Após alguma hesitação, decidi deixar-me ir no voto em Marcelo Rebelo de Sousa, a minha estreia num voto à direita em Presidenciais. Conheço bem os seus defeitos e nunca fui seguidor dos comentários televisivos, que por aqui várias vezes critiquei. Mas também reconheço as suas qualidades, a sua preparação para o exercício do cargo, a sua postura democrática, não sectária e humanista, em perda neste tempo de abutres e patifes à solta.
Por outro lado, Marcelo é o único candidato verdadeiro a presidente. Poderia votar em branco, já me aconteceu, mas não vejo razão neste caso. Vai ajudar a levar a direita ao poder? Porte-se a esquerda como deve, como fez o PCP ao contrário do BE.
Em terceiro lugar, Marcelo é o candidato para o agora; não só porque é o único real (os outros estão a brincar às presidenciais), como o que tem estofo e lastro -- e eu não estou para aturar tacticistas nem boçais. Com os problemas com que nos debateremos, confio em que terá uma actuação ponderada. Gosta dos "privados"?, é "papa-missas"? Quero lá saber, é para o lado que durmo melhor.
E para ser honesto, a possibilidade de enganar-me redondamente e Marcelo vir a fazer um mau segundo mandato (não seria o primeiro), será aborrecido, mas ficarei confortado pelo facto de o meu voto não ter sido decisivo para a reeleição, mais do que garantida.
Cheguei a ponderar em votar em João Ferreira, não apenas por ser o melhor dos restantes candidatos, em preparação e postura não demagógica, mas porque se o PCP perder força a sociedade fica entregue aos bichos. É um caso a ver depois das eleições, porque voto em quem me apetece.
Ana Gomes. É uma candidatura que emerge da politicalha partidária, uma casca de banana que Assis lançou a Costa. Não tenho paciência, por mim o Assis pode ir dar sangue. Claro que Ana Gomes não é uma boneca de Assis, é uma mulher corajosa e uma diplomata experimentada, mas não tenho nada que ver com aquilo.
Marisa Matias. Gosto imenso dela, seriíssima, dedicada, empática, afável. Joga num tabuleiro que não é o meu, e que abomino, as parvoíces do Bloco de Esquerda. Quando diz "a todos e a todas" tenho vómitos. Não por causa da questão da igualdade de género, pois considero que todo o homem decente deve ser feminista, mas pela manipulação da linguagem, que é algo terrível.
Tiago Mayan Gonçalves. A boa surpresa da campanha quanto à prestação, candidato ideológico, o que só lhe fica bem. O modelo de sociedade que propõe é lindo, mas não para este país com povo e elites de terceiro mundo. Ainda estamos a pagar a factura do atraso a que o Salazar nos votou.
Vitorino Silva. Há cinco anos creio que lhe chamei o nosso Tiririca. Errado. Tornou uma candidatura espontânea em algo refrescante. Impôs-se por não ser parvo. Óptimo para o voto de protesto.
André Ventura. Boi e bobo. Boi na postura avinhada e de taberna (ficámos a saber que é neto de alcoólicos), na provocação e nos ventos que semeia que lhe ia valendo um calhau na mona. Bobo, porque é uma marionete -- marionete de si próprio, para começar, porque diz o que acredita que rende e num segundo incha que nem um sapo, e marionete da gente que o financia, vá lá saber-se porquê e para quê. Mas eles sabem.
Fala-se na possibilidade de uma segunda volta, na eventualidade de uma abstenção catastrófica. Se a lei o permitisse, faria sentido adiar a eleição para Maio ou Junho; ninguém falou nisso, à excepção de Vitorino Silva.
10 comentários:
Subscrevo o que diz em relação a MRS. É o único que está preparado para ser Presidente, seja pela sua formação enquanto Professor de Direito Constitucional, seja pela longa carreira política. Viu-se nos debates que joga noutra divisão.
Também não subscrevo a ideia de que quer ser um segundo Cavaco ao estilo de Cavaco II, como penso ser a sua opinião.
Primeiro porque gosta de Costa, que não é Sócrates, e depois porque não o vejo como serventuário de um projecto de Direita radical, que será para onde o PSD irá divergir quando por lá fizerem a folha a Rui Rio e chamarem Passos do seu exílio auto-imposto como Prof. Catedrático Convidado :) ...
Marcelo é porventura o último dos Moicanos, leia-se da Direita Social Cristã... Pelo menos dos que contam... Mau grado o maquiavelismo e uma certa tendência para a politiquice, que o prejudica mais a ele do que a terceiros, é um homem decente, bem-educado e culto.
É possível dizer da visão soberanista de João Ferreira (expurgada do marxismo-leninismo, bem entendido, mas mantendo os aspectos socialistas democráticos) o mesmo que você diz da visão de Mayan Gonçalves. Lamentavelmente, não conheço nenhuma democracia em que uma ou outra sejam aplicadas.
A Venezuela, ou Cuba ou o Vietname ou a China são um pesadelo e a Hungria do flat tax também o é. Já sei que Mayan Gonçalves vai falar da liberal Holanda ou da Irlanda ou do Luxemburgo, mas são todos paraísos fiscais onde impera o 'beggar thy neighbour' (ou seja, ficam com os impostos das empresas que fogem para lá) e também não sei se os modelos da República Checa ou dos países bálticos são recomendáveis (estes durante a crise exportaram 10% da sua população se bem me lembro, algo impossível num País dez vezes com a população deles, como o nosso).
Qual então a minha preferência? A social-democracia nórdica, mesmo se já não é o que era (o que se calhar nem é completamente mau). Aliás, nós temos níveis de despesa pública (gastos com o Estado per si, mais as transferências sociais) próximos desses países, acima da Alemanha e muito acima do RU e da Irlanda. O nosso Estado até é moderno em muitos aspectos (a começar pelo SNS, mau grado a falta de investimento), a Economia é que é um desastre. E isso provavelmente deve-se mais à má gestão privada do que ao terrível socialismo, a bete noir de Gonçalves...
Seria bom que tivéssemos um Partido genuinamente Liberal (se calhar seria nesse dia que eu passaria a militar num). Não um que reduz o Liberalismo a uma caricatura da ideologia de Hayek, mas um que adoptasse o pragmatismo de outro liberal, Maynard Keynes, para quem a intervenção estatal era benéfica e deveria ser assumida. Os marxistas têm razão ao dizer que o neoliberalismo também é intervencionista, mas em favor dos ricos.
Não me importo que haja socialismo para ricos, desde que fiquem algumas migalhas para os pobres :) ...
Acho que é injusto com Ana Gomes. Ela não é nenhum joguete de Francisco Assis, pessoa aliás com qualidades e dos poucos políticos à Esquerda com pensamento estruturado para além das cassetes do costume. Gostava muito de ler as colunas dele no Público. Lembre-se que apoiou Hadad sem qualquer rebuço, mau grado este último ser bastante mais à Esquerda...
Ele é que quis saltar para a carripana de Gomes e não levou grande troco, provavelmente porque ela lembra-se que ele defendeu Sócrates.
Não, Gomes candidata-se porque acha, e bem, que má é a eleição em que alguém da área do PS não vai a jogo (repare que ela apoiou Sampaio da Nóvoa em 2016, e não Maria de Belém).
O problema dela é outro. Penso que não tem um pensamento estruturado, mesmo em relação ao combate à corrupção, a sua dama, e cai facilmente num discurso populista.
Mas é uma mulher corajosa e com um currículo de serviço público inegável, nomeadamente no processo da independência timorense. Devemos-lhe a ela, a Guterres e a Sampaio o lavar da nódoa que foi o abandono de Timor à Indonésia.
Mas vai levar o meu voto pelas razões que já apontei. Ou seja, não porque me convença, mas para chatear o outro gajo...
Eu subscrevo o que diz sobre ela; mas a verdade é que foi o Assis o primeiro a avançar com o nome dela. Mas isso é o menos, ela não é uma yeswoman de ninguém.
Em condições normais, os 10% seria o máximo que o Ventura poderia almejar, porque as pessoas também não são todas parvas e percebem que há ali muito faz de conta. Mas se a abstenção for muito elevada, não faço ideia do que poderá acontecer.
Acho que o Assis se quis colar a Ana Gomes, porque sabe que ela não vai com a cara de Costa (apoiaram ambos Seguro, mesmo se Assis foi o único que lhe fez frente no nadir do PS em 2011). Ele tem estado bastante calado desde que lhe arranjaram a sinecura do CES.
O lema de Costa é 'circunscrever, quando não se pode nem absorver nem eliminar' :) ...
Pois, o problema com Ventura é que ele criará um problema à Direita se ficar em segundo lugar (obrigará Rio a radicalizar o discurso) e criará um grande problema à Democracia se passar a uma segunda volta por via da abstenção. Seria cilindrado, mas iria fartar-se de cantar de galo... A FN nunca mais parou depois de 2002...
Uma segunda volta entre Marcelo e Gomes só cria um pequeno problema a Marcelo e será uma boa lição dada a forma displicente como (não) fez campanha (nem tempos de antena teve, o que é um desrespeito pelos outros candidatos).
E cria, claro, um valente problema a Costa. Mas com franqueza, isso é para o lado que eu durmo melhor...
Sim o Costa é mestre nesse tipo de jogadas florentinas.
Não sei se com aquele linguajar de taberna ele criará assim tantos problemas aos PSD. Hoje veremos, mas os 10% parece-me o máximo que ele poderá almejar, mesmo com gente que vita nele porque sabe que não tem hipóteses.
Acho também a nossa situação muito distinta da francesa, pesno que não dá para extrapolar.
Se se confirmarem os dados sobre o nível de afluência às urnas, não haverá segunda volta, e creio que A ana gomes ficará em segundo. Cá em casa foi fifty-fifty, e a filha tresmalhada pelo casamento marisiou-se...
Meu caro, podem tresmalhar-se à vontade, desde que não alinhem em menturas, ventiras e andrebices :) ... Todos os candidatos democráticos são escolhas legítimas, porque são todos democratas e homens e mulheres decentes...
Sim, pela afluência atual, próxima da de 2011, não deverá haver segunda volta. Mas, como diz o cego, logo veremos...
andrebices é porreiro...
veremos, veremos
O resultado é triste, mau grado Gomes ter mandado Ventura para o terceiro lugar, mas por uma unha negra. Ele já se demitiu dizendo que se recandidata :( ...
Acabamos de saber que meio milhão dos nossos compatriotas se reveem nas posições machistas, racistas e homofóbicas de Ventura e não me venham falar em voto de protesto. Voto de protesto é no PCP!
As menturas, ventiras e andrebices são marca registada do RAP :) ...
Ah, ok, não sabia dessa...
Eu, optimista, não dou muito por aquilo; não tem consistência nenhuma -- imagine quando os tipos tiverem um grupo parlamentar, duas possibilidades: ou os deputados vão ser os seguranças e os devotos descerebrados do Ventura, ou então alguns tipos mais sofisticados que também por lá há, centrando-se, e portanto deixa de ser o Chega. Nem vejo grande condições, numa situação normal par aquilo crescer mais. Mas depende também das asneiras que o PSD possa ou não fazer. E depois o tipo incha como um sapo, correndo o risco de esvaziar-se com estrondo...
Deus, em quem eu não acredito, o ouça...
Meu caro, Trump não tinha consistência nenhuma, era um mentiroso contumaz e um fanfarrão muito pior que Ventura mas quando se esvaziou com um estrondo foi o que se viu.
A História mostra que ditadores e torcionários eram a mais das vezes gente francamente incapaz... Não estou a dizer que Ventura é um novo Salazar (até porque esse era um homem culto e inteligente, coisa que Ventura não parece ser, é apenas mais um xico-esperto), mas muito mal pode ele ainda fazer.
Mas o que me entristece mais é que haja tanta gente que não sinta qualquer nojo de votar nele...
Pois, o Trump... São parecidos na aldrabice e na falta de escrúpulos; mas, feliz ou infelizmente, o Ventura não é autossustentável, está sempre dependente dos que o financiam. É sem dúvida um caso a acompanhar.
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