quarta-feira, abril 16, 2008

Antologia Improvável #300 - Fernando Assis Pacheco (2)

MAS AGORA QUE VAI DESCER A NOITE NA MINHA VIDA

Triste de mim mais triste que a tristeza
triste como a mão que segura o copo
como a luz do farol esgarçando a névoa
triste como o cão manco
deixado na serra pelos caçadores

triste como a sopa entretanto azeda
mais triste que a idiotia congénita
ou que a palavra ampola

triste de mim triste e perdido
entre duas ruas
uma que vai para o Norte outra para o Sul
e ambas cortadas aos peões
que não cooperam devidamente
(com este governo de merda é claro)

triste como uma puta alentejana
num bar de Ourense
que me viu à cerveja e lesta
me chamou compadre
vozes que a gente colecciona

a tarde triste os anos tristes
a grande costura da tristeza
do esterno ao baixo ventre

triste e já sem nenhum reparo
a fazer à metafísica
senão que é um défice
porventura
do córtex cerebral

Lisboa
3/18-VII-91, 20/21-XI-91, 22-I-92


Respiração Assistida
(foto: Luísa Ferreira)

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