quarta-feira, novembro 11, 2020

o pintor poeta, o cronista e o tradicionalista visionário

 Dizer que em três dias o país ficou mais pobre é um grande cliché? Então eu digo: em três dias o país ficou muito mais pobre.

Artur do Cruzeiro Seixas (n. 1920) só pelo que representava como um dos surrealistas iniciais assumidos enquanto tal -- o Grupo Surrealista de Lisboa, que em 1949 perguntava até quando o medo num país guardado pela pide, coisa muito de se arrecear, pergunta que exigia tomates volumosos, ou não estivesse isto tudo salpicado de bufos e legionários. A sua pintura deixa-me frio, devo dizer, ao contrário de algumas assemblagens. mas a sua poesia límpida, publicada em bloco tardiamente, organizada por Isabel Meyrelles, foi a revelação de um autor excepcional. Morreu no dia 8.

Artur Portela, Filho (n.1937), um publicista fulgurante, uma mistura de Camilo e Eça, entre o escárnio e e a ironia, era devastador. Os volumes de A Funda, sete, aí estão para o comprovar, e são testemunho do período de transição do Estado Novo para a democracia. O jornalismo político passa por ele. Não li nenhum dos seus romances. Morreu ontem, dia 10.

Hoje, Gonçalo Ribeiro Telles (n. 1922), monárquico, oposicionista, porta da paisagem, porta da ecologia. Quem deambula nos jardins da Gulbenkian na canícula estival sabe-o. Tradicionalista e progressista no melhor sentido, municipalista, comunalista, fundou o PPM, com Henrique Barrilaro Ruas, medievalista e camonista de grande relevo. Teve o cargo político mais extraordinário que já existiu num governo, o de ministro da Qualidade de Vida.



8 comentários:

Jaime Santos disse...

Devo confessar que ouço falar de Cruzeiro Seixas na hora da sua morte. De Portela recorda-me porventura da sua última entrevista. Já Ribeiro Telles é uma das figuras mais importantes da política no pós-25 de Abril, ombreia com Mário Soares, Sá Carneiro e Freitas do Amaral (excluo o Álvaro Cunhal, porque não assumiu funções governativas, excepto nos Governos Provisórios).

R. disse...

Simbolicamente, ele é um dos rostos da AD, e vinha já da oposição ao Salazar. Aliás, o próprio MUD e a campanha do Norton de Matos congregou a malta toda, dos monárquicos aos anarquistas. Todos queria ver-se livres do Manholas.

Jaime Santos disse...

Era um Conservador no melhor sentido da palavra. Os Conservadores modernos só querem conservar os seus privilégios.

Talvez Ribeiro Telles fosse na verdade um Fisiocrata :) ...

R. disse...

A mais gira que lhe ouvi foi a defesa do comunalismo, não me lembro se ainda no PPM ou já no MPT, que também fundou com Barrilaro Ruas.

Jaime Santos disse...

Disse ontem à minha Mãe, quando se mostraram imagens de arquivo em que ele estava sentado ao lado de Duarte Pio que ele teria dado um Rei bastante melhor que o pretendente, que isso da Monarquia tem pouco a ver com o mérito.

Ela, republicana como eu, respondeu que até nós votaríamos em D. Gonçalo, primeiro de seu nome, para Rei de Portugal :) ...

R. disse...

Também há monarquias electivas, mas não vejo grande vantagem...

Jaime Santos disse...

De facto, a única que sobrevive é, julgo eu, a do Vaticano, dado que os soberanos não deixam descendência (que se saiba :) )...

Historicamente, o Sacro-Império Romano também era uma Monarquia Electiva... Assim, como o califado islâmico...

Eu vejo uma imensa vantagem, o mandato é para a vida, mas sempre se escolhe alguém com alguma garantia de mérito... Ou simplesmente quem consegue comprar os votos dos eleitores...

R. disse...

Não creio que haja exemplo nas monarquias constitucionais.