Ao contrário do que se anda para aí a ulular como em matança de judeus, o juiz Ivo Rosa não ilibou José Sócrates; tanto assim que este irá a julgamento. O que não deixou -- como garante dos direitos dos cidadãos -- foi que a pesca de arrastão do Ministério Público fosse levada por diante. Há rede, mas só o que a malha tem dimensões prescritas pelos códigos; ora atendendo ao nível que foi demonstrado, à tabloidização mancomunada da Justiça, para cevar os feios, porcos e maus deste circo, a malha do MP era tão larga que parecia uma profissional da beira da estrada, quando deveria ser uma catequista da Estrada da Beira. Se o MP não tem meios, no que se acredita, mais criterioso, fino e rigoroso deve ser o seu trabalho. Caso contrário, arrisca-se à sua desqualificação pública, como sucedeu -- o que nem é para admirar: qualquer observador atento percebeu que a acusação da Venezuela era uma tanga; e o caso Vale do Lobo foi liminarmente anulado pelas declarações do então ministro do Ambiente. Quanto ao resto, não sei, não tenho opinião, não me pronuncio. Faz-me confusão os tipos da PT serem ilibados? Faz; mas não sei o que se passou e agradeço que não me expliquem, porque não tenho tempo.
Elogio o juiz Ivo Rosa por não deixar-se amedrontar pela forma como o quiseram condicionar -- e à frente de toda a gente. Politicamente, é uma catástrofe, e é bem feita. Quem esfrega as mãos de contentamento, afirmando-se "revoltado", é o gajo do verdadeiro partido dos animais & outros erros da natureza.
Tudo o que escrevi a propósito de Sócrates está por aqui.
4 comentários:
Ricardo,
Sem me armar em defensor de damas (mesmo sem conhecer o processo, sempre achei que havia por ali mais olho que barriga), não posso deixar de expressar a minha perplexidade perante a ligeireza da sua análise. Então o meu amigo acha digno de elogio um fulano que dá credibilidade plena às versões dos próprios arguidos e de outros amigos de Sócrates, ignorando ou desvalorizando as testemunhas da acusação, máxime, o Bataglia? O tipo mais não fez, para além de uma interpretação do direito no mínimo discutível (v.g. na questão da prescrição), do que erguer ao altar (tirando a tese, essa sim absurda, de o amigo C. S. Silva ter sido corruptor do Sócrates) a versão da defesa. E fez uma coisa ilegal e altamente perversa: pulando por cima do papel de juiz de instrução, que era o seu, fez um verdadeiro julgamento, como se fosse o juiz de primeira instância, e ainda por cima com base apenas na prova apresentada pela defesa. Como bem dizia, ontem, o M. Mendes, o homem é um perigo à solta!
Caro Fernando,
antes de mais, obrigado pela sua intervenção qualificada. E, sim, é verdade, a sua postura foi sempre crítica. Mas eu, por incompetência, não entro na análise jurídica da coisa, em que os próprios juristas divergem. E além disso, como bem sabe, não pude ouvir a leitura Mantenho a minha suspeita do barro atirado à parede, e também não tenho confiança no juiz Alexandre, por parcial.
O meu ponto é apenas este:
Todos vimos as pressões a que o homem foi sujeito na imprensa. O Correio da Manha, por exemplo, foi sempre descarado. A circunstância de ele não se deixar amedrontar ou condicionar (além de passar ao ataque, com o episódio do sorteio), merece a minha sinalização.
Eu não entro na história, demasiado fácil, de o juiz ter sido comprado, como o povo dizia por aí. Ele pariu seis mil páginas, pelo que deve ter ido ao pormenor. É a vez da Relação se pronunciar, esperemos que de forma mais elegante do que da outra vez, com o juiz das cabras.
O que me diz sobre a controvérsia a propósito da questão da prescrição dó desabona o legislador, que ou não sabe escrever ou mantém uma propositada nuvem de imprecisão. Ainda há pouco comecei a ouvir na televisão uma jurista dizendo que a jurisprudência no crime de corrupção se divide quanto á prescrição: se ela se dá dez anos após os contactos entre corruptor e corrompido ou apenas começa a contar depois de o corrompido receber a contrapartida... Com maravilhas destas produzidas pelas nossas luminárias do Direito, não é de admirar que todos andem à nora e que o povo se atire ao juiz.
Quanto ao resto: o Bataglia tem tanta credibilidade com o Professor Fofana. É um gajo qualquer de cuja boca o que sai pode ser verdade ou mentira, mas sempre por acaso. E o Marques Mendes é uma caricatura que só nesta parvalheira podia ter o palanque de que faz uso.
O santos Silva corruptor do Sócrates? De facto, só em histórias da carochinha (mas isso, convém dizer, porque ouvi as escutas telefónicas, oq eu não era suposto, mas que obviamente foi passado aos jornais pela acusação ou pelo próprio juiz Alexandre. Quando vejo agentes da justiça comportarem-se como aldrabões, o mínimo que posso dizer é que estão bem uns para os outros, e que nós não temos nada que ver com aquilo.)
Só para finalizar, e aqui, é a minha ignorância que se manifesta: se o que o juiz Rosa fez, exacerbando o papel de juiz de instrução, realizando o que foi chamado pré-julgamento -- se tal é ilegal como o meu caro diz, então ainda mais estupefacto fico, e suponho que o despacho venha a ser dado como nulo. Ou não?
Grande abraço
Começando pelo fim (da sua réplica) a resposta é que o despacho do jic nunca será declarado nulo por causa da substãncia ou conteúdo material da decisão. Poderia sê-lo se houvesse vício formal, o que não se vislumbra. Toda a gente tem direito à asneira e a consequência de uma má decisão judicial será (apenas) a sua revogação, total ou parcial, em instância superior.
Voltando à apreciação da prova, mormente a questão das transferências "salgadas", o que me repugna especialmente não é o facto de o Ivo ter descredibilizado as declarações do Bataglia, mas sim de as achar MENOS dignas de crédito que as do próprio Salgado e seus ajudantes/cúmplices/beneficiários.
Só mais uma palavrinha sobre a sua afirmação acerca das fugas de elementos processuais para os media: eu não acredito que tenha sido o MP ou o Juiz a fazê-lo. Se o admitisse, teria que fazer como o Caifás: rasgaria as minhas vestes! Salvo alguma perversa excepção (e admito que as haja, obviamente), um magistrado que se preze minimamente não se presta a tal baixeza. Nunca lhe ocorreu que a coisa possa ter vindo da própria defesa, para lançar a confusão e o descrédito sobre aqueloutros?
Caríssimo,
Não posso entrar nessas tecnicidades, mas agradeço a informação. Contudo, se ele cometeu uma ilegalidade, como diz, surpreende-me que tal não seja motivo para anulação. Mas, lá está, sobre o assunto nada percebo.
Como disse, não vi a leitura, e não sei se o juiz valorou de forma idêntica ou não os referidos testemunhos. Para mim, são todas indignas de crédito, as do Sócrates incluído. Não vejo ali ninguém merecedor de grande respeito. Se o juiz deu as palavras do Salgado como boas e não as do Bataglia, não vejo porquê. Para mim valem todas zero. Tem é de se provar; e quando a autoridade judicial comete atropelos, eu fico também de pé atrás.
Um dos atropelos cometidos foi a detenção do Sócrates em directo. Ora como aí ainda não havia advogados de defesa, por exclusão de partes, quem terá chamado os jornalistas para o país ver um ex-Primeiro Ministro ir dentro? Quanto às vestes, meu caro, espero que guarde a decência indumentária nos nossos próximos encontros.
Quero reafirmar o que escrevi, independentemente de outras considerações: os me(r)dia estavam de facas afiadas prontos para a golpear o juiz, se a decisão não fosse do seu agrado: a saber, a corroboração da acusação. Justiça? Querem cá saber... O que lhe interessa é sangue.
Acho magnífico alguém que se dispõe a enfrentar a turba, cumprindo o seu dever. Cometeu erros? Aí está a segunda instância para rectificá-los, ou não.
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