quarta-feira, fevereiro 26, 2020

na estante definitiva

Não tem rosto de mulher, a guerra, proclama Svetlana Alexievich, e com verdade: haverá algo mais contranatura do que ter capacidade para gerar vida e em simultâneo tirá-la? No entanto, numa breve nota preambular, reproduzindo uma conversa com um historiador (pp. 11-12) não identificado -- Alexievich utiliza o método do inquérito antropológico e sociológico do informante, ocultando a identidade dos seus entrevistados --, somos esclarecidos que mulheres guerreiras houve-as desde a Antiguidade grega; e que na chamada Grande Guerra Patriótica um milhão de mulheres soviéticas integraram o Exército Vermelho, desempenhando todas as tarefas e missões que um conflito em larga escala implica; de tal modo que o léxico russo teve de adaptar-se à femininização de vocábulos até então exclusivamente masculinos.
Svetlana Alexievich, A Guerra não Tem Rosto de Mulher, (1985 - 1ª edição na União Soviética)

«Leitor de BD»

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sobre O Raio U, de Edgar Pierre Jacobs

terça-feira, fevereiro 25, 2020

segunda-feira, fevereiro 24, 2020

sábado, fevereiro 22, 2020

«St. Louis Blues»

VPV - a morte do cronista

O maior cronista português é o Eça de Queirós; nem estou a ver quem lhe possa chegar perto.  Cultura fortíssima, ideias, convicções, um estilo arrebatador, e o humor .Para mim, a crónica queirosiana não é menos importante que a obra romanesca; estou quase tentado a dizer, antes pelo contrário...
Vasco Pulido Valente, historiador e também polemista temível foi o maior cronista do seu tempo, em que se conjugavam uma base cultural vasta e sólida, uma forma literária de primeira grandeza e uma óbvia inteligência e perspicácia. A História, aliás, dava-lhe uma perspectiva sobre o presente que não assiste à maioria dos que escrevem.

quinta-feira, fevereiro 20, 2020

decidir aerobortos em cima do joelho porque sim, e é comer e calar; ou não queriam mais nada; ou vivam a Moita e Montalegre!

Alguém que ponha na ordem estes deslumbrados, que não há paciência para arrogância, autossuficiência, desprezo pelos concidadãos, falta de cultura democrática. Eu costumava achar piada aos jovens turcos do PS, pareciam-me arejados, sem desgaste pelas manhas do poder (ingenuidade) nem tiques autoritários.
Recentemente, João Galamba, investido de poder e secretarialmentedeestado engravatado, a propósito das aldeias do lítio em Montalegre, aduziu dois argumentos supostamente de peso para avançar com o processo de prospecção: primeiro, o concurso fora lançado pelo governo anterior (PSD) e o governo actual teria de o cumprir sob pena de pagar(mos) pesadas indemnizações, etc. -- a cantiga do costume. O segundo argumento: não pode uma população, neste caso as das aldeias afectadas pela extracção do lítio, condicionar o resto do país, até por uma questão de solidariedade com o todo nacional, e mais violinos.
Argumento parecido quanto ao aeroborto do Montijo, lançado pelo governo do PSD, ou lá o que foi, e que -- diz agora o ministro Pedro Nuno Santos que a Moita (esquecendo-se dos outros, mas que fosse só a Moita...) não pode negar uma oportunidade que afecta o país.

Este episódio mostra bem que a coisa foi decidida em cima do joelho, tipo petit comité de estado-maior governamentalo-partidário. Só agora, depois desta conversa toda, se aperceberam que foram apanhados com as calças na mão. Para que servem os batalhões de assessores, juristas e outra macacaria? (Sobre isto haveria muito a dizer, mas não quero desviar-me.) Arrumando a questão legal: estamos todos fartos dos factos consumados e das pesadas heranças transmitidas de um governo para outro, das obrigações legais urdidas sempre pelos mesmos. Aqui, já não se fala em mudar a lei, curiosamente -- até porque, como disse um conhecido facilitador de negócios, a esta hora já os caterpilares deveriam estar a trabalhar no Montijo…

Mas isto são questões legais com contornos duvidosos, pouco claros, assuntos eventualmente de polícia e justiça, a gangrena de que se alimentam agremiações manhosas como o Chega e quejandos, pasto para invejosos e desiludidos da vida (a propósito: alguém foi julgado e condenado, alguém foi para a cadeia por causa do nascimento do Siresp? Já quase ninguém se lembra, não é? Provavelmente até já prescreveu a negociata enjorcada por um ministro de saída, e que o governo seguinte lá teve endossar sob pena de o Estado ter de pagar chorudas indemnizações, ou seja, corrupção e rapina -- ou seja, vileza.

Politicamente gravíssimo é o autoritarismo revelado pela dupla Galamba & Santos. Para o primeiro, as aldeias de Montalegre têm de amochar para benefício do país todo. Pois não têm; têm o dever de exigir um debate muito alargado no seu município, e só a eles caberá decidir se estão ou não de acordo com a abertura dessas minas à exploração, com contrapartidas muito bem definidas no caso de concordância, sendo o Governo o mediador entre população e empresa. Mas só e apenas nesse caso. Se não concordarem, que vão prospectar e abrir buracos para outro lado. O mesmo se passa com a Moita e os restantes municípios contrários ao aeroporto. Não querem, não há, ponto final. E escusa o ministro de vir fazer voz grossa e ameaçar com um rolo compressor legislativo para cilindrar as populações. (Aliás, estas têm tanta ou mais razão quando se vê agora que foi tudo decidido em cima do joelho.) Em democracia é o povo quem mais ordena; aqui sim, justifica-se um referendo, exclusivamente local e vinculativo se a participação for superior a metade do número de eleitores, após uma campanha com debate, esclarecimento, contrapartidas no papel. E só aí: tudo o resto é antidemocrático, anti-ético, e como tenho escrito, legitima toda a resistência não-violenta.
Aliás, se a decisão for para a frente, contra tudo e contra todos, a ocupação do terreno pelas populações não só está mais do que justificada, como é um imperativo ético, em nome do presente e das futuras gerações.


quarta-feira, fevereiro 19, 2020

JornaL

Aeroaborto. Ouvi na rádio: sem parecer vinculativo das autarquias envolvidas, aborta o aborto do Montijo -- pelo menos à face da Lei, que parece que é para respeitar, sob pena de processo, julgamento e cadeia. Como a as autarquias do PCP, Moita e Seixal, protegendo as suas populações, irão vetar aquela miséria, pensada para encher mais os bolsos para alguns (o 'Turismo', ai o 'Turismo'...), temos o aeroporto do Montijo abortado. Ou será que não?... Vamos lá a estar atentos às manigâncias, sim?... E o secretário-de-estado, a fazer de nós estúpidos e dos pássaros inteligentes. Vão ouvir a crónica do Bruno Nogueira de hoje na TSF.

Racismos. Dou parcialmente razão ao Pinto da Costa: aquela manifestação dos símios do Guimarães, mais do que uma manifestação de racismo é-o antes de estupidez. O plantel está cheio de negros, e uma das sua principais figuras, Neno, que creio também ser dirigente, antigo guarda-redes que passou também pelo Benfica, é negro. Atribuo o primarismo da manifestação, em primeiro lugar, a uma boçalidade que ainda não nos largou enquanto povo. É sabido como somos atrasados, impreparados, incultos e aldrabões -- embora com cada vez mais e maiores bolsas de "excelência". Quando eu era miúdo, na primária, cantava com os meus colegas: "Em Macau, o bom chinês limpa o cu ao português". O país ainda é muito isto; e o racismo larvar é mais animal que pérfido. Em tempo, e para o tempo: falo do caso Marega.

Vergonha. É algo que a Igreja Católica não tem, nem nunca teve. Aqueles nacos de homilias nas missinhas de Domingo, passados no Telejornal, são do melhor que tenho visto. Ai os padrecas, que me moem a paciência.

1820. É verdade: este ano comemora-se o Bicentenário da revolução de 1820, aquela que, entre outras coisas, arejou a sacristia que era este país.
O Deus verdadeiro. O Eric Clapton tocou ontem com o Roger Waters em Londres.

terça-feira, fevereiro 18, 2020

«Intruder»

«Leitor de BD»

sobre Promenade de la Mémoire, e mais

criadores & criatura



Malik, Terence e Archie Cash


sábado, fevereiro 15, 2020

na estante definitiva

«Bendito Aquele que tem o reino dos céus e da Terra, que comanda a imensidão do Espaço, que conhece o Tempo…» Alcorão, XLIII, 85 -- epígrafe de O Meu Coração É Árabe. Apesar de confundir-se, erradamente, árabe e muçulmano, não há dúvida que foi no mundo árabe que surgiu a religião de que Maomé se fez profeta. Enquanto leitor, neste caso, de uma antologia poética, direcciono o meu entendimento do Divino, aqui saudado através do livro sagrado do Islão para o Verbo -- o Verbo que abarca tudo; tempo e espaço, a matéria e o intangível. O verbo manejado pelo profeta, pelo poeta.
Adalberto Alves, O Meu Coração É Árabe -- A Poesia Luso-Árabe, Lisboa, Assírio & Alvim, 1987.


sexta-feira, fevereiro 14, 2020

«Leitor de BD»

sobre Champignc -- Enigma,
de BéKa e David Etien

quinta-feira, fevereiro 13, 2020

«Grand Hotel»

referendar a liberdade individual

Referendar direitos individuais é uma aberração. Por isso fui contra o referendo sobre a despenalização do aborto, independentemente da minha posição que era, e é, restritiva.
O que mais me horroriza é a falta de honestidade intelectual e a pulhice dos que pretendem impor a terceiros as suas convicções religiosas, para mim fantasmagorias sem sentido.
Entendo que, por razões éticas, embora questionáveis, alguém possa apresentar-se contra a despenalização da eutanásia. Entendo e respeito a posição do PCP, embora discorde dela, pondo-se do lado dos mais fracos, vítimas potenciais de um descarrilar do processo. Percebo perfeitamente, mas não aceito, que em nome de preocupações legítimas, que têm que ver com a qualidade das leis e o funcionamento do Estado, se possa restringir a liberdade individual de cada um poder dispor da sua vida, não como bem entende, ainda não chegámos aí, mas em situações de grande sofrimento.
Agora o que não suporto é que as religiões se atrevam a condicionar pessoas como eu. Respeitando a liberdade de cada um de praticar a sua fé, não admito que em nome de parvoíces com que pastoreiam o rebanho, me venham impor as crendices com que se entretêm. E, portanto, tem de dizer-se que um sector liderado pela Igreja Católica que se apresenta contra a despenalização da eutanásia mais não quer que impor, ilegitimamente e com desonestidade intelectual, as convicções religiosas que livremente professam, procurando restringir a liberdade dos outros, recorrendo a argumentos ad terrorem e a toda a sorte de jogo sujo em que são useiros e vezeiros.

«Parasitas»

Parasitas (2019), de Bomg Joon Ho

Entre a farsa e o abjecto, presente também nos locais menos óbvios, pormenores de realização que transformam a crueza dum antagonismo de classes num exercício  de onirismo alucinante.



quarta-feira, fevereiro 12, 2020

JornaL

Coronelismo. O governador do estado brasileiro da Rondônia proibiu nas escolas livros de Machado de Assis, Euclides da Cunha, Mário de Andrade e outros. Chama-se a isto extrema-direita cavalar.

Eutanásia, assunto em que a Igreja detém a maior expertise, ou não registasse no seu cadastro uma prática recorrente, tantas foram as almas perdidas a agonizar nas fogueiras da Inquisição -- sem esquecer os nímios cuidados paliativos aplicados nos cárceres da santa instituição. Ando a ficar um bocado farto destes gajos.

Farto. Alexandre Farto, mais conhecido por Vhils, numa entrevista ao JL de hoje expressa a convicção no poder da arte em influenciar e alertar para a necessidade de transformação social. Sempre foi essa a arte que mais me interessou, talvez por ser um tipo muito concreto, como certa vez disse pessoa amiga; sempre tive pouca paciência para os orgasmos solitários e menos ainda para o tricot. Ou seja: entre Cesário Verde e António Nobre, gostando de ambos, preferirei sempre o Cesário. 

terça-feira, fevereiro 11, 2020

segunda-feira, fevereiro 10, 2020

na estante definitiva

Cacau, de Jorge Amado (1912-2001) não é certamente um dos melhores dos seus livros (para mim, Mar Morto, Gabriela, Cravo e Canela e Tenda dos Milagres, entre outros).
Por que o ponho então na minha estante definitiva? Porque, tratando-se da segunda narrativa do jovem autor (vinte e um anos), depois da surpresa inicial de O País do Carnaval (1931), que é outra coisa, o romancista viril de putas e vagabundos, como o próprio se caracterizava, está todo aqui em potência.
Claro que as chamadas putas e os alegados vagabundos são os descamisados, os outlaws, os negros, descendentes e ex-escravos, e o gosto indeclinável pela beleza feminina, coisas que incomodam os nefelibatas.
Em nota prévia, o alerta semelhante que já Ferreira de Castro (que ele lera) fizera em Emigrantes (1928) e Alves Redol faria em Gaibéus (1939): «Tentei contar neste livro, com um máximo de honestidade, a vida dos trabalhadores das fazendas de cacau do sul da Bahia. / Será um romance proletário?»

da posse: Janeiro de 2003.



Jorge Amado, Cacau [1933], Lisboa, Planeta DeAgostini, s.d.
ilustrações: Santa Rosa


sábado, fevereiro 08, 2020

quinta-feira, fevereiro 06, 2020

na estante definitiva

Há quem diga Jaime Cortesão (1884-1960) o maior historiador português do século XX, avaliação sempre difícil de fazer-se, o maior romancista, o maior pintor, o maior compositor... No caso de Cortesão, ele encontra-se sem dificuldade nos cinco dedos de uma mão.
Este livro documenta a curta passagem do historiador pelo seu país, na cadeia, entre dois exílios. É que também enquanto personagem, foi igualmente marcante no seu tempo.
Uma breve nota para dizer que Alberto Pedroso salvou estas cartas da venda a peso como lixo, tal o destino que teve a papelada da Seara Nova pertencente a Câmara Reys (1885-1961), de que foi fundador e director até morrer.
A epígrafe é um excerto extraordinário de uma carta dirigida a Raul Proença, também do Forte de Peniche, em 14 de Julho de 1940: «... Quero sem tardar, tranquilizá-lo sobre as minhas convicções políticas de hoje. Continuam a ser integralmente as mesmas, que estabeleceram entre nós uma tão estreita solidariedade moral e intelectual. Tranquilize-se. Cada vez sinto mais que em afirmar a minha fé antiga está o meu dever de homem e de escritor…»
Há homens que têm fibra; e há outros que não. E torna-se necessário dizer que esta  antiga foi Cortesão bebê-la ao ideário anarquista de Proudhon e outros, tal como sucedeu com Antero, Eça, Raul Brandão e Ferreira de Castro, para citar alguns.
Da posse: Janeiro de 1993. 



Jaime Cortesão, 13 Cartas do Cativeiro e do Exílio (1940), recolha, introdução e notas de Alberto Pedroso, Lisboa, Biblioteca Nacional, 1987, 107 págs. Capa: José Maria Saldanha da Gama.

quarta-feira, fevereiro 05, 2020

a música em 1983:«African Children»

«Leitor de BD»

sobre Renda Barata e Outros Cartoons de Stuart Carvalhais n'A Batalha

terça-feira, fevereiro 04, 2020

a música em 1971: «Senhor Arcanjo»

só uma frase de George Steiner

Dos seus livros, apenas li o fulgurante No Castelo do Barba Azul, de 1971, e A Ideia de Europa (2004). Tiro do primeiro esta frase que utilizei como epígrafe num artigo de 2002, e que estou neste preciso momento a rever: «A imensa maioria das biografias humanas são uma transição baça entre o espasmo familiar e o esquecimento.»

segunda-feira, fevereiro 03, 2020

estampa CCCLXXXIX - Claude Monet


Estrada para a Quinta de São Simeão


sábado, fevereiro 01, 2020