[...]
Cuydado faz nam dormyr,
cuydado faz nam comer,
cuydado faz nunca rryr,
cuydado emfamdyçer,
cuydado nam ter prazer.
Cuydado da myl payxões,
cuydado da myl cuydados:
cuydado myl corações,
cuydado myl namorados
tem feyto defefperados.
[...]
O Cuydar, & Sospirar,
Cancioneiro Geral de Garcia de Resende
quinta-feira, setembro 30, 2010
quarta-feira, setembro 29, 2010
caderninho
A mesma agudeza de espírito que nos leva a escrever coisas boas, leva-nos a recear que elas não sejam boas bastante para merecer serem lidas. La Bruyère, Os Caracteres
terça-feira, setembro 28, 2010
segunda-feira, setembro 27, 2010
os predestinados
No Público, uma foto impressionante de colonos israelitas, mulheres, na maior parte, exultando pelo fim da moratória de dez meses para a construção de novas casas nos territórios ocupados.
Neste grupo de predestinados, vejo os carrascos de si próprios, no fanatismo que lhes está intrínseco, a semente da sua condenação -- deles ou dos descendentes directos. Não é possível viver à custa da humilhação e do menosprezo dos outros -- neste caso, dos palestinianos --, em nome de um direito divino, bíblico, milenar a um território, que entretanto se tornou, desde há séculos, pátria de outro povo.
É uma pena que o Israel liberal e progressista, o Israel libertário do kibutz das origens, recue em face da peste religiosa que o assola e se vai espalhando pelo mundo.
Neste grupo de predestinados, vejo os carrascos de si próprios, no fanatismo que lhes está intrínseco, a semente da sua condenação -- deles ou dos descendentes directos. Não é possível viver à custa da humilhação e do menosprezo dos outros -- neste caso, dos palestinianos --, em nome de um direito divino, bíblico, milenar a um território, que entretanto se tornou, desde há séculos, pátria de outro povo.
É uma pena que o Israel liberal e progressista, o Israel libertário do kibutz das origens, recue em face da peste religiosa que o assola e se vai espalhando pelo mundo.
A consequência disto será a guerra, a deportação, o massacre -- não dos árabes da Palestina, que de há muito têm a sua conta, mas dos judeus de Israel. É uma questão de tempo, se a última oportunidade para a paz, que é a negociação em curso, for desperdiçada.
domingo, setembro 26, 2010
sábado, setembro 25, 2010
sexta-feira, setembro 24, 2010
Antologia Improvável #451 - Cecília Meireles (8)
MÁQUINA BREVE
O pequeno vaga-lume
com sua verde lanterna
que passava pela sombra
inquietando a flor e a treva
-- meteoro da noite, humilde,
dos horizontes da relva;
o pequeno vaga-lume,
queimada a sua lanterna,
jaz carbonizado e triste
e qualquer brisa o carrega:
mortalha de exíguas franjas
que foi seu corpo de festa.
Parecia uma esmeralda
e é um ponto negro na pedra.
Foi luz alada, pequena
estrela em rápida seta.
Quebrou-se a máquina breve
na precipitada queda.
E o maior sábio do mundo
sabe que não a conserta.
Antologia Poética
O pequeno vaga-lume
com sua verde lanterna
que passava pela sombra
inquietando a flor e a treva
-- meteoro da noite, humilde,
dos horizontes da relva;
o pequeno vaga-lume,
queimada a sua lanterna,
jaz carbonizado e triste
e qualquer brisa o carrega:
mortalha de exíguas franjas
que foi seu corpo de festa.
Parecia uma esmeralda
e é um ponto negro na pedra.
Foi luz alada, pequena
estrela em rápida seta.
Quebrou-se a máquina breve
na precipitada queda.
E o maior sábio do mundo
sabe que não a conserta.
Antologia Poética
Bernard Prince regressa! E com ele vêm também Barney Jordan e Djinn. Desenhos do incomparável Hermann, argumento também dele, e não já do maravilhoso Greg (Bernard Prince, Comanche, Bruno Brazil, Achille Tallon, Zig e Puce, etc., etc.), mas do filho do primeiro, Yves H. Lido aqui |
quinta-feira, setembro 23, 2010
JornaL
O poema é uma alquimia em que a dor vira prazer estético.
Ferreira Gullar, entrevista a Maria Leonor Nunes, no JL de ontem.
A grandeza não teme a grandeza alheia: só a mediocridade e a inveja.
João Bigotte Chorão, a propósito de Malraux e Bernanos, ibidem.
quarta-feira, setembro 22, 2010
terça-feira, setembro 21, 2010
figuras de estilo
Cinquenta anos a clamar aos homens que se conhecessem a si próprios, para, ironia trágica, eu mesmo por fim consciencializar que o fundo da alma é tão deveras pantanoso e tão abismal que apenas por gracejo alguém pode dizer a si próprio que se conhece.
Miguel Real, Carta de Sócrates a Alcibíades, seu vergonhoso amante
caracteres móveis
[...] se cairmos sinceramente em nós, quem ousará dizer: "Sou melhor do que este homem?" É preciso muito orgulho e muito pouca imaginação para se julgar outrem. Como se pode avaliar as tentações que um homem pode ter sofrido.
Simone de Beauvoir, O Existencialismo e a Sabedoria das Nações
segunda-feira, setembro 20, 2010
caracteres móveis
«A democracia liberal não é agnóstica quanto às concepções do bem.» Francisco Sarsfield Cabral, «Os limites da tolerância», no Público de hoje.
domingo, setembro 19, 2010
sábado, setembro 18, 2010
sexta-feira, setembro 17, 2010
Antologia Improvável #450 - Pedro Tamen (2)
HERZOG
Sofrer é outro mau hábito.
(palavras de Ramona em Herzog, de Saul Bellow)
A minha desforra são palavras.
Levanto-me de manhã amarrotado
pelo peso inclemente das mentiras
e vazo no real outro real
das letras que ninguém vislumbrará.
O pássaro que canta é uma palavra,
é uma carta escrita a este, àquele,
que me saiu do lápis da amargura;
tudo se refaria se jamais feita fosse
alguma coisa que minha mão não desse.
Desforro-me sem gosto. Desforro-me sem gasto,
acorrentado ao que me vem de trás
e ao que virá e que não sei se quero.
Analogia e Dedos
quinta-feira, setembro 16, 2010
quarta-feira, setembro 15, 2010
figuras de estilo
figuras de estilo
Os filhos dos outros tinham direito de escola. Ele não, não era filho. O serviço arrancava-o cedo da cama e devolvia-o ao sono quando dentro dele já não havia resto de infância.
Mia Couto, «O dia em que explodiu Mabata-bata», Vozes Anoitecidas
terça-feira, setembro 14, 2010
segunda-feira, setembro 13, 2010
domingo, setembro 12, 2010
sábado, setembro 11, 2010
caderninho
Os ricos detestam-se talvez uns aos outros. Mas os pobres tratam-se uns aos outros como cães. José Bacelar
Revisão 2 -- Anotações à Margem da Vida Quotidiana
sexta-feira, setembro 10, 2010
quinta-feira, setembro 09, 2010
Antologia Improvável #449 - Alda do Espírito Santo
LÁ NO ÁGUA GRANDE
Lá no «Água Grande» a caminho da roça
negritas batem que batem co'a roupa na pedra.
Batem e cantam modinhas da terra.
Cantam e riem em riso de mofa
história contadas, arrastadas pelo vento.
Riem alto de rijo, com a roupa na pedra
e põem de branco a roupa lavada.
As crianças brincam e a água canta.
Brincam na água felizes...
Velam no capim um negrito pequenino.
E os gemidos cantados das negritas lá do rio
ficam mudos lá na hora do regresso...
Jazem quedos no regresso para a roça.
in No Reino de Caliban II
(edição de Manuel Ferreira)
figuras de estilo
quarta-feira, setembro 08, 2010
terça-feira, setembro 07, 2010
segunda-feira, setembro 06, 2010
domingo, setembro 05, 2010
caracteres móveis
sábado, setembro 04, 2010
Casa Pia: 2 ou 3 coisas
1. A perversidade da natureza humana não tem limites. Isto aplica-se aos arguidos (a alguns deles, pelo menos) como às vítimas (algumas delas, pelo menos).
2. O que me diz a intuição:
2.1. As duas vítimas que deram a cara, parecem-me credíveis. Desconheço o seu depoimento em concreto.
2.2. Carlos Cruz: não tenho opinião. Homem de comunicação, referiu-se muito bem às alegadas fragilidades do processo. É um ponto forte na luta pela sua credibilização.
2.3. Ricardo Sá Fernandes: tenho muita consideração por ele. É um grande defensor. A sua indignação parece-me genuína.
2.4. Os outros arguidos: à excepção de Hugo Marçal, que me faz pena, os restantes não me despertam a mínima simpatia -- o que me é irrelevante para saber se sim ou sopas.
2.5. Os funcionários judiciais, vulgo magistrados, desde o início do processo: nem tenho palavras.
3. E de repente havia um partido de pedófilos em Portugal: o PS, que por acaso tinha um esplêndido líder, Ferro Rodrigues, o mais à esquerda que conheceu. Foram bem sucedidos na decapitação.
Se, depois da palhaçada monumental que foi a tentativa de incriminação da cúpula do PS, isto é para levar a sério, vou a li e já venho.
Vá, agora quero os outros nomes, os nomezinhos dos que (também) andaram a abusar das crianças desfavorecidas da Casa Pia como quem se serve de lixo.
Ah, e as provas dos culpados têm de ser inequívocas, pois mais vale deixar um culpado à solta que prender um inocente.
caderninho
sexta-feira, setembro 03, 2010
quinta-feira, setembro 02, 2010
quarta-feira, setembro 01, 2010
Antologia Improvável #448 - Cecília Meireles (7)
ADOLESCENTE
As solas dos teus pés.
As solas dos teus pés pintadas de vermelho.
De teus pés correndo no verde chão do parque.
As solas dos teus pés brilhando e desaparecendo
sob a orla dourada da seda azul.
(A moça brincava sozinha,
bailava assim, por entre as árvores...)
As campainhas dos tornozelos, pingos d'água
sobre as flores dos teus pés pintados de vermelho.
As solas dos teus pés, pintadas de vermelho,
duas pétalas no tempo.
Duas pétalas rolando para o fim do mundo, ah!
Abaixavam-se, levantavam-se
as solas dos teus pés, pintadas de vermelho.
E no parque os pavões, também vestidos de sol e céu,
clamavam para os horizontes seus anúncios,
transcendentes e tristes.
As solas dos teus pés correndo para longe,
duas pequenas labaredas.
(A moça brincava sozinha,
ia e vinha assim, com o ar, com a luz...)
Os teus pequenos pés.
O parque.
O mundo.
A solidão.
Poemas Escritos na Índia / Antologia Poética
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