A LUZ QUENTE DOS GIRASSÓIS
A Vincent Van Gogh
É esta atenção demasiada
sobre as coisas
que me faz crescer em ti
descomprometidamente
como a luz quente dos girassóis.
Mesmo que seja inverno
é sempre assim:
aflora-me o calor por entre os dedos
e as imagens regressam ao lume
que nunca mais acaba.
1 comentário:
«Afoitamente metemos ao sol que corava as camoesas e exauria as fontes. Ao longo das paredes, a fita de sombra era de carvão retinto, e nos planos doirados manchas escarlates de calmaria voavam e evolavam-se. Os segadores comiam à sombra dos rolheiros num espanejamento efusivo de estopas brancas; na natureza sentia-se a chieira rechinante do fogo; acima dese zumbido, difuso, uma vibração quase molecular, a poupa erguia nos carvalhais um cantar rouco de trombone, "hupe! hupe!" cálido como apelo azougado de febre. A burra entorpecia cada vez mais, porque muito a castigava o sol e é da índole destes brutinhos engalhar as pernas com ilusória traça.
Azémola de moleiro, "com mais ronha que o amo" para avançar havia de escolher o piso, ladeando os desníveis do terreno, e porfiando a todo o transe na verdade matemática de que mais segura que a recta é a linha curva.»
Aquilino Ribeiro, "A Via Sinuosa" (1918)
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