segunda-feira, setembro 16, 2024

tempo de novela - José Régio

«Tapando-lhe a estação, havia outro comboio na primeira linha. Mas as carruagens ficavam tão altas que Rosa Maria desistiu de subir, assim carregada, e atravessar para o outro lado. Pôs-se a andar ao longo das carruagens. Soprava, a espaços, um vento seco e álgido, violento, contra o qual baixava a cabeça de lado, avançando a custo.» José Régio, Davam Grandes Passeios aos Domingos (1941)

1 comentário:

Manuel M Pinto disse...

«Léa, perante estas respostas duma lealdade tão insensata, soltava a sua interminável e contendente cegarrega de queixumes; desleixava-a o meco e, se queria varrer da memória a lembrança da idade de ouro, quando os homens rondavam em torno de seus agrados como chacais famintos, forçoso lhe era soltar o pé-de-meia na ervanária da esquina que, a par das especiarias largava morfina às toleradas. E posto que o seu instinto de avareza fosse mais afiado que as unhas dum abutre, sobrada razão lhe reconhecia Rirette perante as migalhas minguantes, acumuladas para erguer num rincão da província o sonhado palacete duma velhice honrosa. Léa era, naquele marasmo de vida, o "orgue de Barbarie" gemendo, chorando a eterna moliana dum imperdoável fado.»
Aquilino Ribeiro, "Filhas de Babilónia" ("Maga"). Novela (1920)