Ontem fomos ao Coliseu, ver a Rua Sésamo. No breve percurso entre a saída do metro no Rossio até à casa das Portas de Santo Antão, Lisboa apresentava-se como eu dela gosto: uma luminosidade ainda persistente no caminhar para o lusco-fusco, uma temperatura tépida que convidava a passear na rua e a sentar na esplanada, o velho comércio paredes meias com casas novas (uma delas a vender livros velhos, na qual entrei e ainda pude comprar, por um euro, duas peças do brasileiro Márcio Souza), gente de todas as paragens: alfacinhas como nós, imigrantes africanos, indianos, do Leste europeu, turistas, uma babel de idiomas que me agrada imenso. Ao lado, os professores juntavam-se e vociferavam. A meio do caminho, posto-me pela primeira visita diante do memorial ao cruel massacre dos judeus em 1506, cuja petição para que se tornasse realidade me orgulho de ter assinado. Atrás, um pouco desviada para a direita, a nefanda igreja de São Domingos, donde saíam os condenados à fogueira pela Inquisição. E de repente, toda aquela harmonia, toda a placidez que sentia com a minha família naquele fim de tarde se turvou, em face desse edifício esmagador, de significado histórico ignominioso. Felizmente, uns quantos indianos ou paquistaneses -- ou o que fossem --, encostavam-se ao memorial, com toda a descontracção, provavelmente não sabendo do seu significado -- ou sabendo-o mas encarando-o com a normalidade com que eu passo pela estátua de D. Pedro I, de António Duarte, aqui em Cascais. E ainda bem, pois o alheamento aparente desses estrangeiros, falando descontraidamente o seu idioma, introduziu uma nota de normalidade num ambiente que para mim de repente ficara malsão.
Gravura polaca ilustrando a "Matança da Páscoa",
como também ficou conhecido o massacre de 1506,
e o memorial recentemente erguido
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