Confiar-se a alguém é Natureza: acolher aquilo que se nos confiou, tal como foi transmitido, é Cultura. GoetheMáximas e Reflexões (tradução de Afonso Teixeira da Mota)
conservador-libertário, uns dias liberal, outros reaccionário. um blogue preguiçoso desde 25 de Março de 2005
«Entrámos no século sem bússola.», incipit do último livro de Amin Maalouf. A bússola era o socialismo, sequestrado pelo marxismo-leninismo nos países da órbita soviética, e suas dissidências. Após a derrocada, e a metamorfose chinesa, resta (resta?) o pensamento único e transnacional das corporações e as santas religiões. Contra isto, só um máximo de liberdade, o debate permanente, a multiplicação dos movimentos cívicos, culturais, ecológicos, a consciência e o empenho individual.
Louis La Guigne (em português, Luís Má-Sorte), grande bd, argumento de Frank Giroud e desenhos dos malogrado Jean-Paul Dethorey. Um saboroso misto de Bernard Prince e Corto Maltese.
António José Saraiva, exilado em França, viveu o Maio de 68. Dele deixou testemunho em Maio e a Crise da Civilização Burguesa, que acabei há pouco de ler. Primeira impressão: o mesmo estofo intelectual que se vê nos seus trabalhos de história da cultura; o ex-militante comunista, tido por guardião da ortodoxia jdanovista nos tempos da Vértice, surge liberto, aspirando a grandes golfadas o ar livre da insurreição; clara atracção pelo anarquismo; crítica lucidíssima ao sovietismo.
Na Patagónia, de Bruce Chatwin, e O Papagaio de Flaubert, de Julian Barnes, dois dos primeiros títulos da Quetzal, em 1989. Comprei-os logo, seduzido pelo formato e fascinado pelas capas soberbas de Rogério Petinga. E não me arrependi. O livro de Barnes e uma digressão cheia de espírito pelo criador da Madame Bovary; o de Chatwin é talvez o mais fascinante livro de viagens que me foi dado ler. Voltei a pegar nele, vinte e um anos passados, e o encantamento ressurgiu de imediato.
José Régio -- Na disposição de espírito em que viera, não só a tinham importunado, como quase assustado as insistentes atenções do cavalheiro amável. «Vêem uma rapariga só...» -- pensava ela com a sua psicologia de pouco afeita aos caminhos de ferro e aos desembaraços da mulher moderna. Agora, não havia perigo em compensar o seu aliás respeitoso admirador com esse olhar e um sorriso. -- Davam Grandes Passeios aos Domingos 
Procura-se retiros no campo, à beira-mar, na montanha; e também tu costumas desejar estas coisas no mais alto grau. Mas tudo isso é sinal de uma grande simplicidade de espírito, porque se pode, sempre que se queira, retirar em si próprio. Em parte alguma se encontra retiro mais tranquilo, mais isento de agitação, que na própria alma, sobretudo quando ela encerra esses bens sobre os quais basta a gente debruçar-se para recobrar logo toda a liberdade de espírito [...]. Marco Aurélio
Vitorino Nemésio -- Estavam quase ao alcance da respiração um do outro: ela debruçada num muro de pedra de lava; ele na rampa de terra que bordava a estrada ali larga, acabando com a fita de quintarolas que vinha das Angústias até quase ao fim do Pasteleiro e dava ao trote dos cavalos das vitórias da Horta um bater surdo, encaixado. -- Mau Tempo no Canal (1944)


Branquinho da
Fonseca -- Posso fazer algumas economias e, durante o mês de licença que o Ministério me dá todos os anos, poderia ir ao estrangeiro. Mas não vou. Não posso. Durante esse mês quero estar quieto, parado, preciso de estar o mais parado possível. Acordar todas essas trinta manhãs no meu quarto! Ver durante trinta dias seguidos a mesma rua! Ir ao mesmo café, encontrar as mesmas pessoas!... Se soubessem como é bom!... Como dá uma calma interior e como as ideias adquirem continuidade e nitidez! -- O Barão (1940) 
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Considerando a monotonia e consequente insipidez da vida, acabaríamos por a considerar insuportavelmente entediante ao fim de um considerável período de tempo, se não fosse o contínuo progresso dos conhecimentos e do discernimento intuitivo, e a aquisição de um entendimento ainda melhor e mais claro de todas as coisas, o que, em parte, é fruto da experiência, e em parte resultante das mudanças que nós próprios sofremos no decurso das diferentes fases da vida, devido às quais os nossos pontos de vista estão, até certo ponto, a ser continuamente modificados, e as coisas nos revelam facetas que desconhecíamos. Desta forma, apesar do declínio dos nossos poderes mentais, dies diem nocet [o dia ensina o dia] continua a ser incessantemente verdade, dando à vida um fascínio sempre renovado, segundo o qual aquilo que é idêntico parece ser algo novo e diferente. Arthur Schopenhauer(caricatura de Albuquerque)
Segue-se a norma adoptada em Angola e Moçambique, que é a da ortografia decente.