domingo, agosto 31, 2025

zombies em Copenhaga, Ursula calamitiza a leste, Putin, na China, consolida

 Consolida, sim, filho -- China, Índia, como sempre e de costume, e mais um grande etc.

Em Copenhaga reuniram-se os ministros do estrangeiros da UE, reunião de nada, que não serviu para nada, para além de mostrar a impossível Kaja Kallas a sair daquele jazigo como um zombie desnorteado, como todos os zombies, e Rangel a falar da flotilha e de Mortágua (uma grande saudação para ela, neste particular).

No "flanco leste" da UE a inenarrável, incompetente e estúpida Ursula von der Leyen, palhaça triste que impressiona as criancinhas chamando 'predador' a Putin, é um destroço sem fim à vista enquanto não for removida do lugar, sob pena de a própria UE não lhe sobreviver, de tal forma a condução política da União que lhe foi permitida se traduziu neste beco sem saída, sem honra nem glória. 

Que União Europeia depois desta calamidade?

Cannonball Adderley, «The Uptown»

2 versos de Armando Cortes-Rodrigues

«Nada em mim é necessário, / Nem mesmo o que foi sonhado:» 

Cantares da Noite (1942)

sábado, agosto 30, 2025

zonas de confronto

Mikhail Bakunin: «Se há algo que seja alvo das atenções dos conservadores mais respingões, é-o o movimento cada [vez] mais geral e mais forte das massas operárias, não só na Europa como na América.» «O movimento internacional dos trabalhadores» (1869), O Socialismo Libertário - trad. Nuno Messias. § Svetlana Alexievich: «O que me faz lembrar primeiro a guerra? A minha tristeza de criança por entre palavras incompreensíveis e assustadoras. A guerra era sempre lembrada: na escola e em casa, nos casamentos e nos baptismos, nas festas e nos almoços fúnebres. Mesmo nas conversas entre crianças.» A Guerra não Tem Rosto de Mulher (1985) - trad. Galina Mitakhovich § Woody Allen: «Juan Gris, o cubista espanhol,  tinha convencido Alice Toklas a posar para uma natureza-morta e, na sua típica composição abstracta dos objectos, começou a partir-lhe a cara e o corpo, até atingir as formas geometricamente básicas, até que a polícia chegou e o levou.» «Memórias dos anos vinte», Getting Even / Para Acabar de Vez com a Cultura - trad. Jorge Leitão Ramos § Félix Cucurull:  «Foi então que encontrei o cartão perdido há anos; mas o pequeno rectângulo de cartolina havia passado tanto tempo ao sol e à chuva que já estava totalmente ilegível. Enquanto eu tentava, inutilmente, descortinar qualquer coisa, tu começaste a contar-me histórias de santos, e tiraste um embrulho da mochila.»  «Carta de despedida», Antologia do Conto Moderno - trad- Manuel de Seabra § Michael Gold: «Entretanto, na cela, os cinco polícias sovam e interrogam o preso e gritam-lhe que há-de falar!... / As duas matracas e os rudes sapatos martirizam o preso e induzem-no a falar. / O coração opresso sugere-lhe que fale.» «Cárcere», Para a Frente América... - trad. Manuel do Nascimento

4 versos de Bernardo de Passos

«Morre um rico, dobram sinos! / Morre um pobre, não há dobres! / Que Deus é esse dos padres / Que não faz caso dos pobres?» 

«Cantigas para os trabalhadores dos campos», Refúgio (póst., 1937)

Django Reinhardt, «September Song»

sexta-feira, agosto 29, 2025

4 versos de Mário Beirão

«Meu sangue reza nas veias; / Por que reza? por quem chora? / Pelos que em terras alheias / Foram escravos outrora!» 

«A epopeia dos malteses», O Último Lusíada (1913)

ucraniana CCCXCVI - é que vieram-me mesmo as lágrimas aos olhos ao ouvir o enlevo pela liberdade europeia da boca do ceo da Rheinmetall

A Rheinmetall, fabricante dos maravilhosos tanques Leopard, feitos em merda pelos russos enquanto o diabo esfregava um olho -- inclusive os nossos, pelo menos 30 milhões de euros atirados borda fora pelo estadista António Costa -- (a Rheinmetall), através do ceo, o senhor Pappenberger, está empenhadíssima na liberdade europeia e no provimento da Nato, cujo sabujo-mor, aliás, marcou presença. 

Eu fiquei comovidíssimo com este espírito europeísta do sr. Papageno, um dos fortes beneficiários dos anões que nos governam.

A propósito de guerra: Montenegro usou linguagem bélica na crise dos fogos -- exemplo claro do desgoverno deste país, que não consegue ter uma esquadrilha de aviões e helicópteros de combate aos incêndios (parece que é o único país da Europa do Sul em que tal se verifica). 

Quando eles vierem falar, como macaquinhos amestrados de circo, no aumento da percentagem do pib para a "defesa", atirem-lhes com a água dos alguidares do Prof. Xavier Viegas. 

Estou farto destes tontinhos.

quinta-feira, agosto 28, 2025

4 versos de Fernanda de Castro

«Meu menino, dorme, dorme, / E deixa-me cantar / Para afastar / A vida, um papão enorme...» 

«Poema da maternidade», Trinta e Nove Poemas (1941)

o que está a acontecer

«II Um desconhecido / Ora numa dessas noites frustradas tive um encontro importante. Lembro vários pormenores dessa noite (alguns inquietavam-me depois pela sua nulidade e pelo relevo com que se me gravaram) mas o contorno dela e o seu aspecto geral aparecem-me com o vago dum sonho.» José Régio, Jogo da Cabra Cega (1934)

«General na inactividade, com uma larga folha de serviços, bigodes hirtos de senhor medieval, desempenho façanhoso de quem se cobriu de medalhas nas campanhas de África, esse memorável chefe político, monárquico de temperamento e disciplina, ganhara, a troco de uma tenacidade admirável, a fama de ser temido pelos governos e de domar, sob a sua férrea mão, as mais tenazes, as mais duras vontades...» José Dias Sancho, Bezerros de Ouro (póst., 1930)

«Desaparecem, ressurgem sem razão aparente e de um dia para o outro num palmo do Universo que se lhes afigura o mundo todo. Absorvem os mesmos sais, exalam os mesmos gases, e supuram uma escorrência fosforescente, que corresponde talvez a sentimentos, a vícios ou a discussões sobre a imortalidade da alma.» Raul Brandão, Húmus (1917)

quarta-feira, agosto 27, 2025

2 versos de Miguel Torga

«Me confesso de ser charco / E luar de charco à mistura.»

«Livro de Horas», O Outro Livro de Job (1936)

terça-feira, agosto 26, 2025

zonas de conforto

«Para pensar bem é preciso estar quieto. Talvez depois também cansasse, mas a Natureza exige certa monotonia. As árvores não podem mexer-se. E os animais só por necessidade física, de alimento ou de clima, devem sair da sua região. Acerca disto tenho ideias claras e um experiência definitiva.» Branquinho da Fonseca, O Barão (1942)

«Pára o trabalho nos campos, e o homem da terra ergue-se e endireita o espinhaço. Viu-o o jornaleiro que mora diante das Portelas; viu-o e não o conheceu; nem o velho que trazia uma sacola e como pobres que se encontram no caminho se pôs a olhar para ele, sem fala, num mudo espanto.» Raul Brandão, O Pobre de Pedir (póst., 1931)

«Os vinte e tal anos ali vividos eram muito, mas não eram tudo. Certas células do corpo pediam-lhe mais.  E, passado o momento de fraqueza, o senhor Ventura, ao mesmo tempo que tinha pena de não ficar, sentia pressa de partir.» Miguel Torga, O Senhor Ventura (1943)

2 versos de Afonso Duarte

«Minha bátega fluida de pedraços, / Forte rima de versos que ideei.» 

«Estrofe», Cancioneiro das Pedras (1912)  

segunda-feira, agosto 25, 2025

o que está a acontecer

«Se eu pudesse restringia a vida a um tom neutro, a um só cheiro, o mofo, e a vila a cor de mata-borrão. Seres e coisas criam o mesmo bolor, como uma vegetação criptogâmica, nascida ao acaso num sítio húmido. Têm o seu rei, as suas paixões e um cheirinho suspeito.» Raul Brandão, Húmus (1917)

«Mas, sem sair dali, sem procurar fortuna noutras terras, jamais conseguiria realizar a ambição. As jornas eram más e o quintalejo e as courelas davam para viver, nunca para amealhar.» Ferreira de Castro, Emigrantes (1928)

«A morte do velho Drago teve o eco merecido. A imprensa do país dedicou-lhe alguns artigos, lacrimosos, e o longo rumor de mágoa, que deixou na província, é o suficiente para se avaliar do seu sólido prestígio.» José Dias Sancho, Bezerros de Ouro (póst., 1930)

2 versos de Alberto Osório de Castro

«Já nada me dizeis, vozes estremecidas / De um pobre Portugal naufragado além-mar.» 

«Velha Goa», A Cinza dos Mirtos (1906) 

ucraniana CCCXCV - charlatães

450 ataques com mísseis e drones da Rússia à Ucrânia em 24 horas, provoca um genocídio de uma trintena de feridos; em Gaza, basta ir à procura de comida para se ser abatido. 
Ou seja: estes patéticos líderes europeus são uns zeros que ninguém leva a sério; mas são também um perigo que nos arrastariam para a guerra com a Rússia se os povos europeus não lhes puserem travão. Uma guerra -- há que afirmá-lo sempre -- provocada pelos Estados Unidos, com a passividade cúmplice destes palermas.
Zelensky aparece trajado como um ucraniano étnico, mas -- judeu de língua materna russa --, é quase tão ucraniano como eu. Portanto, todo o fervor nacionalista sobre um território independente há 35 anos,  criado artificialmente pelos sovietes e sobre os despojos da II Guerra, é conversa da treta e folclore para as mentes sugestionáveis.

domingo, agosto 24, 2025

2 versos de João Lúcio

«Há dentro em vós, talvez, uma via-láctea inteira, / Porque, em sentindo dor, sai de vós uma estrela...» 

«A dor das pedras», Descendo (1901) 

zonas de conforto

«Todos eles vêem uma Sombra no Pobre maravilhoso. Aparece nas eiras e olha com cólera para os homens e para os punhados de milho secos e escassos. Receiam-no e calam-se e o Pobre cala-se, também suspenso, e segue o seu caminho... / -- Tu viste-o? / -- Vi-o! / -- Como é o probe? / -- Mete medo... / -- E que te disse?» Raul Brandão, O Pobre de Pedir (póst., 1931) 

«E todo o caminho deixou vaguear os olhos enamoradamente por aquele panorama irreal, como um árabe que fosse chamado a Meca e antes de partir quisesse beber toda a frescura e toda a água do seu oásis. Uma funda nostalgia começou a invadi-lo. E tentou reagir.» Miguel Torga, O Senhor Ventura (1943)

«Acordar todas essas trinta manhãs no meu quarto! Ver durante trinta dias seguidos a mesma rua! Ir ao mesmo café, encontrar as mesmas pessoas!... Se soubessem como é bom! Como dá uma calma interior e como as ideias adquirem continuidade e nitidez!» Branquinho da Fonseca, O Barão (1942) 

sábado, agosto 23, 2025

4 versos de Pedro Homem de Melo

«Hoje o meu sonho procura / Com saudade a poesia / Dos tempos em que eu sofria. // Que triste coisa a ventura!»

«Ironia», Caravela ao Mar (1934)

sexta-feira, agosto 22, 2025

2 versos de Júlio Dantas

«Feliz de quem tem / Saudades dum bem.» 

«Endechas», Nada (1896)

o que está a acontecer

«Todo o trabalho insano é este: reduzir a vida a uma insignificância. Tapá-la, escondê-la, esquecê-la. O sino toca a finados, já ninguém ouve o som a finados. A morte reduz-se a uma cerimónia, em que a gente se veste de luto e deixa cartões de visita.» Raul Brandão, Húmus (1917) 

«Disso dependiam todos os projectos que ele formara, desde o casamento de Deolinda, não com um valdevinos sem eira nem beira, mas com homem digno e de teres e haveres, até a velhice tranquila, numa casa grande, de telha francesa, lá em cima, nos Salgueiros -- uma casa em cuja salgadeira metesse dois porcos alentejanos.» Ferreira de Castro, Emigrantes (1928)

«Disse-me a dadivosa viúva de Vilalva que os livros estavam na adega havia mais de trinta anos, desde que o seu cunhado, que estudava para padre, morrera héctico; que o seu homem -- Deus lhe fale na alma -- mandara calcar o quarto onde o estudante acabara, e atirou para as lojas tudo o que era do defunto -- trastes, roupa e livralhada.» Camilo Castelo Branco, A Brasileira de Prazins (1882)

quinta-feira, agosto 21, 2025

«Sad Lisa» (Cat Stevens)

2 versos de Cândido Guerreiro

«Eu sei a vossa língua, água das fontes... / Podeis falar comigo, águas do mar...» 

 Sonetos (1904) 

quarta-feira, agosto 20, 2025

3 versos de Augusto Casimiro

«Esta Vida maior que em mim palpita / E luta e espera e se revolta e grita, / -- Donde vem, quem ma deu, quem na criou?» 

«Psicologia», A Vitória do Homem (1910) 

zonas de conforto

«-- ... Prima Rosa Maria, não é verdade? / -- Sim... -- balbuciou ela recuando um passo. / -- Desculpe! Magoei-a, não? Pelo menos, assustei-a. Sou um estavanado! Chego tarde e ainda por cima lhe prego um susto. Desculpe! Temos ali o meu carro. A minha mãe não pôde vir, mas veio a tia Vitória.» José Régio, Davam Grandes Passeios aos Domingos (1941)

«Posso fazer algumas economias e, durante o mês de licença que o Ministério me dá todos os anos, poderia ir ao estrangeiro. Mas não vou. Não posso. Durante esse mês preciso de estar quieto, parado, preciso de estar o mais parado possível.» Branquinho da Fonseca, O Barão (1942) 

«O lume apaga-se. Ao redor do lar, o criado, o ladrão, a figura tisnada e a mulher passiva e humilde, que mal se atreve a sentar-se à beira da pedra, com a malga nas mãos, para ocupar menos espaço na sua própria casa, confiam não sei em quem e esperam separados pelas cinzas frias... / --A terra é dos probes.» Raul Brandão, O Pobre de Pedir (póst., 1931)

terça-feira, agosto 19, 2025

3 versos de Campos de Figueiredo

«Esta roseira que se enlaça / Nos ferros da varanda / É um aviso florido à minha vida.» 

Navio na Montanha (1942)

segunda-feira, agosto 18, 2025

«It's not as big at it was» (Rick Wakeman & John Lord)

4 versos de Alfredo Guisado

«El-Rei perdeu-nos. Deixá-lo... / Nossas bocas o chamaram / E agora nos transformaram... / Alhambras de Recordá-lo!» 

«A canção das guitarras». Mais Alto (1917)

o que está a acontecer

«Silêncio. Ponho o ouvido à escuta e ouço sempre o trabalho persistente do caruncho que rói há séculoa na madeira e nas almas. // 15 de Novembro // Debaixo destes tectos, entre cada quatro paredes, cada um procura reduzir a vida a uma insignificância.» Raul Brandão, Húmus (1917)

«Mas, para lá do muro, os olhos de Manuel da Bouça já não podiam ver com alegria, os campos que se estendiam, planos, bem regados, até próximo da igreja velha. Possuí-los, ser seu dono, semear e colher o milho que aloirava aos primeiros calores fortes e, no Inverno, a erva dos lameiros, que formava tapetes sempre húmidos, era o seu único sonho, a grande aspiração da sua vida.» Ferreira de Castro, Emigrantes (1928)

«Havia sermonários latinos, um Marco Marulo, três retóricas, muitas teologias, um Euclides, comentários de versões literais de Tito Lívio e Virgílio. Deixei tudo na benemérita podridão, tirante uma versão castelhana do mantuano por Diego Lopez e um muito raro Entendimento Literal e Construiçam Portuguesa de Todas as Obras de Horácio, por industria de Francisco da Costa, impresso em 1639. Camilo Castelo Branco, A Brasileira de Prazins (1882)

sábado, agosto 16, 2025

zonas de conforto

«Mas na grande mudez e no silêncio sente-se o arfar reprimido dos peitos. / -- Jesus há-de voltar para nos dar a terra. / -- Voltar?! Os pobres hão-de ser sempre pobres! / -- Não -- teima o Manco, com o cigarro ao canto da boca --, os ricos que fiquem com o dinheiro, mas a terra é dos probes.» Raul Brandão, O Pobre de Pedir (póst., 1931) 

«E adiante, num pinheiral, apesar de luzir no alto a estrelinha da tarde, e o bom trabalhador ter fome, parou até encher o saco de uma velhinha que, tremendo, e arrimada a um bordão, apanhava agulhas e pinhas. A velha murmurou: "Deus te dê alegria em tua casa!"» Eça de Queirós, S. Cristóvão (c. 1891/1912)

«Barrelas vestia-se com a estopa e o linho dos seus linhares e o burel apisoado das próprias ovelhas. Uma capucha de marca durava dois dias. / No Outono, assim que as sombrias começavam a cair nas esparrelas, um cristão recolhia-se à toca. Lar bem sortido de lenha, de porco na salgadeira, pipinha com o espicho a compasso, o boizana do temporal podia bufar.» Aquilino Ribeiro, O Malhadinhas (1922)

2 versos de João de Castro Osório

«É para dar aos céus a humana graça, / Que eu hei-de sofrer de amor.» 

                                              «Canto de Maio», O Cancioneiro Sentimental (1936)

ucraniana CCCXCIV - a Cimeira do Alasca

Apesar de pouco sabermos, gostei imenso do que vi e ouvi. Ainda não me estou a rir, porque não sabemos o que esperar dos legumes da UE e da Nato: vão ficar sentados e quietos à voz do dono?, irão rosnar? ou pretendem levar mais longe o desafio à Rússia, empenhando-se para pagar armamento aos Estados Unidos? (Este rapaz Trump...)  

sexta-feira, agosto 15, 2025

3 versos de António Patrício

«É a minha mãe mais perto, mais pertinho, / Que eu sinto quando toco o velho chale / Que guarda um não sei quê do seu carinho.» 

«Relíquia», Poesias (póst., 1942)                  

o que está a acontecer

«Os filhos do seu predecessor Vítiza, os mancebos Sisebuto e Ebas, disputaram-lha largo tempo; mas, segundo parece dos escassos monumentos históricos dessa escura época, cederam por fim, não à usurpação, porque o trono gótico não era legalmente hereditário, mas à fortuna e ousadia do ambicioso soldado, que os deixou viver em paz na própria corte e os revestiu de dignidades militares. Daí, se dermos crédito a antigos historiadores, lhe veio a última ruína na batalha do rio Críssus ou Guadalete, em que o império gótico foi aniquilado» Alexandre Herculano, Eurico o Presbítero (1844)

«Mandei perguntar à Sr.ª Joaquina se dava licença que eu visse os livros. Não só mos deixou ver, mas até mos deu todos -- que escolhesse, que levasse. / Examinei-os com alvoroço de bibliómano. Eles, gordurosos, húmidos, empoeirados, pareciam-me sedutores como ao leitor delicadamente sensual se lhe afigura a face da mulher querida, oleosa de cold-cream, pulverizada de bismuto.» Camilo Castelo Branco, A Brasileira de Prazins (1882)

«A cercar os mimos viçosos da natureza e a muitos deles servindo de dossel, corria a vinha, toda armada em carvalho e arame, com espigões no muro branco que ele sozinho erguera, aos domingos, desde os alicerces à dentadura de vidros partidos -- veto indispensável ao arrojo da gatunagem.» Ferreira de Castro, Emigrantes (1928)

quinta-feira, agosto 14, 2025

4 versos de Fausto Guedes Teixeira

«Com sol ainda, começou o dia, / Que, em breve, se toldou, vinda a tormenta, / Como tudo na vida principia, / Por um sorriso que se não sustenta.» 

«A neve», O Meu Livro, 2.ª Parte (póst., 1941)

ucraniana CCCXCIII - cortinas de fumo

Comecemos pela politicalha nacional: Montenegro a papaguear sobre cessar-fogo. Como ele deve saber que o cessar-fogo é uma cortina de fumo para que o países ocidentais -- como já foi admitido por Starmer, um dos idiotas-séniores -- nomeadamente Inglaterra e França, e que tal nunca será admitido por Putin (devem ter explicado isso ao Montenegro), o primeiro-ministro português está a palrar, a falazar e a ver se engana os portugueses. Tristeza igual é ver aquela nulidade chamada António Costa a tuitar... Como é bom tuitar -- para os amigos, claro, porque ninguém liga nenhuma a este corta-fitas internacional.

Os grandes idiotas: Macron, Starmer, Merz, além da fluida Meloni, entre outros, querem:

1. Que a Rússia renuncie, que transforme a vitória extraordinária que está a ter (só em sanções, a UE já prepara o 19.º pacote) contra todo o Ocidente (Estados Unidos incluídos) numa derrota. Tanto quanto me é dado ver do meu poiso de férias, tal não vai acontecer. 

2. Enrolar Trump, puxá-los desesperadamente para o seu lado. Até levam ao colo o fantoche Zelensky, impingindo-o, mais uma vez. E Trump diz que sim -- afinal de contas, está a falar com clientes da indústria de guerra americana. Mas o que Trump diz ou deixa de dizer tem um prazo de validade de horas ou minutos, até ao encontro com Putin tudo e o seu contrário pode acontecer.

Com os dados que tenho, que são nenhuns, arrisco-me a dizer o seguinte:

1. A Rússia não cederá em qualquer dos seus interesses vitais.

2. Ou Trump e Putin embrulham aquilo muito bem, ou o primeiro concretiza o plano B do incapaz Joe Biden: deixa o bebé nos braços europeus, porém, com a grande diferença do golpe de génio de vendedor que é: os europeus e a Ucrânia compram-lhe armamento, para que tentem resolver a guerra que os Estados Unidos criaram e estão a perder e a querer safar-se dela rapidamente e sem vergonha...

Compram armamento para quê? Para entrar em guerra com a Rússia, como parece terem imensa vontade uns lunáticos britânicos e outros. A sério?... Mas como é possível ser-se tão estúpido e ao mesmo tempo tão desonesto e vigarista?

E o Montenegro, se a guerra estoirar, vai dizer o quê? Vai continuar com vacuidades; vai amochar e mandar os filhos dele e dos outros combater num conflito que ao interesse nacional diz praticamente zero? Ou vai ser primeiro-ministro  de uma nação soberana, e estar à altura dos séculos que temos, com todas as glórias e todas as misérias que a nossa história comporta? Seremos um país de governantes dignos ou de animais domésticos? 

quarta-feira, agosto 13, 2025

2 versos de António Sardinha

«Chuva da tarde, -- melodia mansa, / Desejos vagos de chorar baixinho...» 

Chuva da Tarde (1923)

terça-feira, agosto 12, 2025

2 versos de Edmundo de Bettencourt

«Certo passado audaz sempre revive, / Apenas, sob um céu menos escuro;» 

«Nebulosa», O Momento e a Legenda (1930)

segunda-feira, agosto 11, 2025

zonas de conforto

«Palavra era palavra, mais ouro de lei que uma peça de D. João. Assinava-se de cruz e muito judeu seria aquele que negasse os dois rabiscos lavrados de seu punho, porque não era só negar dois rabiscos, mas o grande sinal de lisura e de verdade que Jesus Cristo deixou aos homens ao morrer num madeiro para nos remir e salvar! Vão lá agora com essas!...» Aquilino Ribeiro, O Malhadinhas (1922)

«O rapaz tornou a tolher-se de medo, e perguntou a meia voz: / -- Seria a alma? / -- Do senhor capitão-mor? Não me pareceu; que ela ia de saia escura e levava um saiote pela cabeça. / Neste comenos, descia o moleiro do lado da serra pela barroca escura com dois jumentos carregados de foles, e vinha cantando: // Já fui canário do rei, / Já lhe fugi da gaiola, / Agora sou pintassilgo / Destas meninas d'agora.»  Camilo Castelo Branco, Maria Moisés (1876-77)

«Diante de cada cruz pregada nos troncos da mata, tirava o seu barrete de pele de coelho, rezava uma ave-maria. Ao passear na lagoa, mais reluzente, sob a amarelidão da tarde entre os seus altos canaviais, que uma moeda de ouro nova, deixou um molho de carqueja e de achas para o ermita, que ali erguera a sua choça de rama.» Eça de Queirós, S. Cristóvão (c. 1891/1912)

4 versos de Augusto Gil

«Caminho para casa a passo lento, / Talvez que lendo um pouco fique bem... / Antes eu não tivesse algum talento  / E fosse o parvo alegre que além vem.» 

«Tarde aziaga», Versos (1901)

o que está a contecer

«A podridão tinha chegado ao âmago da árvore, e ela devia secar. O próprio clero se corrompeu por fim. O vício e a degeneração corriam soltamente, rota a última barreira. / Foi então que o célebre Roderico se apossou da coroa.» Alexandre Herculano, Eurico o Presbítero (1844)

«Fazendo sentinela à terra pródiga, duas cerejeiras contrastavam, pela sua frescura e opulência da folhagem, com a figueira árida -- apesar de tudo muito mais feliz do que a bíblica, pois Judas fora substituído por uma grande abóbora amarela, que pendia da primeira forquilha. » Ferreira de Castro, Emigrantes (1928) 

«Constou-me aqui há dias que a Sr.ª Joaquina de Vilalva  tinha um gigo de livros velhos entre duas pipas na adega, e que as pipas, em vez de malhais de pau, assentavam sobre missais. O meu informador denomina missais todos os livros grandes; aos pequenos chama cartilhasCamilo Castelo Branco, A Brasileira de Prazins (1882)

domingo, agosto 10, 2025

4 versos de António Feijó

«Acorde místico e divino, / Murmúrio lânguido de prece / É como um som azul e branco, harpa e violino, / A tua voz que me adormece.» 

«Aquela que veio tarde», Ilha dos Amores (1897)

ucraniana CCCXCII: por que razão russos e americanos não querem saber da declaração conjunta europeia para nada?

Porque -- como escrevi aqui desde o primeiro dia -- esta é uma guerra entre americanos e russos, em que os ucranianos serviram de carne para canhão e os patéticos europeus, que produzem este flato político indigno, os grandes países europeus (Polónia à parte), foram, e continuam, verbos de encher dos americanos.

Todos os analistas militares sabiam que era assim, mas poucos foram honestos para com o público que tinham a obrigação de informar. Quanto aos comentadores civis, os dedos das mãos sobram para enumerar os competentes e decentes. Há esta história suja ainda a fazer. 

sábado, agosto 09, 2025

como és belo, ó Constitucional

As restrições ao agrupamento familiar são uma canalhice sem nome, ainda para mais por quem se diz defensor da família; 

Os obstáculos criados aos cidadãos dos países da CPLP são reveladores do grau zero de um entendimento político da posição de Portugal num mundo em crise;

As vantagens concedidas a estrangeiros pelas competências ou pelo dinheiro que carregam nos bolsos, não interessa qual a proveniência, demonstram um país servil e mentalidade de escravos.  

3 versos de Manuel Laranjeira

«A tarde lenta cai. E cai também  / Uma melancolia venenosa, / Meu Deus! que se não sabe de onde vem...»

«À tarde», Comigo (1912)

sexta-feira, agosto 08, 2025

zonas de conforto

«E, vejam, o meu rico linhar do Paul -- água quanta quer, estrume do cortelho, sacho e mais sacho -- não paga a mantença do cultivador! / Voltou-se tudo; de meu tempo, também, homem de palavra era como se trouxesse sempre consigo um alforge de libras. Ajustava o que queria e levantava o que queria de proprietários e de tendeiros.» Aquilino Ribeiro, O Malhadinhas (1922)

«Um dia, numa floresta, ao entardecer, quando por sobre as frondes ressoavam as buzinas dos porqueiros, e lentamente na copa alta dos carvalhos se calavam as gralhas, um lenhador, um servo, de surrão de estamenha, que rijamente trabalhara no souto desde o cantar da calhandra, prendeu a machada ao cinto de couro, e, com a sua égua carregada de lenha, recolheu pelos caminhos da aldeia, ao castelo do seu Senhor.» Eça de Queirós, S. Cristóvão (C. 1891/1912)

«-- Tu onde vás a esta hora?! / -- Vou à cata de uma cabra. Você viu-a? / -- Eu não. Olha lá, a tua ama Zefa também anda à procura da cabra? / Àgora! A senhora Zefinha está doente há mais de mês e meio na cama. / -- Isso sei eu; mas havia de jurar que a vi saltar agora o portelo da cortinha do rio! Se não era a Zefa era o demo por ela!» Camilo Castelo Branco, Maria Moisés (1876-77)

quinta-feira, agosto 07, 2025

o que está a acontecer

«Introdução Entre as diversas moléstias significativas da minha velhice, o amor aos livros antigos -- a mais dispendiosa -- leva-me o dinheiro que sobra da botica, onde os outros achaques me obrigam a fazer grandes orgias de pílulas e tisanas. E, quando penso que me curo com as drogas e me ilustro com arcaísmos, arruíno o estômago, e enferrujo o cérebro numa caturrice académica.»  Camilo Castelo Branco, A Brasileira de Prazins (1882)

«No corpo mirrado, saliente de ossos, só as pernas avolumavam, ponteadas de buracos negros. Na cabeça calva, faces lívidas, queixo recuado, os olhos guardavam um terror de demência, dilatados de espanto pelo próprio grito que lhe escancarava a boca.» Manuel da Fonseca, Cerromaior (1943)

«As alfaces, viçosas e tenrinhas, dariam para alimentar todos os grilos que, nas redondezas, formavam em tardes cálidas e noites consteladas, de Verão, uma orquestra interminável e monossónica.» Ferreira de Castro, Emigrantes (1928)

quarta-feira, agosto 06, 2025

serviço público: "Barroso: resistência em tempos de servidão", ou gosto imenso quando 'eles' se referem aos nossos (deles) valore$

A prospecção do lítio em Terras de Barroso (Boticas e Montalegre) é um abuso do Estado, exercido sobre os cidadãos daquele território. E de uma ilegitimidade ética e moral a toda a prova, mesmo que sancionada por uma duvidosa legalidade. Aqui deve entrar o direito de resistência; eu diria, o dever de resistência. Quando está em causa o que podemos ler aqui, e o mais que lá não está, toda a resistência é legítima quando uma população é vendida pelos seus governos. Foi traída pelo governo do PS, continua a sê-lo pelo da AD. 

sábado, agosto 02, 2025

o que está a acontecer

«Mas o grito ainda ecoava, morria aflito e longo. Sentiu os homens agitarem-se na cela comum do rés-do-chão. Perto, soltou-se uma voz lamentosa e resignada: / -- Cala-te, Doninha! / Em baixo, de pé sobre o parapeito de uma das janelas, um homem completamente nu, mãos escuras enclavinhadas nos varões das grades, voltou a gritar.» Manuel da Fonseca, Cerromaior (1943)

«Mas a mãe portuguesa é capaz de grandes crueldades protestantes, de um desprendimento que, por ser inesperado e um tanto alheio à sua natureza, é de mais difícil digestão. No entanto, sei-o hoje, a minha mãe sofria com o revés na minha vida e não queria que o excesso de afagos a tornasse cúmplice moral da derrota.» Bruno Vieira Amaral, As Primeiras Coisas (2013)

«À volta dele criou-se assim uma espécie de mitologia que julgo digna de crónica, embora queira penitenciar-me de ser eu a escrevê-la, pois a um neto de campino nunca deveria ser permitido o acesso a certos meios de expressão que o progresso, sorrateiramente, enfiou pelas nossas fronteiras. / Acuso-me deste ultrajeAlves Redol, Barranco de Cegos (1961)

dêem as voltas que quiserem, mas o que desbloqueou, até ver, a situação da Palestina foi o massacre do 7 de Outubro

Podemos não gostar do Hamas -- eu cá não gosto de organizações político-religiosas ou outras que não distinguem os legítimos alvos militares e estatais dos outros. Tão inocente é uma criança israelita como uma criança palestina. Ponto final e parágrafo! --, porém, qualquer pessoa com o mínimo de acuidade percebeu que a acção repugnante do Hamas a 7 de Outubro de 2023 foi um acto desesperado de quem via a Palestina a ser vendida nos chamados Acordos de Abraão pelos nababos do Golfo aos Estados Unidos via sucursal israelita.

O Hamas sabia que a resposta seria brutal, e que iria fazer muitas vítimas inocentes; o que nem o Hamas nem ninguém calculou (creio) foi o contorno bíblico da reacção. A um massacre, Israel respondeu com um genocídio, além do propósito assumido de limpeza étnica (por favor, coninhas de serviço do Direito Internacional e das Relações dele, não me venham com especificaçõezinhas vesgas, cobardes ou pérfidas).

Ou seja: a máscara caiu às facções israelitas que têm merecido o voto da maioria dos cidadãos, o que, infelizmente para estes, também os responsabiliza. De tal forma que Israel, para mim, perdeu o direito a existir como estado.

Os estados europeus e outros foram obrigados pela opinião pública a tomar uma atitude, tímida; é claro que se estão nas tintas para as vítimas civis -- basta ver o alarido falso e manobrador que fizeram para com as vítimas da guerra na Ucrânia e o silêncio porco com que deixaram a situação chegar até aqui. Portugal lá vai, contentinho, escondido pela Inglaterra, França, Canadá e na companhia (nunca desprezível) de Andorra, San Marino, entre outros.

sexta-feira, agosto 01, 2025

David Benoit, «Pebble Beach»

elogio do jornalista Henry Galsky

Ao contrário de boa parte dos colegas do estúdio -- uns bonecos sem brio profissional ou coluna vertical, que não se importam de ser títeres -- Galsky aceitou fazer uma reportagem altamente condicionada; no entanto, não se deixou manipular. Se as autoridades israelitas quiseram fazer propaganda sobre a maquinação da fome em Gaza por parte do Hamas, o repórter desmontou esse intento. Mais que isso: não só desmontou como o contexto em que o faz não deixa que quem o está a ver -- o cidadão -- perceba minimamente o que está a acontecer, para além dos labirintos da propaganda. 

Não tem grande espectacularidade, a reportagem; mas é mil vezes preferível um breve apontamento asseado e digno. Asseio e dignidade é o que falta a muitos colegas de Henry Galsky.

Em tempo: o pseudojornalismo abaixo de cão leva-nos a elogiar um repórter por fazer normalmente o seu trabalho...

2 versos de Fernando Jorge Fabião

 «um dia a música do mar / será mais leve que o verde» 

Nascente da Sede (2000)