quinta-feira, junho 29, 2023

quarta-feira, junho 28, 2023

Portugal, uma jigajoga na guerra da Ucrânia (ucranianas CXCVI)

 

Quando se diz que uns certos falcões acreditam que uma guerra nuclear na Europa pode ser travada, sem que tal os atinja, estes criaturos do lado, senadores republicano e democrata, já anunciaram que se a Rússia lançar uma arma nuclear em território ucraniano, entrará em guerra com a Nato, ou seja, connosco, sem nos perguntarem nada, como (não) seria de esperar. Tirando os ingleses, o resto é paisagem (aposto que os alemães não foram informados da sabotagem aos Nord Stream).

Independentemente do que estes dois imbecis digam, e do valimento e peso que possam ter em Washington, o que assusta mesmo é a falta de confiança que merece a cúpula política, europeia, e muito em particular, portuguesa, a começar pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, que é um zero à esquerda, e a culminar no Supremo Magistrado da Nação, que saca da cartola números como o da outorga do penduricalho da liberdade ao homólogo ucraniano.

Repito-me: nunca poderemos ignorar que somos vizinhos atlânticos dos Estados Unidos e que  fazemos parte da Nato (da qual, chego agora à conclusão, deveríamos sair); ou seja, membros ou não da Nato, teremos de ter sempre relações amistosas (e já agora, construtivas) com a maior potência mundial do momento. Não ignorando o seu poder e a ausência dele da nossa parte, devemos ser inteligentes e astutos o suficiente para fugirmos à actual condição meros vassalos, como diz o Putin a respeito dos países europeus -- e diz muito bem.

Quanto à União Europeia, gerida por incapazes, somos uns meros papagaios que para lá andamos. A nossas postura pública -- que também aqui deve ser sempre construtiva -- é miserável. Não nos sabemos dar ao respeito, o respeito que exige um estado de novecentos anos, um dos construtores do mundo em que vivemos, país do Infante D. Henrique, de Bartolomeu Dias, Afonso de Albuquerque, Luís de Camões e António Vieira -- coisas que não interessam para nada, diria um neocon neoliberal. O país de Jaime Cortesão mereceria bastante mais respeito do que esta jigajoga.

Quanto à CPLP, divergimos do seu membro mais importante, e creio que também da maioria. O que distingue Portugal dos outros países europeus dá pelo nome de Brasil, mas também Angola, Moçambique, Cabo Verde, etc., em relação aos quais, especialmente os referidos, nos devemos esforçar para não estar em barricadas opostas. É algo que deve ser permanentemente alimentado, em vez de servir para tiradas fanfarronas para dignitários estrangeiros, o alardear das nossas relações especiais com África e América Latina. São tão especiais que eles muitas vezes não nos ligam nenhuma, e é bem feito.

150 portugueses: #11. Afonso III, o Bolonhês (Coimbra?, 1210 - Alcobaça (?), 1279)

Para um futuro blogue. Irmão de D. Sancho II, chega ao reino vindo de Bolonha, feudo de que era conde, pelo casamento com Matilde II. É aliciado a entrar em Portugal num período em que o irmão está em sério conflito com a Igreja e parte da nobreza, preparando-se a sua deposição pelo Papa, e com quem entra em guerra. Usa o título de Visitador, Defensor e Curador do reino, tendo subido ao trono com o afastamento e exílio de Sancho II.  Apesar da maçadora traição ao irmão, ganhou estatuto de bom rei e administrador. Registe-se também que nas Cortes de Coimbra de 1245, o povo está representado pela primeira vez. Quanto à consolidação do território, é no seu reinado que o Algarve é totalmente reconquistado pelos cristãos, delineando-se a fronteira sudeste com Castela, traçada no Guadiana.


terça-feira, junho 27, 2023

segunda-feira, junho 26, 2023

mercenários (ucranianas CXCV)

Há mercenários desde que existe poder instituído. Na história da Europa, talvez os mais notórios tenham sido os temíveis mercenários suíços, de cuja Guarda, no Vaticano, é uma reminiscência folclórica das Guerras de Itália do século XV.

Nada de novo relativamente ao que se assiste na guerra da Ucrânia, entre os Estados Unidos e a Rússia: a escória sem dignidade ao serviço do poder, de todos os lados. Porque ser-se selectivo, também neste caso, é ser-se tão escória como os demais.

simulacros & outros caracteres móveis

«Nestas curvas das estradas sorri sempre de longe ao viajante. cansado e aborrecido, que pela primeira vez as trilha, uma prometedora esperança.» Júlio DinisA Morgadinha dos Canaviais (1868)

«Mas para o meu Jacinto, desde que assim me arrancavam da Cidade, eu era arbusto desarreigado que não reviverá. A mágoa com que me acompanhou ao comboio, conviria excelentemente ao meu funeral. E quando fechou sobre mim a portinhola, gravemente, supremamente, como se cerra uma grade de sepultura, eu quase solucei -- com saudades minhas.» Eça de QueirósA Cidade e as Serras (póst., 1901)

«A vila é um simulacro. Melhor: a vida é um simulacro.» Raul Brandão, Húmus (1917)

«-- Eu tinha pensado... É que está aí um seringueiro -- o Balbino, aquele que anda sempre com um charuto na boca -- que foi ao Ceará buscar pessoal para o rio Madeira. Mas, ontem, fugiram-lhe três homens... Ora, eu pensei... Sim, talvez falando com ele, tu pudesses...» Ferreira de Castro, A Selva (1930)

«Ele rebolou os olhos num semblante de agonia, bateu furiosamente umas quantas vezes com o cajado contra os bancos do apeadeiro, e ao ver como aumentava o meu medo rebolou-se de gozo pelo chão.» J. Rentes de CarvalhoA Amante Holandesa (2003)

Louis Armstrong c/ Velma Middleton, «Loveless Love»

sábado, junho 24, 2023

um estado normal não pode estar à mercê de um qualquer condotiero

 Resta saber duas coisas (sem saber das últimas notícias): 

1. O grau de normalidade da Rússia enquanto federação (o projecto de Putin)

2. Quanto custou Prighozin aos americanos & co.

Em tempo: durante o dia, a tese de golpe de teatro tem sido aflorada. Continuamos a saber pouco. 

sexta-feira, junho 23, 2023

quinta-feira, junho 22, 2023

a arte de começar

 «Brilha o céu, tarda a noite, o tempo é lerdo, a vida baça. Debaixo de sombras irisadas, leio e releio os meus livros, passeio, rememoro, devaneio, pasmo, bocejo, dormito, deixo-me envelhecer. Não consigo comprazer-me desta mediocridade dourada, pese o convite e o consolo do poeta que a acolheu. Também a mim, como ao Orador, amarga o ócio, quando o negócio foi proibido. Os dias arrastam-se, Marco Aurélio viveu, Cómodo impera, passei o que passei, peno longe, como ser feliz?» Mário de Carvalho, Um Deus Passeando pela Brisa da Tarde (1994)

Nina Simone, «Don't Smoke in Bed»

quarta-feira, junho 21, 2023

não é preciso chamar nazi ao Zelensky, porque ele não precisa (ucranianas CXCIV)

O nazismo foi a perfeita encarnação do Mal na História contemporânea, em maior grau ainda, pela sua selectividade espúria, do que a escravatura praticada em larga escala com destino às plantações das Américas (o ser humano tratado como mercadoria), os genocídios índio e arménio (atavismo territorial primitivo, no fundo à Gengis Khan), para não falar doutro departamento, o terror estalinista, todo um outro departamento. A depravação moral de Hitler e sicários (um sicariato que se estendeu, infelizmente, a milhares de alemães e povos vizinhos), que o fascista Mussolini quase passa por moderado e o chefe Salazar quase por democrata. O nazismo é único no Ocidente contemporâneo e não vale a pena equipará-lo com qualquer outro sistema de poder.

É por isso que me parece contraproducente o PCP enveredar por essa retórica de Putin (de quem aliás o partido tanto se preocupa em dissociar-se). E não é o único: lembremos Pedro Doares, na recente convenção nacional do Bloco de Esquerda, chamando neonazi ao Zelensky. No entanto, foi neste caso uma hiperbolização salutar, pois, mesmo para quem não é nem gosta do BE, como é o meu caso, causava vergonha e embaraço vê-lo alinhado com a nato ou com o Chega.

Dito isto, também não se pode escamotear a presença, o poder e a influência da extrema-direita neofascista e porventura neonazi em todo o processo que conduziu à guerra que decorre entre os Estados Unidos e a Rússia na Ucrânia.

A CIA, aliás, e beneméritas agremiações americanas congéneres às ordens do Pentágono e do complexo militar-industrial norte-americano (não, obviamente, do taralhouco do Joe Biden), gostam muito de recrutar e branquear este género de delinquentes. Veja-se o caso Navalny: independentemente de tresandar a homem-de-mão, foi membro do partido do Jirinóvsky que deus tem. Ou seja: o rebotalho, o lumpen político e social que a implosão da União Soviétiva excretou.

Voltando ao Zelensky: na mais benigna das hipóteses, foi um líder que hipotecou o próprio país ao ser incapaz de estabelecer um status quo com os russos do Donbass. Não é o único culpado? Não será; mas sujeitou-se a servir os interesses de uma potência global interessada em neutralizar a Rússia. Se perder a guerra, como parece irá perdê-la, ninguém lhe perdoará; se a ganhar, admitamos a hipótese académica, o custo será de tal modo elevado, que alguém irá perguntar-lhe se não teria sido preferível ter-se batido por uma solução que teria por base os Acordos de Minsk. É que -- e nisto o PCP tem toda a razão -- a guerra não começou no ano passado, como dizem para aí os intrujões -- cujo mentor é, recorde-se, Boris Johnson (um Nobel da Paz para ele) --, com a invasão da Rússia pela Ucrânia.     

caderninho

 Pela escrita levamos /A vida que temos

Liberto Cruz, Livro de Registos / Última Colheita (2022)

(o grande) Edward Snowden, 40 anos -- no exílio desde 2013



 

terça-feira, junho 20, 2023

quadrinhos


 

totalitarismo católico

 Poderia facilmente ironizar com estes adoradores de absurdos, coisa a que, de resto, estão habituados, desde que há pouco mais de duzentos anos foram proibidos de esturricar a carne dos "hereges", dos "infiéis" e dos ateus.

Poderia, mas não o faço, pois acho de tal modo indigno, a propósito da lei da eutanásia, quererem obrigar ao sofrimento todos quantos não são apanhados pela estúpidas religiões, que não tenho espaço para graçolas.

Imagino a revolta e o asco de quantos sofrem de doenças irreversíveis, arrastando-se com dores, sem autonomia nem a dignidade que sempre se exigiram, impedidos de terminar com a sua vida, porque uns alucinados acreditam que a vida é um dom de "Deus", absurdo em que uma minoria utilitária, sem filosofia nem metafísica, se refugia por não querer encarar a morte (o nada) de frente, enquadrando uma massa primitiva de penitentes, supersticiosos, exaltados ou meramente acomodatícios. Porque para além da manada, há a beatice dos papa-hóstias & associados. Muitos deles, estou certo, aldrabões, que se for preciso vão lá fora tratar do assunto, como antes as mui católicas mulheres que, por todas as razões, queriam abortar, iam ao estrangeiro fazê-lo, se para isso tivessem posses. (As pobres, já se sabe...) Tudo isto é nojento. Merecem o mínimo de respeito estes fariseus e estes fanáticos? Não merecem nenhum.

segunda-feira, junho 19, 2023

Miles Davis, «Jeru»

Francisco de Holanda

Auto-Retrato
Pintor do outro mundo, além de humanista, arquitecto e escritor, Francisco de Holanda morreu em Lisboa no dia 19 de Junho de 1585.

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domingo, junho 18, 2023

150 portugueses: #10. Sancho II, o Capelo (Coimbra, 1209 - Toledo, 1248)

Para um futuro blogue. Primeiro monarca a ser deposto, é uma figura interessantíssima pelo percurso politicamente trágico. Filho de Afonso II e Urraca de Castela. é ainda menor quando ocorre a morte do pai. Sobe ao trono aos catorze anos, herdando o conflito com as tias, depois resolvido em favor destas. O confronto  passará a dar-se com os ricos-homens e com os poderes eclesiásticos, os bispos do Porto, Braga e Lisboa. O aliciamento do irmão mais novo, Afonso, conde de Bolonha, com o apoio da Igreja e boa parte da nobreza, impele este à conquista do trono. Morrerá no exílio, após a retirada do seu maior apoiante, o rei de Castela e, tal como seu pai, também excomungado. O casamento com Mécia Lopez de Haro, viúva de um nobre galego e de uma princesa bastarda, Urraca Afonso, filha de Afonso IX de Leão e da Galiza, serviu às intrigas palacianas. O reino continuou a expansão para sul, Alentejo e Algarve, com a conquista de várias cidades, entre as quais Beja.

António Feliciano de Castilho

Último poeta da primeira geração romântica, alvo de Antero de Quental e outros na "Questão Coimbrã", enquanto bonzo de poetastros, António Feliciano de Castilho morre em Lisboa, aos 75 anos (1875).

«Concerto Fantástico» (Albéniz) - Manuel Galduf, E. Pérez de Gúsman,

sábado, junho 17, 2023

Metsola, a parvinha (ucranianas CXCIII)

 Não risca nada, não interessa para nada, não passa duma vassala. Ter ido à Assembleia da República ainda é o menos, sendo presidente do PE; mas ao Conselho de Estado, que embaraço...

Parvinha, porque sugeriu à líder parlamentar do PC ir à Ucrânia falar aos deputados, como se não soubesse que, lá, o PC está proibido, entre outros partidos de esquerda. Claro que sabe, está-se nas tintas, diz o que lhe apetece, desde que agrade.

É ou não parvinha? É pois, e provocadora.

Sonny Rollins, «You don't know what love is»

os derrotados da História

Pensar que em 1974 o país estava num conflito militar com três frentes, perpetrando crimes de guerra em nome de uma mentirola consubstanciada no slogan “Portugal uno e indivisível, do Minho a Timor”, só não faz sorrir porque muitas foram as vidas destruídas, portuguesas e africanas, em nome dessa balela. No entanto, o tratamento dado aos ex-combatentes, que em nome deste rudimento ideológico serviram de carne canhão, foi outra indignidade, aliás muito portuguesa: varremos o que é incómodo para debaixo do tapete .

[Abre-se propositadamente um parênteses sobre o debate em curso, a propósito da falsa questão dos Descobrimentos: estes estão confinados aos séculos XIV e XVI; misturá-los com o imperialismo do Euromundo é um anacronismo grosseiro e uma mistura de conceitos. O século XV não é o século XIX.]

Mas há mais: africanos que pegaram em armas contra os movimentos de libertação – e já estamos a entrar no livro de hoje –, tiveram, muitos deles, um triste fim: Spínola, quando chega à Guiné, em 1968, muda de táctica, envolvendo as populações e criando forças africanas para combater o PAIGC, enquadradas pelas Forças Armadas – o velho ‘dividir para reinar’. Já era tarde, porém, tanto eticamente como do ponto de vista estratégico e político, para os obstinados do Império, que aguardava apenas uma rajada mais forte dos ventos da História para se escaqueirar.

BD que só sirva para dela falar, não interessa, perdoe-se o lugar-comum. Filhos do Rato, de Luís Zhang (Lisboa, 1986) e Fábio Veras (Lisboa, 1997), é um óptimo exemplo do bom momento por que passa a BD portuguesa. Belo texto (apesar de alguns anacronismos evitáveis…) para um dos dramas mais pesados da nossa história recente. A acção decorre na Guiné em dois momentos – Inverno de 1975, com um extenso flashback para um período que antecede a independência, Verão de 1973 – e conta-nos da amizade travada no mato por dois homens: Camões, um militar negro, e Joaquim, soldado duma aldeia perdida em Trás-os-Montes, amizade que vai subsistir ainda para além da morte. A certa altura da narrativa, uma ratazana é vista a comer mantimentos no barracão do acampamento; atingida em cheio por uma lata de conserva, foge e deixa no local embriões de ratos que serão esmagados, com nojo. Uma metáfora para esses anos da guerra na Guiné: sabemos quem são os filhos do rato; e também o que representa a ratazana. Para bom entendedor – é melhor confirmar pela leitura…

A opção da coexistência da cor e do preto e branco na mesma prancha é muito interessante; e o desenho de Fábio Veras, por vezes expressionista, passa ao papel, com o nervo intenso e necessário, os momentos desesperantes do tédio de uma longa inacção na espera do inimigo ou da ocorrência da emboscada, com a mata a ferro e fogo.

Sim, a BD é uma coisa séria.


Filhos do Rato

Texto. Luís Zhang

Desenhos: Fábio Veras

Edição: ComicHeart e G. Floy Studio, 2019

Setembro de 2019








quinta-feira, junho 15, 2023

Louis Armstrong, «Yellow Dog Blues»

o lulu de turno da nato diz que o exército ucraniano está a avançar (como se alguém lhe tivesse perguntado alguma coisa), mas também ouvi que metade dos tanques Leopard já foram para o galheiro (ucranianas CXCII)

Repetindo-me: nós, cidadãos europeus, também somos carne para canhão me(r)diática, como todos com dois dedos de testa já terão percebido, excepto as barbies e os kens das breaking news

Agora que se está a ver o embuste noticioso que foi a chamada contra-ofensiva ucraniana, correndo esta o risco, se deus quiser, de levar no focinho até Kiev, já andam por aí lunáticos a vaticinar que o próximo pedido do Zelensky seja soldadinhos -- cumprindo, de resto, o plano dos americanos.

Estou para ver as piruetas ou as aldrabices dos dirigentes políticos europeus, a começar pelos da parvónia doméstica. Claro: se os ucranianos podem morrer ao serviço dos interesses norte-americanos (eles estão a lutar e a morrer por nós, não é?...), os polacos também podem (aliás, já lá estão) e até os portugueses, certo?

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terça-feira, junho 13, 2023

Santo António

Candido Portinari
Morre em Pádua, a 13 de Junho 1231, Santo António, sermonista franciscano e Doutor da Igreja.

ser como um rio & outros caracteres móveis

«A princípio, esse novo cenário, todo fofo e confortável, perturbava-o; em breve, porém, Soriano se adaptara, que nem por mudar de leito os rios deixam de correr.» Ferreira de Castro, A Curva da Estrada (1950) - «Como ela o fitasse apenas, sorridente e sem lhe falar, achou mais cómodo sentir-se ali o hóspede venerável, e tomar aquele silêncio ainda como uma cortesia.» Agustina Bessa Luís, A Sibila (1954) - «Embora de teimoso castanho, abalados por entalões de carretos, chicoteados e entranhados por chuvas de invernos e invernos, os batentes do portão, lassos da corrosão das cunhas cinco dos seis chumbadouros, havia muito que não jogavam nos gonzos.» Tomaz de Figueiredo, A Toca do Lobo (1947)

segunda-feira, junho 12, 2023

João de Barros,

sobre o novo livro do poeta brasileiro Ribeiro Couto, a 12 de Junho de 1952, no Diário de Lisboa: «Os poemas de Entre Mar e Rio como que transcendem e superam a expressão poética -- são a própria e nua Poesia». 

Adeus ao Brasil (póstumo, s.d.)

domingo, junho 11, 2023

a caricatura de António Costa nas manifestações: não é racismo, é bandalheira vinda da pocilga

 

Eu até estou de acordo com as reivindicações dos professores, e com a crítica tanto a Costa como ao inenarrável ministro da Educação -- um fulano que quando foi secretário de Estado se notabilizou por perseguir os dois alunos de Famalicão, e cuja atitude lhe deveria ter merecido a demissão imediata. 

Diz-se que a caricatura miserável da manifestação junto às comemorações do 10 de Junho é racista, a começar pelo próprio Costa, que disso se queixou. Não me parece. Os atributos étnicos são susceptíveis de ser caricaturados, mal de nós se assim não fosse. O que já me parece achincalhante e repelente é o nariz de porco. Se o ministro da Educação tivesse orelhas de burro (apesar dos bravos animais), estaria justificado, seria claro. O nariz de porco no primeiro-ministro é um insulto soez e badalhoco, que atinge quem a ele recorre.

A caricatura em causa, que parece uma dejecção do Chega, confrange qualquer democrata, em especial qualquer cidadão de esquerda. Em nome de quê se caricatura um homem com nariz de porco? 

P.S. - Parece que o STOP se demarcou, não sei...

O STOP demarcou-se; o autor pertence aum sindicato da Fenprof, a primeira organização a demarcar-se. É justo que o assinale. (17-VI-2023)

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João de Barros

«O Brasil, de um lado, Portugal, Açores e Angola do outro -- tal como vi indicado num imenso mapa da sala principal da delegação portuguesa à Conferência da Paz de Paris, em 1919 -- comandam, dominam todos os caminhos do Atlântico Sul, realidade patente que seria imperdoável não aproveitar.»  João de Barros, Diário de Lisboa, 11 de Junho de 1949.  
Adeus ao Brasil (póstumo, s.d.)

sábado, junho 10, 2023

Nina Simone, «Mood Indigo»

Liberto Cruz

Álvaro Neto (pseudónimo de Liberto Cruz), no capítulo próprio da sua Gramática Histórica (1971), apresenta o exemplo de um "Requerimento para Exame de Admissão à Morte" -- 10 de Junho de 1968 -- ainda o Dr. Salazar não caíra da cadeira, na banheira, ou lá onde foi.

por falar em mercenários, o Rasmussen & outras barbaridade (ucranianas CXCI)

 Não sei quem lhe anda a pagar melhor: se o Zelensky, de quem é conselheiro, se o Duda, que não sei se representa os sectores polacos que querem abocanhar o antigo território polaco, do qual a principal cidade é Lviv/Lvov, no oeste da Ucrânia, essa república inventada pelos sovietes, e que os americanos e respectivos serventuários europeus gostariam de controlar. Gostariam, pois, o Rasmussen, quer a Polónia e outros países da Nato -- mas não a Nato, claro -- entrassem em guerra contra os russos. Com jeitinho, a ideia brilhante ainda chegará a este lado da Europa.

Este arranjo mercenário do Rasmussen faz-me tremer quase tanto como hilaridades que tenho ouvido a um certo comentariado. Hoje, alguém vindo do refugo e cujo nome não fixei, tanto se lamentava pelo recrudescer da guerra e ausência de soluções de paz, como por outro lado, fazia de bonifrate, dizendo que os ucranianos estão a combater por nós e a morrer por nós... Arre, que é estúpido! Se de facto estivessem a morrer por nós, como veicula a propaganda do Pentágono, teríamos mesmo que pegar em armas, e não esperar que os outros se sacrifiquem em nosso lugar. A questão é que, como digo desde o início, os ucranianos estão a morrer pelos interesses do complexo militar-industrial americano. Tudo o resto é conversa para inocentes.

Ainda no comentariado, alguém acuda à Prof.ª Soller, que ontem mostrou não saber que se a Polónia, por seu alvedrio, entrar em guerra com os russos, o artigo 5.º da Carta do Atlântico nunca poderá ser invocado -- em lisura jurídica, claro. Deve ter sido do cansaço de tanto comentário a desoras, há mais de um ano.

Do cansaço ao cansativo: o Ventura, que não tem vergonha nenhuma, esteve com o Salvini, ao que parece apoiante do Putin. Não gabo o Putin por isso... No entanto, se um boneco como o Ventura fosse para levar a sério, e não um vulgar oportunista, teria de, se não apoiar, pelo menos demonstrar alguma simpatia pelo Putin. Mas como não passa de um aldrabão que, segundo o povo, "diz as verdades" (povo esse que tão enrabado vai ser), deixemos em paz o Prof. Ventura, que neste particular alinha com o Bloco de Esquerda, a IL, PS e PSD. (Só para esclarecer os que acham que sou do PCP: a minha posição não é a da "paz" dita assim, mas de apoio à Rússia, independentemente dos pormenores.)

sexta-feira, junho 09, 2023

a arte de começar

«A taberna do Pescada ficava mesmo em frente ao cemitério dos Prazeres, e era frequentada pela gente do sítio, especialmente de noite, à hora em que os cabouqueiros e os britadores abandonam os seus trabalhos e entram na cidade, em ruído.» Fialho de Almeida, A Ruiva (1878)

Duarte Galvão

9 de Junho de 1517:  Duarte Galvão, autor da  Chronica do Muito Alto e Muito Esclarecido Príncipe D. Afonso Henriques, Primeiro Rey de Portugal, morre na Ilha do Camarão, ao largo do Iémen, no Mar Vermelho (n. Évora, 1446). 

quarta-feira, junho 07, 2023

a arte de começar

 «Agora, a noite começa cedo, demasiado cedo, na minha vida diferente. Tempos houve em que a chegada da noite representava a maior alegria. Com o aproximar da noite sentia-me renascer. Como se a claridade anterior tivesse fenecido e não existisse um fio do tempo que a tudo e todos ligasse: homens, mulheres, o resto da natureza, coisas e deuses. Quando se aproximava a noite, preparava-me para renascer. Quase me atreveria a dizer que não era apenas renascer. Era muito mais do que renascimento: era nascimento. Era nascer outra vez... pela primeira vez. Creio que a força que em tempos me defendeu dos acontecimentos da vida -- a força que me defendeu da fraqueza das pessoas e do seu carácter, a força que me redobrava a fé em cada vinte e quatro horas -- foi a de poder voltar a sair do ventre materno, ungido com toda a fé e toda a esperança de quem, inesperadamente chegado, sente que tem direito a tudo o que for possível e a tudo o que for imaginável.» Mário Máximo, O Heterónimo de Camões (2016)

Alexandre O'Neill

7 de Junho de 1975. Alexandre O'Neill publica «Solteirice» no diário A Capital: «Espeta-te com o garfo. / Corta-te com a faca. / Deita-te no prato. / Espera.» 

Coração Acordeão (edição de Vasco Rosa)

terça-feira, junho 06, 2023

Sonny Rollins, «St. Thomas»

150 portugueses: #9. SANTO ANTÓNIO (Lisboa, 1190/1195 - Pádua, 1231)

Santo António, por Giotto
Para um próximo blogue. Nascido, de acordo com a tradição, a 15 de Agosto, por volta de 1195, Fernando de Bulhões, de forte temperamento místico, entra como noviço crúzio (Ordem da Santa Cruz, de regra de Santo Agostinho), em São Vicente de Fora, transferindo-se depois para Santa Cruz de Coimbra, onde certamente bebeu e consolidou a erudição que viria a demonstrar como erudito sermonista, Por Santa Cruz veria passar uns quanto franciscanos em missão evangelizadora em Marrocos, terra de infiéis, vendo-os igualmente regressar em estado de cadáver, quando os islamitas não mostraram particular interesse pela causa. É então que deixa a ordem de Santo Agostinho e abraça a ordem de S. Francisco de Assis, com quem está em Itália. Da sua valia teologal se serviu a Igreja para combater as heresias do tempo, tendo ainda leccionado em universidades europeias, como Bolonha. Pio XII proclama-o Doutor da Igreja em 1946. Após a morte de São Francisco, Santo António arrasta multidões, que lhe atribuem milagres, o que explica o culto popular de que é alvo, muito próximo da superstição. Detém o record absoluto de canonização em toda a história da Igreja, a 30 de Maio de 1232, menos de um ano após a sua morte, a 13 de Junho. Na entrada que lhe corresponde no Dicionário de História de Portugal, Francisco Fernandes Lopes refere-se-lhe como «a primeira figura portuguesa na história da cultura».

Fernando Pessoa

6 de Junho de 1930. Fernando Pessoa escreve a Adolfo Rocha (Miguel Torga) a propósito de Rampa: «A sua sensibilidade é de tipo igual à do José Régio -- é confundida, em si mesma, com a inteligência.» 

Andrée Rocha, A Epistolografia em Portugal

Marwan Barghouti, 64 anos -- na prisão desde 2002



 

segunda-feira, junho 05, 2023

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começou a ofensiva... (ucranianas CXC)

 Escrevo sem rede, correndo o risco de os factos me desmentirem em pouco tempo; mas a minha sensação é a de que a contraofensiva ucraniana vai falhar, e clamorosamente, sem que haja propaganda merdiática que o possa ocultar. Veremos. Se for como penso e desejo, também me vou rir muito da piadola do Blinken, tão engraçado ele é, até parece o Serafim Saudade do comentário, o indígena no ecrã da sic, que eu, obviamente, nunca vejo. 

E depois? O que farão ou dirão estes basbaques que governam a Europa Ocidental em nome do interesse americano? A resposta é simples: vão desconversar; o putedo dos merdia continuará a palrar ataques a hospitais e deportação de crianças; a Ucrânia será um resto de Ucrânia (e muita sorte terá se mantiver acesso ao Mar Negro). Aliás, eu bem gostaria que a Rússia tomasse Odessa,  aquilo não é para os dentes dos pulhas dos americanos.     

Cláudio Manuel da Costa

 

5 de Junho de 1729. Cláudio Manuel da Costa, poeta árcade e da Inconfidência Mineira, nasce em Vila Real de Nossa Senhora, Minas Gerais.

um rapaz e o seu cocker

Criados em 1959, pelo belga Jean Roba (1930-2006), Boule e Bill, um rapazinho de sete anos e o seu cocker spaniel, são das personagens mais populares da BD francófona. As camadas de ternura aplicadas por Roba em cada vinheta, recriando um universo idílico numa família de classe média, com pais disponíveis, mesmo quando têm de impor regras, à criança (os tpc) e ao animal (o banho…), conjugadas com um humor por vezes desenfreado, foram ingredientes seguros desse êxito. Para Roba, o mundo já era suficientemente agreste para que os seus gags não permitissem essa distensão de humor sobre um tempo em que a vida é um recreio permanente, mesmo com vacinas e banhos obrigatórios…

As personagens inspiraram-se no filho do autor e no cão da casa, o que explica a quase beatítude que a leitura destas pequenas histórias proporciona, na procura duma inocência que só existiu no tempo em que os animais falavam. Numa entrevista a Hugues Dayez (Le Duel Tintin-Spirou, 1997), Roba afirmou: «acredito que o homem, num passado longínquo, pôde falar com os animais, e que esse privilégio foi-lhe subtraído. É isso uma maldição? Creio que sim.» Por vezes, encontram-se pontos de contacto com o Calvin de Bill Watterson. Bill não fala, mas pensa, e em pensamento dirige-se a nós, leitores.

A dupla continua, pelas mãos do francês Verron (Grenoble, 1962). Os álbuns de Boule e Bill estão inéditos em Portugal.


60 Gags de Boule et Bill

texto e desenhos: Roba

edição: Dupuis, Marcinelle, 1962

(Setembro de 2019)

domingo, junho 04, 2023

José Régio

4 de Junho de 1927. José Régio na presença: «Em Arte, a crítica só serve para ajudar um Artista a descobrir-se -- e a possuir-se até contra a crítica.»

sábado, junho 03, 2023

Louis Armstrong, com Velma Middleton: «Saint Louis Blues»

Raul Proença

 

3 de Junho de 1907. Raul Proença, no Semanário Alcobacence: «Um indivíduo que critica rancorosamente é uma besta.» 

Raul Proença, Polémicas

(edição de Daniel Pires)

sexta-feira, junho 02, 2023

«Zinizjumegh»

o perigosíssimo Zelensky, enquanto Biden catrapum (ucranianas CLXXXIX)

Não preciso chamar neo-nazi a este serventuário dos americanos, não obstante a região estar infestada. Basta ler o que diz (azulito meu):

“Precisamos de paz, é por isso que todos os países europeus que fazem fronteira com a Rússia e que não querem que a Rússia os invada, devem ser membros de pleno direito da UE e da NATO e só há duas alternativas: ou uma guerra aberta ou uma ocupação russa progressiva”. 

Palhaço, cinquenta vezes palhaço, que comecei por respeitar até ver como a guerra lhe é indiferente, desde que defenda os interesses dos americanos à custa do sangue dos ucranianos; não se importando nada de nos arrastar a todos para uma guerra, porque suas incelências querem a Crimeia (é preciso descaramento!) e querem território que sempre foi russo, mesmo naquela ficção política chamada União Soviética; um canalha monumental, eleito presidente porque disse ir resolver o diferendo com Moscovo -- e está-se a ver. Não preciso, também, de falar dos russos da Crimeia e do Donbass, o outro lado, que o Ocidente velhacamente omite. No entanto, podem esperar sentados: a Ucrânia já era, podem agradecê-lo aos zelenskys e aos bidens, este entretanto catrapum, à espera de dar lugar ao Trump, que diz conseguir resolver o assunto em 24 horas (e se calhar pode mesmo, basta-lhe dois telefonemas iniciais).  Um mundo cheio de americanices, bendito Putin, apesar de tudo.

João Arroio

2 de Junho de 1911. João Arroio, compositor e poeta, agradece a hospitalidade de Miguel de Unamuno em Salamanca: 
«Daí trouxe óptimas impressões, entre as quais avulta, é claro,  o conhecimento pessoal de V. Ex.ª e do seu belo espírito.»

Epistolario Portugués de Unamuno
edição: Ángel Marcos de Dios, 1978

«Wild Wild Ways»

quinta-feira, junho 01, 2023

Camilo Castelo Branco

1 de Junho de 1890. Camilo Castelo Branco suicida-se  em casa, São Miguel de Seide (Vila Nova de Famalicão), com um tiro de revólver.  

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