A mulher -- que o autor não nomeia -- manda o filho chamar o pai, Pedro, à taberna. Filha de operário, um acidente de trabalho do progenitor lançou-a desde cedo na «Rua», como cauteleira, na companhia de um irmão mais novo, o Joãozinho. Vida de pobreza e promiscuidade, continuada na condição de mulher maltratada e mãe de prole excessiva -- «viver é um delito -- o grande delito dos pobres» (p. 28). Quando a cada noite, regressa a casa com o marido ébrio a enchê-la de insultos, a mulher diz-se, como que perplexa pela existência de sofrimento que leva: «não é pelo prazer de rilhar miséria» que ele vai assim, tosco, miserável, zangado com ela e com a vida: «deve haver um culpado» (p. 30).
Incipit -- Pae! -- e com olhares a ressumarem medo, a voz rastejando em tom humilde, o garotelho, oito anos cobertos de farrapos, prosseguia: -- A mãe diz que é tarde!, -- e não recebendo resposta, na lenga-lenga lamurienta dos que imploram misericordia! -- Pae! pae!
A capa, de um minimalismo expressionista muito conseguido, é de Roberto Nobre.
3 comentários:
Entrei em diversas livrarias e perguntei pelo Assis Esperança, pelo menos alguém vai ficar com o nome no ouvido.
É uma tristeza verificar que muitos dos nossos clássicos não voltam a ser reeditados.
É verdade, são tantos nessa situação... Uma vez, na fnac do Chiado, fui à procura do Teixeira de Queirós (há uma antologia recente). Queirós, só o Eça, é claro, mas o pobre coitado, letra Q, estava arrumado entre a Júlia Pinheiro e o Cláudio Ramos (!). Acredita-se nisto?
Temos de acreditar e cada vez mais com gente a publicar todos os dias, sem haver a preocupação de distinguir os escritores dos escribas de ocasião.
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