quinta-feira, fevereiro 20, 2020

decidir aerobortos em cima do joelho porque sim, e é comer e calar; ou não queriam mais nada; ou vivam a Moita e Montalegre!

Alguém que ponha na ordem estes deslumbrados, que não há paciência para arrogância, autossuficiência, desprezo pelos concidadãos, falta de cultura democrática. Eu costumava achar piada aos jovens turcos do PS, pareciam-me arejados, sem desgaste pelas manhas do poder (ingenuidade) nem tiques autoritários.
Recentemente, João Galamba, investido de poder e secretarialmentedeestado engravatado, a propósito das aldeias do lítio em Montalegre, aduziu dois argumentos supostamente de peso para avançar com o processo de prospecção: primeiro, o concurso fora lançado pelo governo anterior (PSD) e o governo actual teria de o cumprir sob pena de pagar(mos) pesadas indemnizações, etc. -- a cantiga do costume. O segundo argumento: não pode uma população, neste caso as das aldeias afectadas pela extracção do lítio, condicionar o resto do país, até por uma questão de solidariedade com o todo nacional, e mais violinos.
Argumento parecido quanto ao aeroborto do Montijo, lançado pelo governo do PSD, ou lá o que foi, e que -- diz agora o ministro Pedro Nuno Santos que a Moita (esquecendo-se dos outros, mas que fosse só a Moita...) não pode negar uma oportunidade que afecta o país.

Este episódio mostra bem que a coisa foi decidida em cima do joelho, tipo petit comité de estado-maior governamentalo-partidário. Só agora, depois desta conversa toda, se aperceberam que foram apanhados com as calças na mão. Para que servem os batalhões de assessores, juristas e outra macacaria? (Sobre isto haveria muito a dizer, mas não quero desviar-me.) Arrumando a questão legal: estamos todos fartos dos factos consumados e das pesadas heranças transmitidas de um governo para outro, das obrigações legais urdidas sempre pelos mesmos. Aqui, já não se fala em mudar a lei, curiosamente -- até porque, como disse um conhecido facilitador de negócios, a esta hora já os caterpilares deveriam estar a trabalhar no Montijo…

Mas isto são questões legais com contornos duvidosos, pouco claros, assuntos eventualmente de polícia e justiça, a gangrena de que se alimentam agremiações manhosas como o Chega e quejandos, pasto para invejosos e desiludidos da vida (a propósito: alguém foi julgado e condenado, alguém foi para a cadeia por causa do nascimento do Siresp? Já quase ninguém se lembra, não é? Provavelmente até já prescreveu a negociata enjorcada por um ministro de saída, e que o governo seguinte lá teve endossar sob pena de o Estado ter de pagar chorudas indemnizações, ou seja, corrupção e rapina -- ou seja, vileza.

Politicamente gravíssimo é o autoritarismo revelado pela dupla Galamba & Santos. Para o primeiro, as aldeias de Montalegre têm de amochar para benefício do país todo. Pois não têm; têm o dever de exigir um debate muito alargado no seu município, e só a eles caberá decidir se estão ou não de acordo com a abertura dessas minas à exploração, com contrapartidas muito bem definidas no caso de concordância, sendo o Governo o mediador entre população e empresa. Mas só e apenas nesse caso. Se não concordarem, que vão prospectar e abrir buracos para outro lado. O mesmo se passa com a Moita e os restantes municípios contrários ao aeroporto. Não querem, não há, ponto final. E escusa o ministro de vir fazer voz grossa e ameaçar com um rolo compressor legislativo para cilindrar as populações. (Aliás, estas têm tanta ou mais razão quando se vê agora que foi tudo decidido em cima do joelho.) Em democracia é o povo quem mais ordena; aqui sim, justifica-se um referendo, exclusivamente local e vinculativo se a participação for superior a metade do número de eleitores, após uma campanha com debate, esclarecimento, contrapartidas no papel. E só aí: tudo o resto é antidemocrático, anti-ético, e como tenho escrito, legitima toda a resistência não-violenta.
Aliás, se a decisão for para a frente, contra tudo e contra todos, a ocupação do terreno pelas populações não só está mais do que justificada, como é um imperativo ético, em nome do presente e das futuras gerações.


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