sábado, outubro 29, 2005

Correspondências #19 - Camilo Castelo Branco a desconhecido

Ex.mo Snr.

Se vê que a minha carta não tem muito descuidos gramaticaes, pode publical-a. Não me lembro se ha lá coisa que moleste o proximo; se vê que ha trace. V. Ex.ª não deve ignorar que eu acato o proximo e só por descuido lhe tenho assacado aleives que me trazem assaz penitenciado.
Agradeço-lhe a estimação que dá ao futilissimo livro dos Brilhantes do Brazileiro. Parece-me que só tem uma duzia de paginas soffriveis, são as ultimas que me sahiram da alma com lagrimas. As outras são pura chalaça -- o espirito portuguez, unico a meu ver, que pode sahir das nossas officinas de caricaturista.
A nossa sociedade não dá para mais. Se tirarem a Portugal, o brazileiro e ao Jardim das Plantas, de Paris, os ursos, não ha ahi que ver. (Esta carta faça-me o favor de a não publicar. Isto entre nós é maledicência muito á puridade).
Dê-me as suas ordens.
De V. Ex.ª
adm.or affectivo e ob.do
Camillo Castello Branco
S. M. Seide, 17 de Abril 70.
In António Cabral, Homens e Episódios Inolvidáveis

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