quarta-feira, junho 30, 2010

No Bicentenário de Herculano

Não é a comemoração nacional do Bicentenário de Alexandre Herculano que se impunha, mas a Associação Portuguesa de Escritores (onde estão a Academia Portuguesa da História e a Academia das Ciências?) assumiu as suas responsabilidades e pegou no testemunho, com um programa muito aliciante: Património, Historiografia, Mutualismo, Maçonaria, Literatura e Cidadania. António Borges Coelho, Diogo Freitas do Amaral, Eduardo Lourenço, Guilherme de Oliveira Martins e Vítor Melícias são alguns dos oradores. Antes assim.

acordes diurnos

tenho essa impressão

Talvez ganhemos qualquer coisa no futebol, quando deixarmos de dar nomes idiotas à Selecção. Navegadores, não era?

terça-feira, junho 29, 2010

caracteres móveis

No puede ver el mar la solitaria e melancólica Castilla. Está muy lejos el mar de estas campiñas llanas, rasas, yermas, polvorientes; de estos barrancales pedregosos; de estos terrazgos rojizos, en que los aluviones torrenciales han abierto hondas mellas; de estas quiebras aceradas y abruptas de las montañas; de estos mansos alcores y terreros, desde onde se divisa un caminito que va en zigzags hasta un riachuelo. Las auras marinas no llegan hasta estos poblados pardos, de casuchas deleznables, que tienen un bosquecito de chopos junto al ejido. Desde la ventanita de este sobrado, en lo alto de la casa, no se ve la extención azul y vagorosa: se columbra allá en una colina una ermita con los cipreses rígidos, negros, a los lados, que destacan sobre el cielo límpido. Azorín
Castilla

passeatas de blogger

O Nobel da Economia, norte-americano, Joseph Stiglitz, citado no Público; Uma colecção; Quem tem medo de Guimarães Rosa?; Gerentes de Bancos e Mercados de Ações.

segunda-feira, junho 28, 2010

oh!, os quadradinhos

Na minha infância o Conde Drácula chamava-se / Mandrake. (Fernando Grade)

domingo, junho 27, 2010

passeatas de blogger

caderninho

Vamos buscar alimento aos antigos e aos grandes modernos, roubamos-lhes o mais que podemos para rechear as nossas obras; e quando por fim somos autores, e que julgamos poder caminhar sós, erguemo-nos contra eles, maltratamo-los, tais como aquelas crianças vigorosas e fortes graças ao leite que beberam, , por fim batem na sua ama que os amamentou. La Bruyère
Os Caracteres (tradução de João de Barros)

sábado, junho 26, 2010

quem diz voltaire, diz marx

Depois de terem jurado por Voltaire, regressam ao espiritualismo, ao misticismo, à última moda dos salões. -- Émile Zola (Paris)

sexta-feira, junho 25, 2010

quinta-feira, junho 24, 2010

Antologia Improvável #438 - Antero de Quental (2)

VERSOS

ESCRITOS NUM EXEMPLAR DAS «FLORES DO MAL»

As flores que nossa alma descuidada
Colhe na mocidade com mão casta,
São belas, sim: basta aspirá-las, basta
Uma vez, fica a gente enfeitiçada.

Nascem num prado ou riba sossegada,
Sob um céu puro e luz serena e vasta;
Têm fragrância subtil, mas nunca exausta,
Falam d'Amor e Bem à alma enlevada...

Mas as flores nascidas sobre o asfalto
Dessas ruas, no pó e entre o bulício,
Sem ar, sem luz, sem um sorrir do alto,

Que têm elas, que assim nos endoidecem?
Têm o que mais as almas apetecem...
Têm o aroma irritante e acre do Vício!


Primaveras Românticas

O Vale do Riff - Eagles, «One Of These Nights»

acordes diurnos

terça-feira, junho 22, 2010

caderninho

Quando num discurso se encontram palavras repetidas, e, tentando corrigi-las, as achamos tão apropriadas que, retirando-as, estragaríamos o discurso, devemos deixá-las. Isso constitui a sua autenticidade. E encontra-se aí parte da inveja, que é cega e que não sabe que esta repetição não é um erro neste lugar. Porque não há nenhuma regra geral. Blaise Pascal
Pensamentos (tradução de Américo de Carvalho)

O Vale do Riff - Eric Bibb, «I Heard The Angels Singing»

acordes diurnos

segunda-feira, junho 21, 2010

caracteres móveis

Uma enorme timidez afastava-me de toda a gente. Temia que lessem nos meus olhos; temia que através das minhas palavras descobrissem quem eu era. Fèlix Cucurull
«Agora, adeus» (tradução de Manuel de Seabra)

O Vale do Riff - John Lee Hooker, «Hobo Blues»

domingo, junho 20, 2010

Antologia Improvável #437 - Rui Lage (2)

TRABALHOS DOMÉSTICOS

O rouquejar da lâmpada,
a mosca que insiste
calando a noite que espera
nos grilos que o perigo passe.

A levíssima, afrutada brisa
dos tinturados cabelos das macieiras
arrojada ao chão sob o peso da vassoura.
O azul que aparece por sobre a serra
e estanca no açude das telhas,
o amanhecer
atraves do anoitecer.

Sujo de luz o vidro pede afagos de mãe.

Um coelho enxuto, magro,
aflito de vida a repartir
por doze irmãos.

Berçário

sexta-feira, junho 18, 2010

acordes diurnos

Saramago, uma visão romântica

A sensação que tenho, com a morte de José Saramago, é que ele (e também Agustina) foi o último dos grandes -- não no sentido da qualidade literária, porque, felizmente, enquanto houver Literatura haverá sempre quem faça uso das palavras para acrescentar mundos ao mundo; mas no da aproximação simbólica ao escritor demiurgo, maitre à penser ou não, alguém doutro patamar, transportando consigo a aura dos que sentem mais fundo e mais longe. Os viventes estão demasiado contaminados pela mesquinhez do quotidiano -- algo a que ele se subtraiu desde que Levantado do Chão surgiu como um romance fora-de-série, e que, com Memorial do Convento, fecha o neo-realismo com chave de ouro. Não tenho dúvidas de que o futuro registará José Saramago como hoje assinala outros grandes romancistas e prosadores do século XX: um Raul Brandão, um Aquilino Ribeiro, um Ferreira de Castro, um José Régio, um Vitorino Nemésio e, quem sabe?, um Alves Redol, um Manuel da Fonseca, um Vergílio Ferreira, um Jorge de Sena, e outros que nem sequer me passam pela cabeça.

O Vale do Riff - Duke Ellington, feat. Johnny Hodges, «Black Butterfly»

passeatas de blogger

quinta-feira, junho 17, 2010

caderninho

Vê se és capaz de interiorizares a certeza de que depois da tua morte não há mais nada, ou só o nada existe. Que é que depois podes extrair do significado para tudo o que te preocupou enquanto vivo? E se não consegues abstrair da existência dos que ficam ou hão-de vir, vê se és capaz de imaginar a espécie humana extinta. E os biliões das eras de silêncio que se seguem. Porque só então saberás o incrível da tua ficção. Vergílio Ferreira
Pensar (edição de Helder Godinho)

esta é a razão

Esther Mucznick, que gosto sempre de ler no Público, mesmo quando, por vezes, não concordo com ela, pergunta-se, hoje, porque razão existe uma sanha contra Israel, «o único Estado do mundo ao qual nada se perdoa.»
É evidente que existe um duplo critério, quando se aborda o conflito israelo-árabe. Por cá, uns patetas alucinados continuam a destilar o seu anti-judaísmo patológico -- em Portugal!, o país com o sangue mais impuro da Europa, nação cheia de judeus, berberes, negros que desde o século XV se miscigenaram com os indígenas locais, mais um punhado de celtas, ao Norte...
À esquerda, esquerda festiva, estúpida e inconsciente, gemina-se com Gaza... Tenho, também, lido em sítios na net, alegadamente marxistas (ou marxizantes), tiradas anti-semitas duma indignidade atroz.
Mas há uma coisa que Esther Mucznick tem de perceber: não há a mínima paciência ou tolerância por parte de alguns amigos e admiradores de Israel -- entre os quais modestamente me incluo --, quando o governo do país é liderado por um troca-tintas como Netanyahu, acolitado por um indivíduo pouco recomendável chamado Avigdor Lieberman, uma espécie de Le Pen do Médio Oriente (e, repetindo-me, como se deixou Ehud Barak enredar nesta armadilha de pacifismo suspeito?...).
Foram escolhidos pelo eleitorado, dir-se-á. Pois foram, mas isso não desculpa o eleitorado. Têm, até, menos desculpa do que os votantes que em Gaza elegeram o Hamas. Convenhamos: uma coisa é ser-se cidadão duma sociedade aberta, como Israel; outra coisa é ser-se um mero peão e carne para canhão dos territórios palestinianos.

Resumindo: em face dos Liebermans e do Netanyahus, creio que não vale muito a pena evocar o passado, a Inquisição, os pogroms e os fornos crematórios. Não são apenas os palestinianos (ou os árabes em geral) que têm de assumir as suas responsabilidades. Os israelitas, também -- e enquanto é tempo.

O Vale do Riff - Billie Holiday, «What A Little Moonlight Can Do»

acordes diurnos

um blogger passeia-se pela floresta da posta

quarta-feira, junho 16, 2010

figuras de estilo

Creio que nunca me senti tão frágil, tão transitório, tão de passagem, como nesse momento em que vi a eternidade nas órbitas vazias da Esfinge. Manuel Alegre
O Homem do País Azul

O Vale do Riff - Elvin Bishop, «I'm Gone»

acordes diurnos

Presto-te uma homenagem, apesar de tudo. E espero que descanses, onde quer que te encontres.

terça-feira, junho 15, 2010

boas maneiras

Big Bill Broonzy

Antologia Improvável #436 - Luís de Camões (3)

Busque Amor novas artes, novo engenho,
para matar-me, e novas esquivanças;
que não pode tirar-me as esperanças,
que mal me tirará o que eu não tenho.

Olhai de que esperanças me mantenho!
Vede que perigosas seguranças!
Que não temo contrastes nem mudanças,
andando em bravo mar, perdido o lenho.

Mas, conquanto não pode haver desgosto
onde esperança falta, lá me esconde
Amor um mal, que mata e não se vê.

Que dias há que n'alma me tem posto
um não sei quê, que nasce não sei onde,
vem não sei como, e dói não sei porquê.

Poesia Lírica
(edição de Isabel Pascoal)

acordes diurnos

O Vale do Riff - David Bowie, «Drive-in Saturday»

segunda-feira, junho 14, 2010

de la escritura / sólo el apocalipsis / nos acompaña
Mario Benedetti

O Vale do Riff - Durutti Column, «Jacqueline»

sábado, junho 12, 2010

caracteres móveis

Que significa essa irritação, quando julgamos que nos roubam uma frase, ou um pensamento, ou uma imagem que tínhamos por nossa -- quando nos plagiam? Roubados? Pois acaso é nossa, uma vez que a damos a público? Miguel de Unamuno
Do Sentimento Trágico da Vida (tradução de Cruz Malpique)

quinta-feira, junho 10, 2010

Antologia Improvável #435 - Américo Durão (3)

A EDUARDO DE ALMEIDA.

Lembro. Emudeço.

..........por entre os cílios longos,
asas negras, inquietas, palpitando,
um dilúvio de lágrimas se esconde.

Entre nós o silêncio abafa e esmaga.

Digo, para o quebrar:
-- Só o futuro, só o sonho existe...

E a tua voz que eu amo tanto
e em certas horas me faz mal, repete:
-- Fala-me do passado... O teu passado...

Vinda de longe a minha voz tornou:

-- Sombra de sombras,
não vale a pena falar dele...

A tua voz velada e branca insiste:

-- Mas o presente é meu, somos nós dois...

E eu respondo a tremer:

-- É já também passado,
apenas tu murmuras: O presente...

Tômbola

O Vale do Riff - The Enid, «Judgement»

terça-feira, junho 08, 2010

caderninho

Como o nosso pensamento se ocupa tão pouco do que atinge outras pessoas! Por exemplo o destino de um grande cantor que ainda em verdes anos perde a voz é de uma crueldade inconcebível. Ele possuía o que o elevava acima de todos e ao mesmo tempo a todos o tornava agradável. Perde-o de um só golpe e o que resta é um invólucro vazio, que vai talvez deambular pela Terra ainda trinta ou quarenta anos. Hugo von Hofmannsthal
Livro dos Amigos (tradução de José A. Palma Caetano)

O Vale do Riff - Benny Goodman, «Let's Dance» / «Don't Be That Way»

segunda-feira, junho 07, 2010

caracteres móveis

A arte francesa de ser galanteador não tem interesse algum para mim. O ímpeto selvagem tem. Philip Roth
O Animal Moribundo (tradução de Fernanda Pinto Rodrigues)

O Vale do Riff - Joe Carroll, «Hit That Jive Jack»

sábado, junho 05, 2010

acordes nocturnos

Antologia Improvável #434 - Lourdes Borges de Castro (5)

TARDES DA MINHA INFÂNCIA

Ó tardes da minha infância,
Tardes feitas de verdade,
Tardes que desconheciam
Os ventos da tempestade...
Ó tardes puras e frescas
Como a água da nascente,
Tardes que ficam na história
Da vida de toda a gente
Como as mais belas e sãs;
Tardes de calma e bonança
Que durante toda a vida
Não nos saem da lembrança...
Ó tardes da minha infância,
Tardes que perdi para sempre,
Que nunca mais voltarão...
Tardes em que eu baloiçava
Feliz, leda e descuidada,
No meu baloiço de rosas...

Hoje o baloiço é de espinhos...
E quem nele se balança
É um pobre coração...

Eterna no Tempo

acordes diurnos

sexta-feira, junho 04, 2010

Restituição da Nacionalidade Portuguesa aos Judeus Sefarditas Portugueses

Baruch Lopes de Leão Laguna
Alguns judeus portugueses, sem a nacionalidade respectiva, descendentes daqueles que foram violentados pela Inquisição e escorraçados pelo corte, gostariam -- vejam bem, gostariam... -- de reaver a condição portugueses, a que têm direito. Nunca lhe agradeceremos o suficiente a generosidade. Eu já assinei a petição. Aqui. (Lido aqui.)
Na imagem, Lopes de Laguna, sefardita português, morto em Auschwitz. Ler aqui.

Rosa Coutinho, como ele deve ser lembrado

A facção do MFA a que pertencia foi derrotada, e ainda bem. Mas não me esqueço que, para além de ter integrado a Junta de Salvação Nacional -- uma glória, portanto -- foi abertamente a favor do MPLA, e não dos sobas Holden Roberto e Jonas Savimbi, que por cá, alguns ressentidos & outros que me recuso a qualificar, quiseram alcandorar em gente repeitavel. (Sim, o MPLA cometeu muito crimes políticos, mas cabe aos angolanos ajustar contas com o seu passado, e não nós, que nem os pides conseguimos julgar.) Ler um magnifico post aqui.

O Vale do Riff - Rocker-T, «Rastafari Send I Come»

oh!, os quadradinhos


O Popeye / é da Opus Dei. (Paulo Abrunhosa)

quinta-feira, junho 03, 2010

caderninho

Se estivesses a caminhar numa planície, se tivesses a boa vontade de caminhar e, contudo, estivesses a recuar, então seria uma coisa desesperante; mas como estás a trepar uma encosta íngreme, tão íngreme como tu próprio és, visto cá debaixo, podem os recuos ser originados tão-somente pela características do terreno e não deves desesperar. Franz Kafka

«Aforismos» (tradução de Álvaro Gonçalves)

O Vale do Riff - The Who, «Heat Wave»

acordes nocturnos

quarta-feira, junho 02, 2010

porque sim

Catherine Zeta-Jones

O Vale do Riff - Lonnie Plaxico Group, «Melange»

entre razão e paixão

«passámos de um mundo onde as clivagens eram principalmente ideológicas e onde o debate era incessante, para um mundo onde as clivagens são principalmente identitárias» Amin Maalouf, Um Mundo sem Regras ,p. 23.
Não concordo totalmente: por baixo da capa do combate ideológico, estava, principalmente a partir de Stalin, o velho designio imperial; os Estados Unidos oscilavam entre a doutrina de Monroe e as solicitações da sua condição de potência marítima. A clivagem a que se refere Maalouf era, porém, um facto.
Mas eis que emerge, nos ultimos trinta anos, o maior desafio de todos: as religiões ao serviço dos ressentidos, a irracionalidade pura, o preconceito pré-moderno.
A fronteira passou a estar entre os que defendem os direitos humanos (todos os direitos), sem a hipocrisia que caracterizou o mundo ocidental no século XX (e aqui incluo tambem a extinta URSS); e os que estão acantonados no particularismo, no relativismo cultural, na cega paixão de seita.
De um lado, liberdade e razão; do outro, submissão e paixão.

terça-feira, junho 01, 2010

Antologia Improvável #433 - João de Barros (8)

TRISTE

Soubesses tu, ó meu Amor, que a Vida
Não é senão a febre do momento,
Estrela de alva que, no firmamento,
Logo se apaga apenas é nascida...

Soubesses tu que uma ilusão perdida
Não traz só desespero ou sofrimento,
Mas o remorso, a dor de pensamento
Que sente, agonizando, um suicida...

E talvez, e talvez menos severa
Visses no coração que se exaspera
E te magoa, à força de te amar,

Um coração tristíssimo e cansado
De ter sonhado, e desejado e amado
Tudo o que Vida nunca lhe quis dar...



Humilde Plenitude
(João de Barros retratado por Columbano)

O Vale do Riff - Ella Fitzgerald, «Satin Doll»

Llanfairpwllgwygyllgogerychwyrndrobwllllantysiliogogoch

brincar com o fogo

Se foi uma armadilha, Israel caiu nela que nem um pato, conseguindo a proeza de alienar um aliado estratégico na região. O que me faz impressão é ver Ehud Barak, político experiente e militar experimentado, envolvido nesta mixórdia. Além disso, como escreve Jorge Almeida Fernandes no Público, se Erdogan arriscou, calculou mal. É brincar com o fogo em frente a um paiol.