quarta-feira, julho 02, 2014

um embaixador pelintra

Após a Revolução de 1688, em Inglaterra, D. Pedro II incumbiu o Conde de Pontével de acompanhar o regresso a Portugal da viúva de Carlos II, Catarina de Bragança, sua irmã, tendo para o efeito obsequiado D. Nuno da Cunha de Ataíde com generosas "ajudas de custo".
Chegado a França, este foi confrontado com a impossibilidade do regresso imediato de D. Catarina, pelo que ficou por Paris, aguardando por instruções.
José da Cunha Brochado conta ser a avareza de Pontével de tal forma exacerbada, que o comportamento do aristocrata -- recorde-se, embaixador do rei de Portugal -- envergonhava, por, em tudo, do alojamento ao modo como se fazia deslocar, ser indigno dessa condição. Não esqueçamos, também, que estamos em plena corte de Luís XIV, o Rei-Sol, na qual se codificou a etiqueta -- que era muito mais do que um regulamento de boas maneiras --; e que as atitudes impróprias de um representante do Pacífico, comprometiam o estatuto do país e do seu soberano.
Brochado termina este apontamento "calando mil outras indignidades", informando que o conde aproveita boleia no navio para Lisboa do recém-nomeado embaixador de França em Portugal, que tudo tentou para eximir-se ao frete, sem sucesso, lançando aquele mão dos "mais infames meios" para ser bem sucedido, acabando por sujeitar-se "a vir mal acomodado, e de uma maneira indecente ao seu carácter." (isto é, categoria).

Início: «Resolvendo a Rainha D. Catarina voltar para Portugal depois da última revolução de Inglaterra mandou El-Rei o Conde de Pontével para a conduzir em qualidade de Embaixador a quem deu grossas ajudas de custo.»

Um parágrafo: «Sendo Paris uma Corte em que todo o mundo anda em carroça, ele andava a pé sem nenhuma autoridade, imaginando que em levar diante de si os seus Gentis-homens mal vestidos, tinha a equipagem que lhe bastava; e sendo advertido que devia alugar uma carroça, respondeu muito deveras que queria fazer exercício, como se este se fizesse andando atropelado pelas ruas, e fossem para isso piores os passeios, e os jardins públicos.»

Memórias de José da Cunha Brochado, edição de Mendes dos Remédios [1909], fac-símile, Cascais, Câmara Municipal, 1996, pp. 1-4. 

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