apenas ao aumento de agressões, o que também ocorre, fruto também da noção que os agressores têm de que estão a perder o poder de tutela que existia em sociedades tradicionais...

E o medo da denúncia também pode contribuir para manter o agressor na linha, muito embora isso pressuponha que o dito agressor actua racionalmente, senão moralmente, o que provavelmente não é verdade no caso da maioria dos agressores sexuais.

Como alguém dizia, deliciosamente, as pessoas não precisam de moral e sim de polícia :) ...

R. disse...

Pois, essa é daquelas que os optimistas antropológicos prefeririam não ouvir...

Jaime Santos disse...

Eu não meu caro, acredito na infinita capacidade humana para o disparate, como sabe...

É a exceção ao meu Liberalismo e onde me aproximo mais dos Conservadores. Mas, contrariamente aos Religiosos, não acho mesmo que haja qualquer Redenção Exterior...

Simplesmente é fácil as coisas, que já são más, ficarem ainda piores. Destruir é rápido. Construir é possível, mas bem mais difícil...

Alguém comentou um dia que se fosse por mim nunca se teria feito a Revolução Francesa e eu concordei :) ...

R. disse...

Bem observado...

Há sempre a possibilidade da revolução inglesa, um século antes. mas nada se faz sem um bocado de sangue -- nem o 25 de Abril...