domingo, fevereiro 25, 2024

ucraniana CCXXV - a derrota do jornalismo, da cidadania e da liberdade: dois anos de incompetência e miséria moral

Uma regra básica do jornalismo é a de ouvir ambas as partes em qualquer situação. E nem me refiro às versões dos dirigentes, que essas passam sempre de um modo ou de outro, mas as pessoas, os lados, e já agora também as opiniões.

Para além das doses maciças de propaganda a que somos sujeitos, algo nunca visto desde a Guerra Fria, para além da censura objectiva, como o do acesso aos canais russos (de propaganda, segundo a Comissão Europeia), não me lembro de ter assistido a um atropelamento tão grosseiro da liberdade de informar e do direito a ser informado.

Exemplo: enquanto que o sofrimento da população ucraniana é mostrado (e bem), o sofrimento dos russos do Donbass -- aqueles que o Bloco de Esquerda e o Livre esquecem quando dizem defender o direito à autodeterminação dos povos -- é praticamente silenciado, até porque ali não devem ter escolas, nem parques infantis, nem crianças (as tais que foram deportadas para a Rússia...).

Não é crível que, nomeadamente nas televisões e nas rádios, não haja jornalistas com deontologia. Claro que há; mas ou vão por sua conta, como Bruno Amaral de Carvalho (com o bónus de serem insultados por colegas de profissão), ou então é claro que não temos notícias do outro lado. (Honra seja feita à CNN-Portugal, creio que o único órgão de imprensa que transmitiu as suas reportagens).

Este atentado grosseiro à cidadania e à liberdade de informar e ser informado, é tragado por nós com a facilidade com que se bebe um copo de água.

Para além do básico, que é a ausência, ocultação e manipulação da informação, e do condicionamento dos cidadãos como se fossem atrasados mentais, temos o afastamento, silenciamento -- sem esquecer as múltiplas pressões e suspeições -- levantadas sobre quem tem uma perspectiva não alinhada (salvo, outra vez, a CNN-Portugal, apesar das doses maciças de propaganda da casa-mãe que despeja, e da impreparação de muitos dos pivôs). A RTP, televisão pública, é claramente insatisfatória, e é vergonhoso não ter ainda enviado um repórter para o Donbass, talvez porque o patrão não deixe. Tenho muitas vezes criticado José Eduardo Moniz, mas comparado com a nódoa do congénere da RTP, que nem sei quem é, fez mais aquele pela cidadania e pela liberdade, numa estação privada do que a televisão pública.

Poderia falar de outros casos grosseiros de manipulação e condicionamento, como o da Rádio Observador, para quem já nem serve o coronel Mendes Dias, assumido defensor de uma vitória do Ocidente, mas analista honesto, para não falar do major-general Carlos Branco, que rapidamente deixou de ser convidado para comentar. Para eles, militares só os majores-generais Isidro e Arnaut e civis do jaez do catedrático de circo cardinali que por lá têm. 

Claro que por muita censura da Comissão Europeia e manipulação merdiática, hoje podemos sempre aceder à informação que queremos, sem termos de estar exclusivamente sujeitos às declarações patetas dos nossos governantes e escapando à informação unilateral que procura impedir-nos de formarmos o nosso juízo.

Haver uma estação pública de televisão e rádio que, numa guerra desta magnitude e consequências, se abstém do dever de informar com equilíbrio e isenção, ouvindo e reportando o que sucede nos dois lados, é o grau zero do jornalismo, um atentado à cidadania, um crime contra a liberdade.   

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