terça-feira, dezembro 09, 2008

Figuras de estilo - Rebelo da Silva

À noite era um prazer e um exemplo observá-lo sentado na imensa poltrona de couro, com a ama à direita e o cão sonolento à esquerda, a velha cabeceando de roca à cinta e engrolando Padres-Nossos, o animal piscando os olhos com uma orelha fita e outra derrubada. Dos dois companheiros do serão o mais atento e sisudo era decerto o cão! Medindo sempre o dono com a vista, o mastim nunca perdia ocasião de lhe coçar o focinho pelo joelho, quando supunha o ensejo favorável. O bufete de pau santo e pés torneados, o candeeiro de latão e a anarquia dos papéis completavam o pitoresco painel do lar doméstico. Passada uma hora, o único que não dormia era o Vigário; a sua pena continuava a ranger sobre o papel, ao som dos roncos assobiados da tia Brízida.


Introdução a Contos e Lendas

2 comentários:

Manuel Nunes disse...

Li o conto "A Última Corrida de Touros em Salvaterra" numa velha selecta literária que havia em casa do meu pai. Não sei que destino terá levado o vetusto livro. Apresentava outras preciosidades, como versos de Soares de Passos e excertos poéticos de Castilho. Hoje estão esquecidos. Não se aguentaram entre os luzeiros do 1º Romantismo e os moços da Geração de 70. É a vida! Mas é bom que se fale deles.
M.N.

Ricardo António Alves disse...

Sem dúvida, caro Leitor. Demasiado importantes para serem esquecidos...