Ao fim de sessenta dias de greve de fome e pouco interesse da imprensa em geral, cerca de meio milhar de trabalhadores indocumentados na Bélgica suspenderam a luta em face de um sinal de cedência do governo, a caminho de se ver nos braços com novos Bobby Sands (afinal o que reclama(ra)m uns e outros a não ser o direito à dignidade de ser humano?)
Um marroquino em lágrimas, na casa dos quarenta, dizia estar há dezassete anos na Bélgica sem quaisquer direitos ou segurança, para fazer o trabalho que os belgas não querem fazer, mas que os magrebinos como ele, ou os portugueses e os romenos executam. Estes têm a vantagem da estar dentro da UE, ao abrigo dos "valores europeus".
Ao contrário do cagarim provocado pela lei húngara, que põe as crianças ao abrigo da inculcação lgbt nas escolas, o que pode representar um atentado à autodeterminação sexual das crianças -- que têm mesmo de estar ao abrigo destes maluquinhos --, não vi a senhora Ursula von der Leyen e restante pessoal político a manifestar-se com tamanha indignação.
A questão polaca: estou pouco informado, mas haver povoações que se autodesignam como "zonas livres de pessoas lgbt", já me parece demasiado acintoso e grave, fazendo quase lembrar os tempos dos pogroms. Quanto a isso, não deve haver qualquer contemporização. Mas nada de amálgamas, uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa, como diria o gil vicente.
Quando uma acção política -- mais ou menos acertada ou errática -- pretende salvaguardar crianças e jovens de abordagens que podem ser prejudiciais ao seu desenvolvimento integral e livre é apresentada com histeria como uma questão de direitos humanos, só apetece mandá-los à fava. Mas o governo húngaro persegue alguém por ser homossexual? Não podem estes organizar-se como bem entendem?
Por falar em amálgama: ontem, no Telejornal, a propósito do referendo que Orbán vai convocar, o pivot, tendenciosamente -- ou então não faz um cu do que anda para ali a dizer, como tantas vezes sucede com todos eles --, falou em "lei anti-lgbt". Nem vale a pena gastar latim com isto.
O ministro dos Negócio Estrangeiros do Luxemburgo contratacou a notícia do referendo húngaro propondo um referendo europeu para saber se a Hungria deve continuar na UE, algo que presumo nem esteja previsto nos tratados. O descabelamento e a patranha. E depois dizem que não há lóbi gay... O que não há é lóbi suficientemente influente para os indocumentados que têm de viver uma vida clandestina, ao sabor da sorte.
Em tempo: e por falar em maluquinhos, à solta no seio do governo e no PS, vale a pena ler tudo aqui.
"Estudos Culturais" ministrados por analfabetos, deixando os alunos ainda mais analfabetos do que quando entram nas universidades. E depois, o vezo censório. Bem podem argumentar que não há guerras culturais (elas já estavam no meio de nós antes de darmos por elas). Tal como o choque de civilizações, que o politicamente correcto negava. Temos visto.
Em tempo 2: não fora Igreja e as associações de apoio aos imigrantes, e eles bem podiam estar à espera das indignações de Ursula, no MNE luxemburguês e até de Santos Silva...
Em tempo 3: é uma pena que o tema da liberdade esteja a ser deixado à Direita, usado de forma oportunista pelo populismo. Mas a culpa é só da esquerda. Hei-de voltar ao tema.
7 comentários:
Não conheço a lei magiar e das bravatas polacas sou alegre ignorante. Uma coisa sei, é que o que nos chega dos amados líderes destas cristianíssimas nações são coisas muito reacionárias, passadistas. Se bem compreendi, os objectivos dos húngaros, é poupar as crianças à influência deletéria da informação sobre lésbicas, gays e transformistas do sexo. Ora essas coisas existem e não me consta que a sua prática venha de proselitismos ou influências. Cabe na nossa cabeça que se convença alguém a praticar o «amor sem nome», ou a fazer crescer os seios de macho, ou a convocar o bisturi para transformar a genitália porque de pequenino foi informado da sua existência e, chegado à idade da razão, se disponha a experimentar para ver se é bom? Isso é do domínio do ser, não é como aderir a um partido ou entrar como sócio de um clube de futebol.
Assim, acho bem que a escola cumpra a sua função formativa sobre essas situações. A escola, porque infelizmente a família nem sempre é capaz, por incapacidade dos progenitores ou disforia do agregado. As crianças – a partir de idade é que não sei – têm de estar informadas do que há no mundo em que vão viver. Isso é tão importante como saber as fórmulas químicas, as capitais dos países, os nomes dos poetas e as suas obras. Só assim se conseguirá o exercício da tolerância que é um dos grandes valores civilizacionais.
Quanto a imigrantes, o senhor Orbán, ou lá como se chama, também não é bom exemplo, pelas mesmas razões da sua aparente ou real aversão às minorias sexuais.
Caro,
Venha de lá essa discussão franca, aberta e tolerante! O seu post exige comentário à altura, e estou já a esfregar-me as mãos! Mas terá de ficar para mais logo, pois agora estou com outra coisa em elas.
Abraço
Em breves tranches:
Eu também conheço pelo que li e ouvi. E é preciso sempre ter cuidado.
Eu francamente estou-me nas tintas para os rótulos. Quero lá sabe se o Orban é reaccionário, os húngaros que se entendam com ele.
(Aliás, parece que houve uma grande manifestação LGBT, em Budapeste. Quem ouvisse os guinchos do lóbi e dos que querem ganhar votos à custa dele, pareceria que os homossexuais eram perseguidos na Hungria.)
A principal razão deste post é a desvergonha e a histeria dos políticos europeus, Ursula van der Leyen ao Santos Silva a baterem no peito por cause da lei húngara e a fecharem os olhos à perseguição aos políticos catalães e a não levantarem a voz numa greve de fome de sessenta dias de imigrantes na Europa.
Portanto: deixem de ser palhaços, e falem sem cálculo eleitoral. Em relação às proclamações da Ursula, estou conversado.
(continua)
Um salto ao último parágrafo. A sua ocorrência faz-me pensar que me julga apoiante do Orbán, caso contrário não percebo a sua pertinência no comentário.
(continua)
Vamos então ao que interessa.
Você dizer que as crianças devem saber da existência de várias orientações sexuais e de fenómenos complexo como a transexualidade é do domínio das cadeiras de biologia que é dada nos liceus.
É óbvio que não se trata disso, não sejamos ingénuos. E agora dou um salto aqui para a nossa parvalheira que se gosta de fazer avançada, mas que é apenas uma atraso de vida europeu: o que querem nas aulas da educação cívica não é o ensinar a separar o lixo, ou fazer pedagogia sobre a igualdade de género, contra a violência doméstica, ou o ensino da aceitação do outro. A coberto das boas intenções um professor militante da cause pode convidar associações a entrarem plea escola adentro e emitirem qualquer anormalidade.
Diz você qua a sexualidade é do domínio do ser, e diz muito bem, na minha opinião. Mas não sabe voc~e que há por aí maluqinhos que contestam a biologia defendendo que a sexualidade é uma construção social, uma opção e não uma determinação do ser, como você diz, e bem? E acha que a escola deve ser escancarada a estes alucinados?
E a partir de que idades? Você confessa que não sabe. Pois, o melhor seria pensar-se com seriedade e não fazer da escola campo de batalha, como tristemente está a suceder em vários lados. O que, de resto, só mostra que eles não têm qualquer respeito pelas crianças, que se estão nas rintas para elas, querem é vender o peixe, e mal cheiroso.
A formação da personalidade das crianças é demasiado séria para estar ao sabor de activismos da moda. Não o respeitar é atentar contra a individualidade e autodeterminação das crianças. Chamar ao proselitismo lgbt uma questão de direitos humanos serve para sensibilizar os incautos e para os Santos Silvas fazerem proclamações que, repito, ne fizeram vir as lágrimas aos olhos.
Sou nefelibata, mas não cometo o despudor de o julgar apoiante da Ursula e do Orbán, especialmente deste.
Falar de “proselitismo LGBT” não tem sentido. Não há prosélitos, pois não estamos perante uma religião ou uma ideologia. E diz muito bem serem “maluquinhos” os que defendem a sexualidade como uma construção social. Claro que há lóbis ou grupos de pressão, mas em que domínios, nos tempos de hoje, os não há?
Não pertenço à área da educação, os professores que falem, e o meu caro, se fala, é porque algum conhecimento tem do assunto… Quando digo “crianças”, é aos jovens que me refiro, aos que se estão a “criar” em personalidade. Não imagino certos discursos no jardim-escola ou no nível primário.
Ingenuidade ou não, acredito no papel da escola na formação dos jovens. Apesar de todos os erros, porque há sempre erros… É a minha costela de iluminista que fala. Tal como o meu caro, sou pelo saber das enciclopédias, contra o obscurantismo. O mesmo não direi do “apparatchik” húngaro.
E também é petroleiro do ideal?...
Proselitismo: seria como diz, se se tratasse de uma questão pura e simples de direitos humanos, ou seja a não discriminação, perseguição etc. de outrém em face das suas orientações sexuais. Ora essa fase já está ultrapassada de há muito.
A circunstância de haver lóbis etc., obriga-nos a estar mais atentos e a perceber o que é legítimo e o que não é, e defender os mais fracos ou desprotegidos das ofensivas desses lóbis. E isso implica, por exemplo, preservar a escola do assalto destes grupos de pressão, coisa de que este governo se demite -- por cálculo, no caso do Costa, que só quer que não o macem com questões de lana caprina. É preciso dizer portugueses e portuguesas e idiotices similares para ganhar votos dos grupos de pressão e ter boa imprensa, pois diga-se á vontade, o que é que isso interessa?...
Os professores... que boa piada, meu caro. Como diz o outro, a educação é demasiado importante para ser deixada nas mãos dos professores. Tal como você, sou cidadão e sou pai, e é só o que interessa para aqui. Um mínimo de bom senso diria que, sob vários pontos de vista, a começar pelo pedagógico, o científico e a acabar no político, a escola deve ser um chão comum e não campo de batalha, como estão a transformá-la.
Sendo ponto assente que você quer deixar as crianças à margem das pugnas lgbt -- como qualquer pessoa de bom senso -- o que importa é despertar nos jovens o espírito crítico, pois só ele defende os indivíduos de todo o tipo de assalto a que estão sujeitos. É para isso que deve servir a escola: ensinar as bases para o espírito crítico, tudo o mais é acessório.
Encontremo-nos pois ambos nesse campo comum crítico e racionalista, que é de onde nasce a luz. Algo que como bem sabe é desvalorizado neste ambiente liquefeito em que vivemos.
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