Um monólogo que nos apresenta a figura grotesca do Teles, um ex-magistrado destituído de funções por corrupção, tal foi o resultado do vício do jogo. Oriundo de boas famílias, a mulher morre-lhe de desgosto e uma das duas filhas, da tísica, enquanto a outra se torna prostituta ("Desgraça acarreta desgraça.") Mas é na degradação que o Teles se encontra, é aí que ele se confronta com a sua verdade mais íntima. Fantasista, sonha-se rei absoluto, elocubrando vinganças sobre todos com quanto se cruzou na via para a desgraça; lúcido, apercebe-se de que os códigos legislativos nunca poderão fazer justiça à alma de um homem.
início: «No calabouço do Governo Civil.»
excerto: «Que distância há entre o homem e o homem? entre o homem correcto, o homem e todos os dias e o homem capaz de praticar um crime?... Que mixórdia! e que canalha eu sou quando deparo com o fundo de mim mesmo!... Mas não me julguem infeliz. Não sou infeliz. Devo confessar que depois que sou desgraçado é que me sinto mais feliz. Encontrei-me.»
Raul Brandão, «O rei imaginário», Teatro [1923], estudo introdutório de Luiz Francisco Rebello, Lisboa, Editorial Comunicação, 1986, pp. 119-123.
Sem comentários:
Enviar um comentário