Aquilino Ribeiro: «Obedeceu a moça intimidada, quedando a meio da sala, nua como a mãe a deitou ao mundo, na pudica torção de virgem, surpreendida pelos olhos dum deslavado.» Andam Faunos pelos Bosques (1926) - Ferreira de Castro: «Nos ombros, luzia manta cromática, das que se fabricam em Barroso, e de um lado e outro do bucéfalo dançavam, ao sabor da marcha, as peles compradas nesse dia.» Terra Fria (1934) - Carlos de Oliveira: «Eu, Álvaro Rodrigues Silvestre, comerciante e lavrador no Montouro, freguesia de S. Caetano, concelho de Corgos, juro por minha honra que tenho passado a vida a roubar os homens na terra e a Deus no céu, porque até quando fui mordomo da Senhora do Montouro sobrou um milho das esmolas dos festeiros que despejei nas minhas tulhas» Uma Abelha na Chuva (1953) - José Luís Peixoto: «De encontro ao céu, as oliveiras e os sobreiros hão-de parar os ramos mais finos; num momento, hão-de tornar-se pedra.» Nenhum Olhar (2000) - J. Rentes de Carvalho: «Quando cheguei ao apeadeiro o comboio não tinha ainda passado, mas não havia de estar longe, porque o seu arfar e o seu ranger ecoavam pelos montes.» A Amante Holandesa (2003)
terça-feira, maio 30, 2023
em "pudica torção de virgem" & outros caracteres móveis
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2 comentários:
Mestre Aquilino, uma vez mais!...
«O “Constellation” ribomba. As quatro hélices, tomadas de vertigem, volteiam, espadelam o ar com fúria, anaçam a atmosfera e criam o remoinho e chupão pneumático. Parecem tiritar as palmeiras anãs na orla da ilha e as paredes do aeroporto. Depois, a aeronave curveteia e lá vai, como um palmípede, correndo pela pista fora, dócil e ligeira. Obra dos duzentos, trezentos passos mais longe, estaca. Os motores trabalham debaixo de pressão, todo o arcaboiço tomado de sobressalto. O ar vibra. Não se ouve uma palavra ao vizinho ainda que buzinada em alta gama. De súbito a grande ave precipita-se, desliza, acelera, arranca do solo e num galão remontante encurva para a Tijuca. Ei-la sobrepujando o tapete verde da floresta, listrado na fímbria sul pelos cordões brancos das ruas. À desbanda entremostra-se o ovo de avestruz do Corcovado, e o avião mete para lá rumo, atabalhoadamente, dir-se-ia na pressa de salvar o Ícaro de braços abertos que doba de escantilhão pela ribanceira. Perpassa de relance pela escotilha a lomba da Gávea riscada por um segmento da estrada torcicolar. Ao pé, na Lagoa de Rodrigues de Freitas fulgura o seu lume vivo de espelho, com manchas de carmim à roda, casario e hipódromo. A orla, especiosamente esflocada de espuma, é Ipanema… um palmo à banda, Copacabana. Estupendo! Ah, porque se não submete a mecânica subtil desta ave a um esmorço graduado?!»
Aquilino Ribeiro, "Mina de Diamantes" (1958)
Não é todos os dias que aparece o Aquilino a descrever o voo dum Constellation...
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