O que mais há na terra, é paisagem. Por muito que do resto lhe falte, a paisagem sempre sobrou, abundância que só por milagre infatigável se explica, porquanto a paisagem é sem dúvida anterior ao homem, e, apesar disso, de tanto existir, não se acabou ainda. Será porque constantemente muda: tem épocas no ano em que o chão é verde, outras amarelo, e depois castanho, ou negro. E também vermelho, em lugares, que é cor de barro ou sangue sangrado. Mas isso depende do que no chão se plantou e cultiva, ou ainda não, ou não já, ou do que por simples natureza nasceu, sem mão de gente, e só vem a morrer porque chegou o seu último fim. Não é tal o caso do trigo, que ainda com alguma vida é cortado. Nem do sobreiro, que vivíssimo, embora por sua gravidade o não pareça, se lhe arranca a pele. Aos gritos.
[Da 4.ª edição, Editorial Caminho, Lisboa, 1983. Foi o meu primeiro contacto com os romance de Saramago, continuado por alguns anos, depois interrompido e agora retomado, espero. Deu-mo o meu pai, em Novembro de 1983.]
A SERPENTE CEGAMarço de 1916
Mazina, Kuangar, Naulila... Nomes que soam como bofetadas.
depois hesita-se, dispute-se, combate-se. Já a face arrefece. Alguns querem mesmo oferecer a outra. mais um passo: requisitam-se os navios... E a hora grande bateu: estala a declaração da Alemanha.
Na Câmara a sala, de pé, desde as carteiras até às galerias, ao formigueiro humano, delira e aclama com uma só boca: Viva a República! Viva a guerra!