segunda-feira, setembro 05, 2016

Ficar no Euro, para quê?

Fui um entusiasta do Euro, tal como me considero um europeísta. Sendo economicamente iletrado, e considerando sempre o primado da política, achei, ingenuamente, que com a moeda única entraríamos numa nova fase da integração europeia, cada vez mais confederal.
A realidade, porém, está a pôr em causa toda essa visão, mais ou menos idílica que perfilhei -- como, de resto, a própria ideia de União Europeia, que nunca esteve tão em crise como hoje se verifica, com todos os perigos e retrocessos inerentes.
O enunciar da questão política, em face do Euro, é simples, na sua complexidade extrema... Como diz Stiglitz, e como o disseram João Ferreira do Amaral e outros, desde o início, Portugal não tem economia para sobreviver num contexto de  Europa alemã. Ora esta existe e exerce-se porque a Alemanha e satélites impõem esta política económica, independentemente -- tem-no demonstrado -- dos cataclismos políticos que origina por essa Europa fora.
Se a nossa economia está "condenada" dentro do Euro, e se a potência económica hegemónica na UE não quer cuidar do que na UE se está a desmoronar, ficar no Euro, para quê?... Para estagnarmos economicamente, sem instrumentos essenciais para inflectir o caminho de degradação? E em nome de quê? Da política europeia que é, na verdade, uma política alemã ciosa dos seus bons resultados? A não ser que queiramos ser uma população exportadora de cérebros, formados, aqui; subsidiados mais ou menos vegetantes; empregados de mesa, servindo, com profissionalismo, os reformados da Europa do norte.

P.S. - Não quero dizer que a União Europeia não seja algo por que valha a pena lutar -- e muito. Mas, infelizmente, os seus dirigentes já deram mais do que prova de ausência de reacção (ou reacção desrazoável e/ou timorata), que, oxalá me engane, será fatal: Grécia, refugiados de guerra, derivas xenófobas e racistas em países da Europa Central.
Quem poderá ainda acreditar nisto?... 

6 comentários:

Jaime Santos disse...

Sempre achei que a última coisa a fazer numa união política e económica seria a criação de uma moeda comum. De outro modo, acontece o que aconteceu, ficamos com uma moeda forte que esmaga o crescimento tornando os nossos produtos pouco competitivos ao mesmo tempo que promove o endividamento fácil. Sucede que a questão não é se devemos ou não permanecer no Euro, mas como sair dele. Quem defende uma saída desordenada e em rotura com a UE não sabe do que fala (ou então sabe, mas não se assume). Porque isso provocaria a falência de todos os nossos bancos e de uma boa parte das nossas empresas, com dívidas que permaneceriam em Euros. Só um néscio defenderia isto, ou então alguém que olhe para a ocasião como oportunidade para estatizar a nossa Economia. Ora, se é para isto, não contem comigo porque não quero que Portugal acabe como a Venezuela (e sem o petróleo). Se se trata de um divórcio amigável, é algo que não está nas nossas mãos e que dependerá de desenvolvimentos políticos em França e na Alemanha, sobretudo. Resta aguardar e aguentar. Por isso, não sei bem de que Steglich fala, por muito respeito que tenha por ele. Todas as dissoluções de zonas monetárias ou mesmo do fim de 'currency pegs' foram acompanhadas no passado de alta inflação ou mesmo hiper-inflação. Que a Esquerda não se esqueça de uma coisa. A atual coligação de Poder tornou-se possível graças aos votos da classe média e do seu protesto pela perda de rendimentos. Se lhe derem cabo das poupanças, a Direita pode voltar em força com uma maioria constitucional, e nessa altura teremos saudade do tandem Passos+Portas em versão 2011-2015...

Ricardo António Alves disse...

Eu creio que os argumentos são os mesmo do Ferreira do Amaral. Acho que só o MRPP quer uma ruptura unilateral. Mas o nó do problema será sempre político, seja coma dissolução da UE, seja com a nossa excreção, espera-se que sem grande estrépito. De qualquer forma, nunca vai depende de nós ou dos gregos, creio.

Jaime Santos disse...

Pois não, não vai. Conviria que estivéssemos minimamente preparados, porque pode acontecer, mas como de costume, o PCP e o Bloco parecem que querem deixar o ónus ao PS de fazer essa preparação, enquanto continuam com as fanfarronadas do costume. É o que dá não existir tecnocracia nesses partidos. No BE nunca houve (Louçã é um excelente economista e pensador, mas é mais um ideólogo do que outra coisa), no PCP ela não existe desde da saída de pessoas como Vital Moreira, Gomes Canotilho e o saudoso Barros Moura, quando estes perceberam que o Marxismo-Leninismo deveria há muito ter sido atirado para o caixote do lixo da História... Costa tem toda a razão e até o Pedro Nuno Santos já afina pela língua-de-pau europeísta. Há que calar e esperar que se possam pelo menos estender os prazos de pagamento dos empréstimos, enquanto se reforça a banca (o principal calcanhar de Aquiles dos gregos no ano passado e que muito facilitou o garrote europeu). Como dizia o Guardian em relação à Grécia, vamos ficar na prisão por dívidas por vários anos, pelo menos, convinha que aproveitássemos para resolver problemas críticos, a começar pelo da banca...

Ricardo António Alves disse...

Acho que está a ser injusto para o PC, pois é o que, desde que estoirou a crise, vem falando na necessidade de nos prepararmos para essa possibilidade.

Jaime Santos disse...

Não acho que esteja a ser injusto, o que o PCP diz é trivial e deve estar na cabeça de muitos socialistas, só que não podem admiti-lo (pelo medo de uma self-fulfilling profecy). Mas um Partido que defende abertamente que a saída do Euro não é apenas provável como é desejável, deveria apresentar mais do que generalidades. Porque das duas uma, ou não tem qualquer plano de contingência ou tem e está a escondê-lo, o que é pior ainda (o que duvido, pela razão apontada acima, falta de quadros). Se há Partido que tem condições políticas para alertar para os percalços que aí vêm é o PCP, mas duvido que deseje avisar o eleitorado sobre essas dificuldades. Claro que teremos austeridade por muitos e bons anos, com ou sem Euro, porque haverá sempre condições a cumprir em caso de renegociação de dívida e saída do Euro. De Grauwe já avisou que mesmo que os mercados 'perdoem' um default (parcial) a Portugal, os primeiros dois anos serão terríveis. Está a ver o PCP a dizer isto preto no branco ao eleitorado?

Ricardo António Alves disse...

Não estou, e ainda menos os outros. Mas como não vai depender de nós...
De qualquer modo, o PC foi sempre contra, primeiro pelas más razões, agora porque a realidade parece não dar grande margem...