terça-feira, outubro 20, 2009

A Igreja tá chateada

Normalmente discordo do Saramago. Interessa-me tanto saber o que ele pensa da Bíblia, como da situação no Afeganistão ou as cantigas d'amigo. Alguma coisa.

Gosto do seu racionalismo milita nte. «Não ataco deus, porque nele não existe, mas sim as religiões» -- li ontem no jornal. É assim mesmo. Desde que o fundamentalismo islâmico lançou as garras de fora, temos vindo paulatinamente a assistir a um recrudescimento do sectarismo cristão.
Vi agora, no Telejornal, o estimável Pe. Carreira das Neves a perguntar-se: «mas porque é que o Saramago se pôs agora a chatear (sic) toda a gente?!!...» Ah ah ah! É preciso ter lata. A Igreja anda há séculos a chatear toda a gente. Às vezes até mandava as pessoas para a fogueira...

É evidente que as várias igrejas desempenham um papel social muito relevante, desde logo na assistência aos mais pobres. Mas não o fazem desinteressadamente; há sempre um desígnio missionário. E com a missionação e a conversão, lá vem o condicionamento, a lavagem ao cérebro, as restrições à liberdade individual. Tudo depende do poder que tenham e da correlação de forças.

Bora lá chatear a Igreja mais um bocado. Até porque deus não existe e, portanto, andam há séculos a arengar, a arengar e a chatear toda a gente...

8 comentários:

Ana Paula Sena disse...

Olá, RAA :)

Discordo da forma radical como as declarações de José Saramago foram feitas, mas é bom não esquecer que tem todo o direito de as proferir. E a liberdade!

Por outro lado, não me parece nada assim tão importante, nem preocupante. É uma posição perfeitamente respeitável, a do ateísmo.
Em contrapartida, toda esta questão é deveras interessante, do ponto de vista filosófico. Essa vertente já me parece muito mais importante. Por exemplo, admitir que existem verdades da fé, tal como existem verdades da razão. Um tema que, mal ou bem, Saramago tem o mérito de renovar.

Votos de continuação de uma boa semana!

JdB disse...

Olho para o José Saramago e, de uma forma pouco cristã, nada lhe encontro com que não embirre: a presunção de ser uma mente iluminada no meio de cegos; a pesporrência no debitar de frases supostamente sábias; o ódio visceral e caricato com que se atira à Igreja e a Deus. Não será este o lugar para se discutirem as qualidades e os defeitos da Igreja Católica nem a existência de Deus mas, se queremos falar de passado, poderemos falar também do de Saramago.
Confesso, honestamente, que nenhum país, por mais pobre intelectualmente que seja, merece este azedume, esta necessidade de protagonismo, estes ataques ridículos de uma infantilidade quase senil. Talvez seja por isso, também, que me vou apegando menos ao Nobel da Literatura. Os critérios do Comité, sabe...
Parabéns pelo blogue e boa continuação como se costuma dizer.

A disse...

RAA,
Já sabe o que penso sobre as declarações de Saramago...:))
Não li o artigo que refere mas depois da conferência de imprensa com tiradas "às três pancadas" conviria que o Nobel fosse menos ligeiro, menos generalista e mais incisivo. Se calhar, centrar a discussão nos humanos que interpretam O Livro...
Quanto a livros queimados, outros também o fizeram.Uma pulhice!
No campo religioso, parece-me que os Judeus terão sido aqueles que mais os valorizaram. Sou agnóstica mas reconheço que há na vida dos judeus um respeito extraordinário por eles. O livro (de todas as categorias) é objecto prescrito nos códigos da prática judaica. Claro que depois também têm pequenos exageros: não podem ser deformados; não devem ser deixados abertos; e não devem ser deixados cair no chão (se vissem os meus...). Ainda assim,gosto deste respeito.
Abraço.

Teresa Santos disse...

Sabes RAA?
Na minha perspectiva as afirmações do homem valem o que valem: nada. Só que, se queremos e lutamos pela liberdade de expressão, Saramago está no seu direito de se exprimir relativamente àquilo que bem entende.
O que confrange é o ar de superioridade com que Saramago se quer justificar dizendo não compreender a nossa "não compreensão"; o que confrange é ver a Igreja "aos gritos", o Papa a dizer de sua justiça.
Será que não há nada mais importante para debater? E à custa de toda esta "conversinha" o homem vai vendendo mais uns livritos.
Desculpa RAA, mas gostaria de colocar uma pergunta inocente à Ana Paula. Achas que o homem renova alguma coisa?! Como dizia alguém: "ai Amiga!.."
Haja paciência!
Beijinho para ambos.

Ricardo António Alves disse...

Obrigado Fátima: e que coisa será essa?...

A questão, Ana Paula, é que foram declarações proferidas por um escritor, a propósito do seu último livro, num certame literário. Era o que faltava que um escritor não pudesse dizer o que pensasse, sobre o seu último livro, num certame literário -- ou fora dele. Todos os dias somos confrontados com palavras e opiniões de inúmeras pessoas com as quais estamos em profundo desacordo. E depois?...
Também para si :|

Caro JB. Em primeiro lugar quero saudá-lo especialmente, pois sei que é um crente. E eu, não partilhando a fé, respeito as pessoas sinceramente crentes. Há por cá uns milhares.
Também acjo que não é aqui o lugar, desde logo por que me falta competência para debater a respeito de algo que me é de todo estranho (apesar da minha origem e educação católicas). Eu também não gosto dos dedinhos em riste, venham de onde vierem. Quanto ao passado do Saramago, ele está aí para falar dele. Concordo com a palavra azedume, não sabendo quais as razões que o possam justificar, se é que as há. Pode ser que o Saramago ache intolerável a própria ideia de religião, não sei. Eu, pessoalmente, preferiria um mundo livre delas... Discordo de si quando fala de necessidade de protagonismo: o Saramago será o único escritor em Portugal, que não tem necessidade de protagonismo. Tem uma obra vasta e é Prémio Nobel, que diabo (a propósito: também não acredito neste :)...) Há coisas do Saramago de que gosto e muito -- o «Levantado do Chão» o «Memorial», o «Ricardo Reis», o «Elefante», outros de que não gosto (a «Jangada»), outro que quero ler furiosamente (a «Cegueira», o «Cerco») outros que provavelmente nunca lerei («Caverna», «Intermitências»), outros que provavelmente virão ao meu encontro (o «Evangelho», a «Lucidez», e este «Caim»). Há uma coisa que não me suscita dúvida: o Saramago está no cânone português; se irá mais além, não me atrevo a vaticinar...)
Um abraço.

Olá Aust. Será o Saramago ligeiro, ou é a imprensa, ávida de sangue e de "casos", que filtra e amplifica o que é mais picante? Se há coisa que o Saramago não me parece ser é "ligeiro". Quanto aos judeus, são o meu povo eleito :)

Olá Teresa. Essa do vender os livros está a ser demasiado usada para o desqualificar. Mas,se pensarmos bem, é ridículo. Aliás, nesse campo,a Igreja está a fazer um marketing estupendo...
Um abraço.

A disse...

RAA,
Venho corrigir uma afirmação minha. Li a sua resposta e fui ver o que tinha escrito (estas janelinhas dos comentários não ajudam). De facto não me queria referir a Saramago. Não o conheço, li obra e meia dele... Queria referir-me exclusivamente às declarações dele sobre a Bíblia. Essas são, para mim, muito redutoras e, nesse sentido ligeiras.
Abraço.

Ruela disse...

Concordo com o que está escrito, penso o mesmo...


Abraço.

Ricardo António Alves disse...

Aust: como escrevi no comentário ao seu post, estou convencido que o Saramago, concederá alguma unilateralidade a essa posição sobre a Bíblia. Só que, rapidamente, a questão deixou de ser essa para passar a tratar-se de algo muito mais grave: o ataque por parte duma instituição (a Igreja) a um indivíduo que tem o direito (e já agora o dever) de exprimir as suas opiniões, por mais controversas (ou, até, ligeiras...:|)
Abraço também.

Viva Ruela.
Às armas!)
Outro abraço