O major-general Isidro Morais Pereira, comentador da guerra, apresentado como ex-representante de Portugal na Nato, não tem, neste particular, deixado os seus créditos por mãos alheias. No outro dia, compungido com a destruição provocada pela guerra, disse que os russos levam a cabo uma "guerra stalinista" na Ucrânia, pelo volume de destruição infligido. Dando de barato ao major-general a bestialidade da guerra, e recordando que as malfeitorias infligidas pelo Zé Estaline aos alemães na II Guerra foram para baixo de um décimo da que foi exercida por Hitler a todos os povos da União Soviética (russos e ucranianos à cabeça), o lamento do general suscita-me duas observações: a primeira prende-se com a orografia do território, insusceptível de confronto em campo aberto, em especial quando a desproporção de meios é grande, sendo, portanto, nas cidades e ao seu redor que as refregas acontecem; em segundo lugar, esqueceu-se de que a defesa ucraniana colocou o arsenal bélico dentro, em cima e em torno dos edifícios, ocasionando aquelas imagens de civis usados como escudos humanos, que a insuspeita Amnistia Internacional denunciou, para raiva dos propagandistas do "Ocidente alargado" -- uma maneira de os comentadeiros se referirem aos Estados Unidos sem lhe dizerem o nome.
Acho também extremamente cómico este general Nato, intelectualmente propulsionado pelos nossos (deles) valores, que, como sabemos, são muito democráticos, e até liberais... Nem é preciso recordar a liberalidade com que despejaram napalm no Vietname, faz meio século; ainda há pouco levaram a democracy (os nossos, deles, valores) aos iraquianos chacinados.
Podemos chamar muitos nomes ao Putin (eu, nem por isso, até ver): que tem um nacionalismo distorcido, que é ditador ou mesmo um mauzão (esquecendo-nos que ele salvou a Rússia da debâcle e está a prevenir hoje voltar ao caos dos tempos de Ieltsin -- mas isso é outra história, certamente contestável e com sombras várias). O que não se pode dizer do Putin é que ele invadiu a Ucrânia para rapinar as riquezas do país, como os democráticos e liberais americanos fizeram no Iraque. Esses arautos do "Mundo Livre" -- criminosos de guerra -- ainda mexem e têm nome, sendo Biden, volto a lembrar, com o seu voto favorável à invasão, no mínimo cúmplice e co-responsável moral pela miséria de que foram agentes, o crime mais hediondo de que fomos testemunhas.
A Guerra da Ucrânia, perversa, como todas as guerras, não tem mais nem menos valor do que a guerra no Tigré (em África) ou no Iémen (na Ásia), que estão aí a decorrer na indiferença de todos. O resto é conversa fiada é para tolinhos.
5 comentários:
Texto muito bom e suficientemente esclarecedor para muitos. Abraços Ricardo
Obrigado, caro leitor/a...
Reparo agora que é impossível aceder ao seu blogue ("Notícias sem Censura") por aqui, ou via google. Será mais um exemplo dos nossos ricos valores em acção? Vou tentar por outro lado.
Caro Ricardo, respaldado pela amizade que nos une, e deixando-lhe um abraço sincero, permito-me lavrar um comentário irónico-negro-amargo-trágico e também actual, que assenta bem ao seu texto: em sinal de gratidão pela amigável convivência de seis meses com o exército libertador, mais de 400 se suicidaram em Izium; outras centenas o tinham já feito em Bucha e outros locais...
Agora a sério: tenho esperança que o sacrifício de tantos inocentes acabe por abrir os olhos àqueles que não querem ver e se entretêm (ainda) em análises ideológicas e de geo-estratégia.
Caro Fernando, os seus comentários são sempre bem-vindos. Sem entrar em pormenores sobre o que são aquelas 400 cruzes, e muito menos, voltando a Bucha, desvalorizei, o que lhe posso afiançar é que nem eu nem você. ou qualquer outros a não ser os que estão no terreno sabe o que é aquilo, quem lá está enterrado. Há-de vir a saber-se, se são soldados e de que exército, civis ou paramilitares. No entanto sempre lhe digo que nunca vi uma guerra sem mortos, mas também nunca vi tanta manipulação. Claro que irá responder-me que a Ucrânia foi injustificadamente atacada e todos os outros argumentos conhecidos. Ora eu posso deplorar pessoalmente que o recurso tenha sido a guerra, mas lá injustificadamente é que não foi. E creio que ao fim destes seis meses já tenha desconfiado que a guerra é entre a Rússia e os Estados Unidos, com a Ucrânia a servir de campo de batalha e os ucranianos de carne para canhão -- excepto uma classe endinheirada que eu vejo a passear-se de Mustan, Bentley, Tesla e outras espécimes topo de gama, conduzidos por mamrmanjos na casa dos trinta e quarenta que decidiram salvar o coiro, enquanto que os imigrantes aqui e noutras partes abandonavam famílias e empregos para pegar em armas para defender o país. Isto foi um aparte, mas não percebo como pode um tipo sentir-se bem a fazer surf, quando os concidadãos estão de arams na mão -- aliás nem sei como raio eeles estão aqui, com a proibição a todos os homens até sessenta anos de abandonarem a Ucrânia.
Quanto aos seus votos, acompanho-os, mas no entanto sei também que só no Paraíso eles serão cumpridos.
Abraço e mande sempre.
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