«Aquelas outras meias de seda, cinzentas, fascinavam-na. Levantou as saias e calçou-as. Olhou-se na água do riacho. Tirou-as com um suspiro. Se tivesse, como aquela porca, um idiota que lhe desse meias destas? / Procurou relembrar a sua vida. As memórias metiam sempre água e sabão.» Miguel Barbosa, «A dança», Retalhos da Vida (1955)
«Nesse ano, o Inverno chegou cedo. Duas semanas de nevão cobriram a serra de branco e queimaram o pastio. E foi então que começou a tragédia dos pastor velho e cansado, pai de um filho doido e dono de sete ovelhas famintas. / Dias e noites a fio baliram os animais com fome. Dias e noites, sem dormir, escutou Melo Bichão o triste balir das ovelhas.» Mário Braga, «Balada», Serranos (1949)
«Mestre Romão rege a festa! Quem não conhecia Mestre Romão, com o seu ar circunspecto, olhos no chão, riso triste, e passo demorado? Tudo isso desaparecia à frente da orquestra; então a vida derramava-se por todo o corpo e todos os gestos do mestre; o olhar acendia-se, o riso iluminava-se: era outro. Não que a missa fosse dele; este, por exemplo, que ele rege agora no Carmo é de José Maurício; mas ele rege-a com o mesmo amor que empregaria, se a missa fosse sua.» Machado de Assis, «Cantiga de esponsais» Histórias sem Data (1884)
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«… Vencida, mas não derrotada, a Alemanha quando puder voltará a desembainhar a espada, no que, de resto, não faz mais que obedecer à estúpida condição humana. A guerra não é a mãe de todas as coisas, como pretendia Heráclito, mas do que ela é mãe com toda a certeza é da guerra, e não é nem será outra a sua genealogia desde o começo ao fim dos tempos. Pouco há-de viver quem não vir o Reno e o Vístula arrastar enxurradas de cadáveres.»
Aquilino Ribeiro, «ALEMANHA ENSANGUENTADA». 1935. Caderno dum viajante. "DA GUERRA PARA A PAZ": Alemanha, 1920.
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