quarta-feira, janeiro 10, 2018

Santa Catarina nos valha

À boleia da  revelação e condenação de práticas criminosas que vieram à tona, e de que me não vou ocupar agora,  os eunucos e pichas-frias do costume -- gente que não gosta de sexo e que com ele se confronta com sentimentos e dificuldades várias --, intensificam a cruzada, amplificada pelos gritinhos dos merdia de quiosque, chateando todos os que têm ou querem ter uma vivência erótica tão descomplicada quanto possível.
É pois de saudar que a velha Europa, por uma das suas figuras mais emblemáticas, Catherine Deneuve, uma das mulheres mais bonitas do mundo (a foto mostra-a no esplendor da idade) venha encabeçar uma lista de cem, dizer isto.

10 comentários:

Jaime Santos disse...

Estive a ler e concordo. Uma coisa é o assédio sexual, que não indo ao ponto da violação (e às vezes vai), degrada a dignidade da mulher ou do homem atingida/o. A outra, bem diferente, é classificar como tal todo o avanço não desejado e por vezes desajeitado.

E por acaso, também considero como vergonhosa a tentativa de apagar da História o trabalho dos (supostos, porque nada está ainda provado) abusadores, como no caso do último filme de Ridley Scott, em que Kevin Spacey, depois do trabalho terminado, foi apagado de cena e substituído por Christopher Plummer. Se fossemos renunciar ao trabalho e ao esforço de todos os artistas e homens de cultura cujo carácter era duvidoso, teríamos que rasgar uma boa parte das obras de arte e literatura existentes.

R. disse...

O assédio, a prepotência, a compra. Embora não tenha acompanhado o assunto ao pormenor, pelo que, acho muito mais lamentável uma Mira Sorvino, que por não ter cedido aos avanços do bácoro ficou com a sua carreira de actriz irremediavelmente prejudicada do que uma outra que tenha cedido para não perder o lugar no filme. Mira Sorvino, sim, isso é que é de mulher!, parece-me.

Mas se já nem pelos livros do Mark Twain e do Monteiro Lobato estão a salvo...

Jaime Santos disse...

Sim, é preciso ter o carácter de uma Mira Sorvino (também, filha de um ator daqueles, só podia ser uma mulher de fibra, e parece que o Pai a desaconselhou a seguir aquela carreira, devia saber onde a filha se iria meter) para mandar o bácoro passear. Mas eu não passaria julgamento de forma tão leve em nenhuma das outras. A cultura dominante condiciona as pessoas, em particular se ganham muito pouco, como imagino que era o caso de algumas das aspirantes a atrizes... Só sei pelo que me contaram, mas parece que em certas empresas a cultura é exatamente a mesma, também por isso se inventou a expressão depreciativa 'subir na horizontal'...

R. disse...

As/Os que sobem na horizontal não são vítimas...

Jaime Santos disse...

Não estaria tão certo... Estou suficientemente bem na vida para se estiver farto de um patrão qualquer o/a poder mandar bugiar e a razão nem precisaria de ser essa. Despedi-me em tempos por bem, bem menos. Quem se arrisca a ser posto na rua sem referências e se arrisca a ficar sem a casa que está a pagar não tem exatamente a mesma margem de manobra, sobretudo se tiver filhos pequenos... Por isso, como digo, não seria tão lesto a passar o meu julgamento àquelas que se submeteram a Weinstein...

R. disse...

Isso que você descreve é assédio e abuso -- e, portanto, crime que se exerce sobre pessoas que têm muito a perder se resistirem: estou a pensar em mulheres empregadas, operárias, secretárias, o que seja, com uma família para sustentar; não em actrizes, por mais jovens que sejam, embora estas, muito jovens, tenham sempre de considerar-se vítimas de abuso. Já o subir na horizontal é um coisa diferente: a troco de oferta sexual (ao patrão ou ao superior hierárquico), oferta muito consciente e feita com esse propósito mercantil, o/a ofertante alcança os seus objectivos profissionais, geralmente sem os merecer e muitas vezes ultrapassando colegas que não se prestam (ou que não prestam como peça de caça).

Escusado será dizer que considero aqueles que se oferecem (todos devemos conhecer casos), abaixo de prostitutos, pois a prostituição é uma mera transacção que termina após concretizada e, em geral, não prejudica terceiros; já os que se servem da sua posição hierárquica para obter favores sexuais, pagando 'em espécie', não passam de uma porcaria fétida, por muito que se perfumem.

(Atenção que isto não implica qualquer juízo de valor para quem exerça a sua liberdade sexual com quem quiser, colega ou superior hierárquico, desde que não entre o 'mercado'. Transacções, só de fluidos -- e essas são muito de louvar.)

Jaime Santos disse...

Hmmm, pois, mas o que me parece é que muita gente que é assediada e abusada por causa da sua fragilidade (económica. emocional, etc) acabada colocada exatamente na mesma prateleira de quem usa o sexo para obter favores de quem tem mais poder.

E, mais uma vez, não estão tão certo que possamos fazer esse julgamento relativamente a atores ou atrizes em particular. Quando alguém pode destruir uma carreira futura a uma pessoa que ganha muito pouco (a vida da generalidade dos atores está muito longe de ser glamorosa), a fragilidade é rigorosamente a mesma de alguém que tem um trabalho de secretariado ou a um operário/a...

R. disse...

Na mesma prateleira: haverá casos, não sei em que proporção.
Quanto às actrizes: as que vieram a lume são todas de primeiro plano, e algumas já não eram assim tão novas. Mas longe de mim condená-las, se cederam à pressão. Diferentemente das ou dos que ascendem na horizontal, que, normalmente são os próprios a provocar ou a facilitar a ocasião. E neste caso talvez bem se deva falar em assédio.

Jaime Santos disse...

Sem dúvida, o critério é o de quem provoca a situação.

E note-se, claro, que não há assédio se um patrão/a e uma sua empregada/o se apaixonarem, era só o que faltava. É natural que pessoas que passam muito tempo juntas acabem juntas. Se a relação for consentida e desejada pelas duas partes, nem vale a pena ter esta discussão (excluo obviamente oportunismos, que merecem naturalmente censura moral, pelo menos)...

E sim, talvez uma atriz consagrada tivesse a capacidade de resistir à pressão, mas não esqueçamos que Sorvino o fez e apesar do Óscar que já tinha ganho (por 'Mighty Afrodite' logo no início da carreira, se bem me lembro), ficou com a carreira destruída. A questão aqui em causa é a relação de poder e o medo que o seu abuso provoca na parte mais fraca...

R. disse...

Concordo.
Há bocado queria ter escrito: 'E neste caso talvez nem se deva falar em assédio.'