sexta-feira, janeiro 29, 2021

um dia histórico

 A aprovação da legalização da eutanásia pelo Parlamento é mais um passo na libertação das pessoas das parvoíces religiosas que a beatice procura a todo o custo preservar. 

Percebo que por razões éticas e filosóficas (e até religiosas, que é uma possibilidade que a liberdade individual dá) se seja contra, desde que aplicada a si mesmo. Que se queira impingir as crenças próprias aos demais é dum descaramento e falta de noção para os quais não pode haver contemplações.

Postura diferente tem o PCP, que receia que a miséria humana a vários níveis comece a despachar os velhos doentes por dispensáveis. Percebo mas obviamente discordo. Não há autoridade moral e política e muito menos conjuntura social que tenha legitimidade para coarctar a liberdade das pessoas.

6 comentários:

Jaime Santos disse...

Devo dizer que concordo com a aprovação da eutanásia, mas não concordo com os termos que utiliza para classificar aqueles que dela discordam.

A posição de quem é religioso mistura sempre a desaprovação pela 'desobediência radical à Providência' de quem tem a coragem de decidir que vai morrer (o que é ilegítimo porque coarcta a liberdade dos outros), com o receio de uma espécie de espiral descendente em que aqueles que são dispensáveis se sentem obrigados a partir, que é também a posição do PCP, ou de uma trivialização do acto.

Os contornos assumidos pelas leis da eutanásia noutros Países levam-me a pensar que esse risco existe, só que também calho de achar que a Lei será a cada momento só o que a sociedade achar que ela deve ser.

Um exemplo é a atual lei do aborto, que longe de ter ocasionado um explodir das interrupções voluntárias da gravidez legais, levou, conjugada com outras medidas, a uma diminuição global do número de abortos praticados (os ilegais de acordo com estimativas, claro).

Existe um longo caminho até que quem é religioso compreenda que uma sociedade pluralista não pode orientar as suas leis pelos preconceitos que essas visões do mundo implicam (o termo preconceito não tem aqui intenção pejorativa).

É uma das razões porque continuo a votar à Esquerda. A nossa Direita cheira demasiado a água benta. É agradável ver um Partido de Direita, a IL, que é socialmente liberal, muito embora não poderia estar mais em desacordo com a agenda económica que propõe...

R. disse...

Eu não duvido de que na Igreja exista quem tenha posição análoga à do PCP, a juntar à outra, ambas aliás contestáveis. Defender que a liberdade de terceiros é coarctada por um indivíduo decidir que não quer apodrecer em vida no meio de um sofrimento e de uma degradação sem nome, mais do que sofisma, é dum cinismo que só reclama invectivas.

Jaime Santos disse...

Alguém disse que não é possível morrer com dignidade, porque a morte é sempre indigna.

O que pode deixar de ser possível é viver com dignidade. E aí, batatas para quem quem impor limitações à liberdade de cada um de poder encarar essa última indignidade que é a morte.

A questão nem sequer envolve a eventual violação dos direitos de terceiros, como no caso do aborto (para quem acredita que o feto tem direitos de personalidade). Sou eu e apenas eu que decido penetrar gentilmente nessa noite escura...

R. disse...

Exactamente.
E quanto ao aborto, acho-o justificável em caso de violação e perigo para a mãe. Já no caso de malformação do feto, tenho dificuldade em aceitar, embora ache que nenhuma mãe ou pai deva ser obrigado a prosseguir com a gravidez. Se tivesse de tomar essa decisão, provavelmente fá-lo-ia, embora os problemas de consciência fossem inevitáveis.

Jaime Santos disse...

Concordo, mas como sou homem, não acredito que tenha qualquer moral para impor a uma mulher o que deve ou não deve fazer com o seu corpo. Poderia tentar convencê-la a não abortar, poderia, se fosse o pai da criança, suplicar-lhe que não o fizesse, mas considero que a decisão deve ser dela e só dela.

Bem entendido, os chamados 'late term abortions' só são aceitáveis quando a mulher corre um sério risco de vida. No geral, penso que as diferentes leis que existem na Europa são adequadas.

Quanto à eutanásia, 'it's nobody else's business'...

R. disse...

Caro, numa relação talvez não seja assim tão simples; mas claro a última palavra deve ser sempre da mulher.