E A MORTE À ESPERA
A vida a correr...
...E a morte à espera
Que a corrida acabe...
A vida a sorrir...
...E a morte à espera
Que o riso se apague...
A vida a cantar...
...E a morte à espera
Que o canto emudeça...
A vida a sonhar...
...E a morte à espera
Que o sonho feneça...
A vida a chorar...
...E a morte a rir...
Porque a vai levar...
Eterna no Tempo
domingo, abril 30, 2006
sábado, abril 29, 2006
Diálogo
EU-- Vamos ver o Bambe?
FILHA + NOVA (desdenhosa) -- Não é Bambe!
EU -- Então?
FILHA + NOVA (assertiva) -- ...é o Baaami!!
FILHA + NOVA (desdenhosa) -- Não é Bambe!
EU -- Então?
FILHA + NOVA (assertiva) -- ...é o Baaami!!
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Correspondências #43 - Norton de Matos a «um ilustre português»
[14 de Agosto de 1948]
Ex.mo Sr.
Ex.mo Sr.
Vindo do Norte após alguns dias de parcial repouso, bem necessário depois de dois meses de grandes trabalhos, encontro a carta de V. Ex.ª.
Do meu Manifesto à Nação conclue-se o seguinte, quanto aos fins da caminhada política que iniciei:
a) Apresentar a minha Candidatura à Presidência da República e fazer dentro da lei o possível para que ela vingue;
b) Se ela vingar, nomear um Governo, cujos principais e quase únicos fins serão tomar as medidas necessárias para se passar ràpidamente de um regime de características totalitárias para outro que nem sombras delas tenha. A única maneira de se conseguir isto será realizar no mais curto praso a eleição de uma Câmara Constituinte.
Ora se a eleição dessa Câmara fôr, como não poderá deixar de ser sendo eu Presidente da República, inteiramente livre, estou convencido de que nela haverá deputados monárquicos, cuja eleição resultará de livre propaganda monárquica e que por certo nela proporão o que mais conveniente julguem para o restabelecimento do nosso país.
Como republicano liberal e parlamentar que sou, apenas me limito a aspirar a que a Constituição Política que essa Câmara der à nação, seja uma Constituição Republicana e que, consequentemente, em Portugal se entre numa 2.ª República, parlamentar e liberal, único regime que julgo capaz de lhe trazer a prestigiante, justa e humana grandeza pela qual sempre tenho trabalhado.
Mas nunca essa aspiração provocará em mim quaisquer actos que afastem a liberdade da eleição e das discussões ou deliberações da Câmara Constituinte.
Pode V. Ex.ª fazer o uso que quiser desta carta.
Sou, de V. Ex.ª, com a maior consideração,
M.to At.to e Obg.do
Norton de Mattos
In Os Dois Primeiros Meses da Minha Candidatura à Presidência da República
sexta-feira, abril 28, 2006
Figuras de estilo #28 - Vergílio Ferreira
Pensar que um minuto depois de morto é igual a uma eternidade depois de morto -- que é igual ao tempo em que já não houvesse homens sobre a Terra. Tudo tão absurdo quando a ilusão se retira. Mas todos os actos se referenciam não tanto a quando se está vivo como a quando se está morto. Que significa a «dignidade» com que viveram os biliões de anónimos de há cem, mil, dez mil anos? Porque os que deixaram nome, deixaram ainda o nome para nos serem. É igual a não terem deixado.
Conta-Corrente 1
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quinta-feira, abril 27, 2006
Antologia Improvável #126 - Alexandre O'Neill (3)
PERFILADOS DE MEDO
Perfilados de medo, agradecemos
o medo que nos salva da loucura.
Decisão e coragem valem menos
e a vida sem viver é mais segura.
Aventureiros já sem aventura,
perfilados de medo combatemos
irónicos fantasmas à procura
do que não fomos, do que não seremos.
Perfilados de medo, sem mais voz,
o coração nos dentes oprimido,
os loucos, os fantasmas somos nós.
Rebanho pelo medo perseguido,
já vivemos tão juntos e tão sós
que da vida perdemos o sentido...
Poemas com Endereço / Poesias Completas
Perfilados de medo, agradecemos
o medo que nos salva da loucura.
Decisão e coragem valem menos
e a vida sem viver é mais segura.
Aventureiros já sem aventura,
perfilados de medo combatemos
irónicos fantasmas à procura
do que não fomos, do que não seremos.
Perfilados de medo, sem mais voz,
o coração nos dentes oprimido,
os loucos, os fantasmas somos nós.
Rebanho pelo medo perseguido,
já vivemos tão juntos e tão sós
que da vida perdemos o sentido...
Poemas com Endereço / Poesias Completas
quarta-feira, abril 26, 2006
Quem não faz bem a uma pessoa, faz-lhe mal...
Gorki
Que ficará duma vida tão plenamente cumprida, prolongada nos filhos e nos netos, da bondade para além das vazias palavras de circunstância, praticada cada dia sem olhar a quem? Que ficará, senão a memória do terno riso sofrido da minha Mãe? Bondade e eternidade, imperfeitíssima rima.
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terça-feira, abril 25, 2006
segunda-feira, abril 24, 2006
Antologia Improvável #125 - Carlos de Oliveira (4)
A ILHA
para a Ângela
A ilha era deserta e o mar com medo
de tanta solidão já te sonhava:
ia em vento chamar-te para longe
e longamente em espuma te esperava.
À cinza dos rochedos atirava
na grande madrugada adormecida,
já saudosos de ti, os braços de água,
sem ter acontecido a tua vida.
Sim, meu amor, antes de Zarco vir
provar o sumo e o travo à solidão,
no litoral de pedra pressentida
o mar imaginava esta canção.
E as lúcidas gaivotas desse tempo
talhavam como um voo o teu amor:
o início de lava e sal que deixa
(talvez) neste poema algum esplendor (1).
(1) A ilha hoje é um paraíso inglês
de orquídeas e renques orvalhados:
mister X e a cana do açúcar
mister Y, bancos, luz, bordados.
Ó Cesário, pudesses tu voltar
e deste cais onde não há varinas
ver os garotos na água a implorar
(sir, one penny) o oiro das neblinas.
Terra de Harmonia / Trabalho Poético
para a Ângela
A ilha era deserta e o mar com medo
de tanta solidão já te sonhava:
ia em vento chamar-te para longe
e longamente em espuma te esperava.
À cinza dos rochedos atirava
na grande madrugada adormecida,
já saudosos de ti, os braços de água,
sem ter acontecido a tua vida.
Sim, meu amor, antes de Zarco vir
provar o sumo e o travo à solidão,
no litoral de pedra pressentida
o mar imaginava esta canção.
E as lúcidas gaivotas desse tempo
talhavam como um voo o teu amor:
o início de lava e sal que deixa
(talvez) neste poema algum esplendor (1).
(1) A ilha hoje é um paraíso inglês
de orquídeas e renques orvalhados:
mister X e a cana do açúcar
mister Y, bancos, luz, bordados.
Ó Cesário, pudesses tu voltar
e deste cais onde não há varinas
ver os garotos na água a implorar
(sir, one penny) o oiro das neblinas.
Terra de Harmonia / Trabalho Poético
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domingo, abril 23, 2006
Correspondências #42 - Raul Proença a Fidelino de Figueiredo
Vamos enviar para os jornais portugueses a resposta às suas miseráveis calúnias. Se a publicarem, intimamo-lo a que nos responda! Se a não publicarem, devo adverti-lo de que não há maior ilusão do que pensar que sempre se negará em Portugal aos acusados o direito de defesa. Um dia há-de chegar em que a minha pena possa infligir-lhe nos principais jornais do país o castigo que merece. Serei implacável. Terá o direito de se defender por sua vez. Isso não impedirá que fique desfeito em lama.
O sr. (tão insignificante, mas ao mesmo tempo tão inconsciente) não faz a menor ideia das responsabilidades trágicas que acaba de assumir. Não é só pela calúnia que terá a responder. Será também pela destruição sistemática da nossa obra, já iniciada pela liquidação da tipografia. O seu ódio pessoal levou-o a tratar como inimigo a Biblioteca. Pagá-lo-á! Um dia saberá como a minha pena e as minhas mãos são duras quando têm a zurzir miseráveis da sua laia.
6 Março 1927
Raul Proença
In Raul Proença, O Caso da Biblioteca
(edição de Daniel Pires e José Carlos González)
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sábado, abril 22, 2006
Caracteres móveis #72 - Honoré de Balzac
O amor é como o mar, que visto superficialmente ou à pressa pode ser acusado de monotonia pelos espíritos vulgares, ao passo que certos seres privilegiados podem passar toda a vida a admirá-lo, encontrando-lhe sempre uma diversidade que os encanta.
A Vendetta
(tradução de Artur Soares Filho)
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Antologia Improvável #124 - António Ramos Rosa
Pátria não apenas símbolo mas substância
sempre verde em forte identidade
acorde ideal em nervos massacrados
música em surdina quando a fúria vulgar dos homens [levanta a voz obscena
Às vezes um vagabundo toca uma melodia numa guitarra [ou num búzio
ou um amolador num dia de outono à chuva
extrai três notas da sua pequena gaita
É então que a pátria canta anónima e esparsa
quando a vida é o ramerrão dos dias em que nada [acontece
Só nalguns se gera a consciência desta pátria
mas esses são virtualmente todos a virtualidade viva
e são eles que lançam as linhas ideais
que irão libertá-la da compressão tirânica
e dar-lhe o amplo espaço em que respire inteira
Pátria Soberana seguido de Nova Ficção
sempre verde em forte identidade
acorde ideal em nervos massacrados
música em surdina quando a fúria vulgar dos homens [levanta a voz obscena
Às vezes um vagabundo toca uma melodia numa guitarra [ou num búzio
ou um amolador num dia de outono à chuva
extrai três notas da sua pequena gaita
É então que a pátria canta anónima e esparsa
quando a vida é o ramerrão dos dias em que nada [acontece
Só nalguns se gera a consciência desta pátria
mas esses são virtualmente todos a virtualidade viva
e são eles que lançam as linhas ideais
que irão libertá-la da compressão tirânica
e dar-lhe o amplo espaço em que respire inteira
Pátria Soberana seguido de Nova Ficção
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sexta-feira, abril 21, 2006
quinta-feira, abril 20, 2006
Fiat 850 Coupé
Tanto a dizer sobre o Fiat Coupé, que seria virtualmente impossível e certamente fastidioso eu estar para aqui a desfiar as minhas memórias deste carro, o modelo que a minha Avó Zé teve entre 1967 e 1974... Lembro apenas que as linhas desportivas deste pequeno Fiat resultavam num tormento para os adultos que tinham o azar de ir no banco de trás: o design coupé fazia com que as suas cabeças ficassem literalmente encostadas ao vidro... Eu, miudíssimo ainda, pouco me importava com as reclamações dos crescidos e divertia-me a gozar aquelas linhas modernas verde-garrafa -- e a observar a prodigiosa falta de jeito da minha Avó Zé para estacionar...
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quarta-feira, abril 19, 2006
estampa XXXV
Max Ernst, Pequena Máquina Construída por Minimax Dadamax em Pessoa para Polinização Destemida de Chupadoras Femininas no Início da Menopausa e Tarefas Similarmente Destemidas
Fundação Solomon R. Guggenheim, Nova Iorque
Figuras de estilo #27 - Manuel Alegre
Os fantasmas tinham entrado no meu sono, invadido a minha casa no cimo da ternura; os fantasmas eram dono do País. E se eles viessem de repente, a meio da noite, e eu chamasse:
--Mãe!
a voz (tão calma) de minha mãe já nada poderia contra eles. Era um trabalho para mim, uma tarefa para todos aqueles que não podem suportar a sujeição. Eu nunca pude suportar a sujeição. Acaso poderia ter escolhido outro caminho?
Por isso, em Maio de 1963, eu estava na cadeia, isto é, de certo modo, eu estava no meu posto.
«Rosas Vermelhas»,
Praça da Canção
terça-feira, abril 18, 2006
Antologia Improvável #123 - Américo Durão
ARRAIAL
A AQUILINO RIBEIRO
Noite de S. João. Oiço os descantes
dum baile popular. Ao alto, a lua,
lindo balão, sobe no céu, flutua
sobre a cidade. Enlaçam-se os amantes
na volúpia da noite. Estralejantes,
cada foguete é uma espada nua,
risca no ar gestos de luz. A rua
é um bazar de anseios perturbantes.
Jovem, de branco, um marinheiro leva
pelo seu braço uma gentil pequena,
também de branco. E somem-se na treva...
Há bailes de bebés pelos terraços.
E eu volto a casa só, cheio de pena,
trazendo um sonho morto nos meus braços.
Tômbola
A AQUILINO RIBEIRO
Noite de S. João. Oiço os descantes
dum baile popular. Ao alto, a lua,
lindo balão, sobe no céu, flutua
sobre a cidade. Enlaçam-se os amantes
na volúpia da noite. Estralejantes,
cada foguete é uma espada nua,
risca no ar gestos de luz. A rua
é um bazar de anseios perturbantes.
Jovem, de branco, um marinheiro leva
pelo seu braço uma gentil pequena,
também de branco. E somem-se na treva...
Há bailes de bebés pelos terraços.
E eu volto a casa só, cheio de pena,
trazendo um sonho morto nos meus braços.
Tômbola
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Aquilino Ribeiro
segunda-feira, abril 17, 2006
Guincho
O sol põe-se
sobre o lento bater das ondas,
e despede-se
do meu corpo de areia.
Seis Composições Outonais
2001
sobre o lento bater das ondas,
e despede-se
do meu corpo de areia.
Seis Composições Outonais
2001
domingo, abril 16, 2006
Confissões do sapo
«[...] sabem o que é quando se quer brilhar na sociedade, fala-se, fala-se, acaba-se por dizer não importa o quê com medo de que alguém nos roube a palavra ou pior, que o silêncio se instale...
O Vento nos Salgueiros,
t. 4 - Confusão na Mansão
de Michel Plessix,
a partir da obra homónima
de Kenneth Grahame
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sábado, abril 15, 2006
Correspondências #41 - José Régio a seu sobrinho Ramiro
Diana-Bar da
Póvoa de Varzim, pela manhã
4/3/68
Ramiro:
Póvoa de Varzim, pela manhã
4/3/68
Ramiro:
Já recebi duas cartas tuas, pelo menos, -- a última de há quase um mês. Esta demora não significa que eu te esqueça! Bem pelo contrário, lembro-me constantemente de ti, de vós os três. Significa apenas que atravesso um período de grande trabalho, que a minha corespondência aumenta sempre, etc., etc. A minha casa editora resolveu que este ano seria «o ano de José Régio», e manda-me provas sobre provas de livros a reeditar. Como, nestas provas, me não limito a sublinhar as gralhas, pois sempre corrijo o texto, dá-me isso bastante que fazer. Também retomei colaborações jornalísticas; além de estar escrevendo o sexto volume de A Velha Casa e... vá lá uma novidade!: preparar um novo volume de versos! Supunha que já não publicaria mais livros de poesia; mas a experiência da doença, do sanatório, etc., acumulou no meu sub-consciente material que exige expressão mais ou menos poética. Enfim, o artista nem sempre faz o que quere: faz o que de momento pode, aproveita o que lhe vem. Como, portanto, escrevo agora bastante, não tenho desenhado nada. Os desenhos são, de certo modo, um substituto da literatura, um outro modo de expressão, quando a literatura se me torna esquiva. Também me faltas tu, à noite, com a tua calorosa curiosidade pelos desenhos que eu fizera... Não quer isto dizer que eu os deixasse de fazer: apenas estão à espera de novas ocasiões propícias.
Tens muita razão de, como sobrinho meu, te achares com direito (embora o não digas bem assim) a receber os meus livros. Vou, pois, começar a mandar-tos; aos poucos, e sobretudo os que foram ou vão sendo reeditados nas Obras Completas, pois as edições primeiras ou até simplesmente anteriores rareiam cada vez mais. Algumas até já atingem elevado preço! (1)
Comecei por falar de mim, e era de vós que eu tencionava começar por falar. Saboreei a breve mas viva evocação que fazes de vossa casa; (e o verbo saborear deve ter surgido aqui por uma subconsciente associação, pois me dizes que cheira a fritos, que a Fátima está fazendo fritos...). Também apreciei e agradeço a fotografia em que estás tu, ela, e o meu boneco na parede. Não se pode dizer que essa máscara faça uma companhia muito gentil, mas enfim... é uma lembrança do «ti Zé». Gosto de saber que estás contente, que vos sentis felizes. Ainda bem, oxalá que assim seja sempre! Claro que o casamento não é um perpétuo idílio (mesmo sem «pieguice») e até a Primavera é atravessada por nuvens e momentos sombrios. Não é de um dia para o outro que as pessoas verdadeiramente se conhecem. Mas também penso que a Fátima é boa rapariga, sei que tu não és mau rapaz, e um amor sólido que a intimidade irá confirmando acaba sempre por desfazer as nuvens... Também estou contente, em suma.
Agora umas notícias breves:
-- A «casa da madrinha Libânia», própriamente minha ao presente, está mais arrumada: Fiz nela uma espécie de exposição, embora provisória, de coisas a que depois darei um arrumo definitivo. Espero recomeçar as obras sem grande demora, e para as levar até cabo. Depois te falarei de isso.
-- «Os habitantes daquela Casa» devem ser estreados brevemente em Lisboa. Entretanto vai à Espanha a um festival de curtas metragens. Tem agradado bastante.
-- Recebi nova proposta para representação do Jacob e o Anjo, pela companhia que já no ano passado se propusera representá-lo. Fiz um grande esforço... e, embora nos mais lisonjeiros termos com que me foi possível dourar a amarga pílula, recusei autorização. Não me parece que essa Companhia e a sua casa de espectáculos reunissem as condições necessárias para um possível, mesmo relativo agrado junto do público. Principia por que o Rei, a Raínha, o Anjo-Bobo exigem certo aspecto físico (vejo-os em grande!) que não encontro nos actores da dita Companhia. Isto... sem falar no Talento necessário à interpretação desses difíceis papéis. O meu caso (das Três peças em Um Acto) é que parece que será representado em Lourenço Marques. Aqui está proibido, e lá não.
Bem, basta por hoje. Dá lembranças ao teu pai, e diz-lhe que gosto de o saber convivendo assim com a jovem família. Cá recebi, e gostosamente retribuo, os beijos da Fátima, e para ti o abraço do teu velho
Tio Zé
(1) Não seria razão para eu tas não mandar... se tivesse exemplares!
In Boletim, n.º 1, Centro de Estudos Regianos
(direcção de Eugénio Lisboa)
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José Régio
Antologia Improvável #122 - Afonso Duarte (2)
IDEIAS
Honra: Brio: Dignidade:
Onde estais? Quem vos preza?
--Não posso viver pobre. A frialdade
Que me dá toda a pobreza!
Lembram-me bichos, carochas, centopeias,
Musgo, paredes húmidas, bolores,
Ao pensar na pobreza! -- Ideias.
E causam-me suores.
In Líricas Portuguesas, vol. 2
(edição de Cabral do Nascimento)
Honra: Brio: Dignidade:
Onde estais? Quem vos preza?
--Não posso viver pobre. A frialdade
Que me dá toda a pobreza!
Lembram-me bichos, carochas, centopeias,
Musgo, paredes húmidas, bolores,
Ao pensar na pobreza! -- Ideias.
E causam-me suores.
In Líricas Portuguesas, vol. 2
(edição de Cabral do Nascimento)
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sexta-feira, abril 14, 2006
quinta-feira, abril 13, 2006
Em nome da decência
No próximo dia 19 de Abril, quarta-feira, assinalam-se os 500 anos de um massacre de quatro mil judeus portugueses em Lisboa. Associo-me ao apelo da Rua da Judiaria: nesse dia, quem puder vá ao Rossio e acenda uma vela em memória de todos e cada um desses supliciados. Eu preguiçoso me confesso, não sei se lá estarei, mas farei por isso, em nome da decência e da memória. Um país sem memória não é um país decente.
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quarta-feira, abril 12, 2006
Caracteres móveis #71 - Franz Kafka
Ninguém ouviu a porta fechar-se; fora, sem dúvida, deixada aberta, como é costume em casas onde acaba de ocorrer um grande infortúnio.
Metamorfose
(tradução de Breno Silveira)
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Franz Kafka
terça-feira, abril 11, 2006
Antologia Improvável #121 - Jorge de Lima
O ACENDEDOR DE LAMPIÕES
Lá vem o acendedor de lampiões da rua!
Este mesmo que vem imperturbavelmente
parodiar o Sol e associar-se à Lua
quando a sombra da noite enegrece o poente.
Um, dois, três lampiões e continua
outros mais a acender interminavelmente
à media que a noite aos poucos se acentua
e a palidez da lua apenas se pressente.
Triste ironia atroz que o senso humano irrita:
ele que doura a noite e ilumina a cidade
talvez não tenha luz na choupana em que habita.
Tanta gente também nos outros insinua:
crenças, religião, amor, felicidade,
como esse acendedor de lampiões da rua!
Novos Poemas
Lá vem o acendedor de lampiões da rua!
Este mesmo que vem imperturbavelmente
parodiar o Sol e associar-se à Lua
quando a sombra da noite enegrece o poente.
Um, dois, três lampiões e continua
outros mais a acender interminavelmente
à media que a noite aos poucos se acentua
e a palidez da lua apenas se pressente.
Triste ironia atroz que o senso humano irrita:
ele que doura a noite e ilumina a cidade
talvez não tenha luz na choupana em que habita.
Tanta gente também nos outros insinua:
crenças, religião, amor, felicidade,
como esse acendedor de lampiões da rua!
Novos Poemas
segunda-feira, abril 10, 2006
Dos meus mortos não fica a memória senão em mim e que em mim morrerá. Justiça do Tempo para os que alegadamente viram a vida passar? Alguns não deixaram rasto -- e toda a sua vida fez sentido.
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domingo, abril 09, 2006
Correspondências #40 - Armindo Monteiro a Salazar
Paris
Meu querido amigo:
Aqui cheguei depois de uma passagem na Bélgica verdadeiramente arrasadora -- mas consoladora. Estava eu habituado, no estrangeiro, a ver o meu país tratado sempre em «quantité négligeable» e a minha qualidade de português olhada com uma vaga ironia com que se olha para os siameses ou para os malgaches.
E tive agora a grande sensação de orgulho ao ouvir o nome de Portugal tratado com carinho e de ver o representante do seu governo respeitado, acolhido com simpatia: neste momento acabo de receber um telegrama da rainha da Bélgica, assinado «Elisabeth» simplesmente, antiprotocolar mas encantador, revelando, sob um pretexto banal, a maior simpatia e consideração pelo país.
Meu querido amigo: se não fosse a sua admirável actuação, o país não teria nunca chegado a esta altura. Não resisto a mandar-lhe daqui a expressão do meu entusiasmo pela sua obra e do meu comovido agradecimento. Todas as grandes homenagens de que vi cercado o meu país -- foi V. Ex.ª que as ganhou e mereceu. A minha acção pessoal ante grande triunfo foi pequena: e nenhum efeito teria se os anos de administração e trabalho que V. Ex.ª tem desenvolvido não existissem. É isto que eu não posso esquecer.
Hoje o marechal Lyautey oferece, em sua casa, um chá particular para nos apresentar aos seus amigos. Isto é significtaivo: ao fazer o convite disse-me: só para si e sua mulher, porque eu quero marcar bem, além da minha amizade pessoal, a minha grande simpatia pelo seu governo; por isso não quero a comitiva.
Amanhã, presido, com o marechal, a uma conferência de João de Almeida, na Sociedade de Geografia. Pensei que era interessante ficar estes dois dias ainda para estes efeitos, embora as autorizações de viagem se tenham acabado já. Mas isso é assunto que terá de ser regularizado depois.
Não posso contar-lhe aqui miudamente tudo o que aconteceu na Bélgica -- onde foram feitas declarações cheias de interesse para o país mas onde eu não passei de fórmulas banais de amizade -- mas verá que realmente os efeitos da sua política chegaram longe, quando lho contar. O ministro das Colónias belgas, no banquete oficial, levantou o seu copo pelo meu eminente Presidente do Conselho -- le Doctor Salazar.
Enfim -- pessoalmente estou arrasado e arruinado. Tenho de sofrer uma intervenção cirúrgica quando aí chegar -- já a devia ter sofrido, mas não tenho tido um minuto e isto exige três dias de cama, apesar de não ter importância. Mas tem-me feito passar maus bocados.
Um grande e afectuoso abraço, com todos os agradecimentos e homenagens do
Armindo Monteiro
Correspondência Política -- 1926-1955
(edição de Fernando Rosas, Júlia Leitão de Barros e Pedro de Oliveira)
sábado, abril 08, 2006
Antologia Improvável #120 - Carlos Nejar (2)
JUDAS ISCARIOTES
Desta árvore
a humanidade pende
calada.
Pende a teia
e sua lavra.
Pende a negra aranha
dos dinheiros.
Pende o beijo.
Pende o escárnio
a delecção
como um broto
esvaído no ramo.
Pende a vida
que escolhi
e está suspensa
entre os dias e mim.
E o amor perenemente
penso
neste recado a ti:
Também sou preso
na mesma cruz.
Mas não ressuscitei.
Os Viventes / Antologia Poética
(edição de António Osório)
Desta árvore
a humanidade pende
calada.
Pende a teia
e sua lavra.
Pende a negra aranha
dos dinheiros.
Pende o beijo.
Pende o escárnio
a delecção
como um broto
esvaído no ramo.
Pende a vida
que escolhi
e está suspensa
entre os dias e mim.
E o amor perenemente
penso
neste recado a ti:
Também sou preso
na mesma cruz.
Mas não ressuscitei.
Os Viventes / Antologia Poética
(edição de António Osório)
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sexta-feira, abril 07, 2006
Caracteres móveis #70 - Louis-Ferdinand Céline
Entrámos no covil e aquilo abarrotava de homens da guarda que até se fanicava, o cheirete metia-se nariz acima, de nem sabermos a quantas andávamos... A gente farejava de esguelha, tão forte e acre aquilo nos atingia... Ele era carne e mijo e dente podre e peido a tresandar que só visto, e à mistura um café triste e já arrefecido, e mais um gosto a caganitas e ainda por cima a qualquer coisa desagradável como rato morto em tudo quanto era sítio... De nos pôr os pulmões a bufar que nunca mais acabavam.
De Três em Pipa
(tradução de Aníbal Fernandes)
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Louis-Ferdinand Céline
quinta-feira, abril 06, 2006
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