quarta-feira, setembro 27, 2023

antologia improvável #512 - Mário de Sá-Carneiro


ESCAVAÇÃO


Numa ânsia de ter alguma cousa,

Divago por mim mesmo a procurar,

Desço-me todo, em vão, sem nada achar,

E minh'alma perdida não repousa!


Nada tendo, decido-me a criar:
Brando a espada: sou luz harmoniosa

E chama genial que tudo ousa

Unicamente à força de sonhar...


Mas a vitória fulva esvai-se logo...

E cinzas, cinzas só, em vez de fogo...

Onde existo, que não existo em mim?


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Um cemitério falso sem ossadas,

Noite d'amor sem bocas esmagadas --

Tudo outro espasmo que princípio ou fim...


Dispersão (1914) / Poemas Escolhidos (ed. Clara Rocha) 

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