2:
em 1973 ponho de parte alguns
álibis a começar pelo da fealdade própria
que mais me serve e tu soubeste
sempre para fingir libertino
tento aprender um jogo
afinal simples: desnudar-me e logo depois um outro:
revestir-me em quatro segundos ao cronómetro
pensava eu na minha que se deve à amada
tudo inclusive o espectáculo íntimo
entretanto falhamos porque estas coisas batem
no plexo solar viciam o salto
vamos dar com os cornos tristemente
no sítio onde a piscina é mais baixa
a sopa, adiante, escalda; e rias-te
Memórias do Contencioso (1976)
1 comentário:
«Meu bom mestre tinha vindo dizer missa a S. Francisco no altar da Senhora da Saúde, servindo eu de acólito naquele ofício indumentado de roxo, muito suave e sonoro na nave adormecida. Minha mãe, depois, forçara-o a petiscar do nosso almoço, a que davam mimo umas trutas pescadas ao pardelho por meu pai numa rincolheira do rio. E, entre duas garfadas, sua galanteria de ânimo aprouve-se em reviver Fabricius, aquele bom alemão que compôs uma "Teologia da Água", para celebrar a generosidade, a sabedoria e a potência de Deus, criando tal elemento.
-- Honra seja feita ao douto professor de Hamburgo -- disse meu mestre -- que o Senhor é digno de todos os incensos por tão subida mercê. Sem a água, não teríamos nós agora o paladar regalado por estes saborosos salmonídeos, de hábitos elegantes e casaca pintalgada como os marqueses do senhor D. João V.
E seu gosto, ao mesmo tempo que rendia graças ao Criador, epicuristicamente baixava uma benção sobre os delicados peixinhos.»
Aquilino Ribeiro, "A Via Sinuosa" (1918)
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