sábado, julho 23, 2016

«Estado Livre de Jones»






História interessantíssima de um soldado confederado, que percebe que está a servir de carne para canhão dos grandes proprietários rurais escravocratas do Sul dos Estados Unidos, na mortífera  Guerra Civil de 1861-1865. Percebe que conceitos como o de honra se tornavam tretas bem embrulhadas, em face dos interesses da classe dominante. Percebeu uma coisa ainda mais importante, que foi a de reconhecer um seu igual em humanidade, para além da cor da pele. Há também prolepses muito bem metidas, cuja acção decorre cem anos mais tarde, no auge da luta pelos Direitos Civis dos negros americanos, envolvendo um descendente desse sulista desiludido -- brilhantemente interpretado por Matthew McConaughey --, dando uma maior profundidade ao filme, e ajudando-nos ainda a compreender melhor a situação que se vive ainda hoje, neste campo, na América.




11 comentários:

Jaime Santos disse...

Fico curioso de ver este filme, tinham-me dito que as críticas eram terríveis. Mas falta fazer a homenagem a dois negros que nasceram escravos e que chegaram a generais do exército republicano francês, Dumas (pai do escritor) e L'Ouverture, a mostrar que a revolução francesa foi bastante mais radical (no sentido literal da palavra) que a americana, que se limitou a dar a liberdade a proprietários brancos esclavagistas (aparentemente, mais negros lutaram do lado britânico do que americano)...

Ricardo António Alves disse...

Apesar de tudo, o trailer não faz justiça ao filme. Terríveis? Por que raio terríveis?...
Sabia dos dois, o segundo, creio que foi o 'libertador' do Haiti, certo?

Jaime Santos disse...

Não sei, foi 'hear-say', nem sequer me dei ao trabalho de ler as ditas críticas, o que só revela preguiça da minha parte ;-). Sim, L'Ouverture combateu primeiro do lado da República e revoltou-se depois quando Napoleão tentou reintroduzir a escravatura no Haiti (os revolucionários jacobinos decretaram o fim da escravatura em todo o império francês). Morreu em cativeiro, creio eu, em França. Gostei muito do 'Glory' do Zwick, mas faz-me alguma espécie que a esmagadora maioria destes filmes fale só de heróis brancos (o que revela a má consciência da ainda maioria na América)...

Ricardo António Alves disse...

Pois, ainda há um longo caminho a percorrer, por toda a América, de Norte a Sul...

Jaime Santos disse...

Lá e cá, Dumas ainda é o homem de cor com a patente mais alta num exército europeu. A Europa não é, acho eu, menos racista do que os EUA, provavelmente até é mais, só que o racismo manifesta-se de formas distintas dos dois lados do Atlântico, a escravatura foi abolida nos territórios dos reinos europeus muito antes de ter sido abolida na América (não nas colónias, claro), mas não esqueçamos o racismo contra judeus e contra os roma e os sinti, que levou ao genocídio nazi. Mas, nesse aspeto, e luso-tropicalismos à parte, nós fizemos o nosso caminho em Portugal e por comparação com outros países não acho que fiquemos muito mal na figura (e isto no País que provavelmente mais traficou em escravos)...

Ricardo António Alves disse...

É verdade, sempre fomos muito dados ao comércio. O luso-tropicalismo é uma bela construção do grande Gilberto Freyre, grandemente apreciada pelo Salazar na Guerra Colonial. Também tenho essa impressão, mas é mesmo só uma impressão...

Jaime Santos disse...

Note-se que quando digo que não ficamos mal na figura, faço-o sem ironia. Apesar de tudo e olhando para o nosso Governo, ou para a seleção nacional, ou para os nossos atletas olímpicos, parece-me que o País vai no bom caminho... Os únicos que se nos comparam são os franceses (a Esquerda italiana também é inclusiva), apesar de todo o seu chauvinismo. Essa coisa dos valores republicanos é mais do que simples propaganda, mesmo no País em que a FN tem quase 30% dos votos. Basta olhar para um governo como o britânico (o Labour é um bocadinho melhor) para se ver que aquilo é quase tudo branquinho...

Ricardo António Alves disse...

Eu percebi. Creio que o nosso racismo é mais classista do que étnico.
Em Inglaterra, tenho visto nos Comuns um número apreciável de deputados de várias etnias -- ao contrário do nosso parlamento, onde, residualmente, prevalece o indiano (ou meio indiano) de Goa, e não os negros nem os timorenses.
A selecção inglesa também está muito mesclada. Nós, os franceses, os ingleses e os belgas (e agora também os alemães).

Jaime Santos disse...

Sim, suspeito que a existência de círculos uninominais favorece a escolha de deputados de certas etnias em zonas em que essas etnias são maioritárias. Mas acho estranho que isso não se tenha traduzido na escolha desses deputados para o Front-Bench... Pelo menos no Labour... Seja como for, tem razão, o nosso sistema de listas fechadas não favorece a entrada de mulheres ou minorias étnicas na AR (apesar das regras paritárias relativamente às mulheres que exigem que pelo menos um terço dos deputados sejam mulheres, segundo creio) o que é mais uma boa razão para defender a reforma do dito, respeitando a proporcionalidade, claro está...

Ricardo António Alves disse...

Francamente, não sei se esse 'défice étnico' seria bem resolvido com legislação. Mas o que esperamos é que cada vez mais a etnia não seja óbice, porque dignifica que a montante as minorias continuam a ser desfavorecidas.

Jaime Santos disse...

Não defendo quotas (embora elas existam para as mulheres), mas parece-me que aproximando eleitores e eleitos, haveria necessidade de escolher candidatos com quem as pessoas se identificam, e que conhecem os seus problemas, em vez dos para-quedistas do costume. Claro, o comunitarismo encerra riscos, mas nada é ideal. Seguramente, o sistema de escolha dos deputados pelos diretórios partidários tal como existe é o pior método de todos...