Guimarães & C.ª Editores, Lisboa, s. d.
quarta-feira, abril 30, 2008
caderninho
O poeta representa a imaginação por meio de imagens da vida e das situações e personagens humanos, põe-nas em movimento e deixa a cargo do leitor a tarefa de permitir que essas imagens ocupem os seus pensamentos, na medida em que os seus poderes mentais lho permitem. Por isso é capaz de dotar os homens das mais diversas capacidades, quer se trate de tolos, quer de sábios. O filósofo, por outro lado, representa não a vida em si mesma mas os pensamentos acabados que dela abstraiu e exige ao leitor que pense precisamente como ele e precisamente tanto como ele. Por isso o seu público é tão pequeno. O poeta poderá, desta forma, ser comparado a alguém que oferece flores; o filósofo com alguém que oferece a essência delas. Arthur Schopenhauer
«Aforismos», de Parerga e Paralipomena (tradução de Alexandra Tavares)
terça-feira, abril 29, 2008
Antologia Improvável #303 - Maria Teresa Horta (4)
segunda-feira, abril 28, 2008
Caracteres móveis - Lev Tolstói
domingo, abril 27, 2008
sábado, abril 26, 2008
caderninho
Há uma espécie de indulgência que é a indulgência do desinteresse. Uma indulgência mil vezes nefasta -- porque igualiza tudo e todos. José Bacelar
Revisão 2 -- Anotações à Margem da Vida Quotidiana
sexta-feira, abril 25, 2008
Antologia Improvável #302 - Carlos Nejar (5)
RESTRIÇÕES
Uma parte de minha liberdade
bicada pelos pássaros,
e outra, na vidraça,
foi levada pela chuva.
Alguma parte dela
abandonei na rua
e outra o amor a consumiu
fazendo sua.
Outra o Estado a sorveu,
gota por gota,
por ser eu cidadão
tendo em conta leis,
pendões, brasões.
E o mais não sei.
Alguma réstia dela, alguma grei
dei aos pobres
por modéstia cristã,
que eles mastigarão
os ossos da solidão.
E outra esqueci entre as páginas
de um livro
com as borboletas de arquivo.
Que me fica da liberdade?
Como vou defendê-la em mim
se nenhum bocado me respira
ou busca cidadela na colina?
Defenderei então
a possibilidade,
as verbenas
que no seu lugar nascem
ou, quem sabe,
terei a humildade
para recolhê-la
de colmeia em colmeia.
Defenderei
alguma sobra dela,
a memória,
a vestidura,
a sela.
Defenderei os corolários,
o teorema de Pitágoras,
qualquer ideia
que a faça retornar,
embora velha.
Para ela
sempre haverá espera,
arreios e bala.
O Poço do Calabouço / Antologia Poética
(edição de António Osório)
quinta-feira, abril 24, 2008
Caracteres móveis - Thomas Mann
Lembrou-se da impressão que fizera sobre ele a catástrofe do ano de 1866, e chamou à memória as sensações indizivelmente tormentosas que então o haviam empolgado. Perdera grande quantidade de dinheiro... ah, isso não fora o mais insuportável! Mas pela primeira vez tivera de experimentar em toda a sua extensão e no próprio corpo, a brutalidade cruel da vida comercial, onde todos os sentimentos bondosos, suaves e amáveis desaparecem perante o único instinto rude, cru e impiedoso da conservação e onde uma desgraça sofrida não provoca participação e compaixão entre os amigos, os mais íntimos amigos, mas sim desconfiança, apenas desconfiança fria e negativa. E ele não o sabia? Que direito tinha de admirar-se destas coisas? Mais tarde, em horas melhores, de maior energia, quanto não se envergonhara de, naquelas noites de insónia, se haver revoltado, rebelando-se, cheio de nojo, e mortalmente ferido, contra a dureza feia e descarada da vida!
Os Buddenbrook
(tradução de Herbért Caro)
retrato por Johannes Lindner
quarta-feira, abril 23, 2008
segunda-feira, abril 21, 2008
caderninho
domingo, abril 20, 2008
Antologia Improvável #301 - Alexandre O'Neill (7)
O TEU NOME
Flor de acaso ou ave deslumbrante,
Palavra tremendo nas redes da poesia,
O teu nome, como o destino, chega,
O teu nome, meu amor, o teu nome nascendo
De todas as cores do dia!
No Reino da Dinamarca / Poesias Completas
Flor de acaso ou ave deslumbrante,
Palavra tremendo nas redes da poesia,
O teu nome, como o destino, chega,
O teu nome, meu amor, o teu nome nascendo
De todas as cores do dia!
No Reino da Dinamarca / Poesias Completas
sábado, abril 19, 2008
sexta-feira, abril 18, 2008
Figuras de estilo - Raul Brandão
quinta-feira, abril 17, 2008
caderninho
Antologia Improvável - 300 poemas
Os Poetas:
António Graça de Abreu, Casimiro de Abreu, Paulo Abrunhosa, José Afonso, Sebastião Alba, Manuel Alegre (2), Ed. Bramão de Almeida (3), Adalberto Alves, Pedro Alvim, Ana Luísa Amaral (4), Fernando Pinto do Amaral, Carlos Drummond de Andrade, Eugénio de Andrade (3), Sophia de Mello Breyner Andresen (4), António Lobo Antunes, Mário Avelar (2), Manuel Bandeira, José Agostinho Baptista (2), António Barahona (4), Frederico Barbosa, João de Barros (7), Ruy Ferreira Bastos, Ruy Belo (4), Edmundo de Bettencourt, Rebelo de Bettencourt (2), Olavo Bilac, Manuel Maria Barbosa du Bocage, António Botto (4), Rosa Alice Branco, Fiama Hasse Pais Brandão (2), Francisco Bugalho, Fernando Cabrita, João Camilo, Luís de Camões (2), Álvaro de Campos, João Candeias, Luís Cardim, Luís Adriano Carlos, Papiniano Carlos, Armando Silva Carvalho, Gil Nozes de Carvalho, Afonso de Castro (2), Eugénio de Castro (3), Fernanda de Castro (2), Lourdes Borges de Castro, Catulo da Paixão Cearense, Mário Cesariny, Rui Coias, Levi Condinho, Alexandre de Córdova, Raimundo Correia, Cristino Cortes, Armando Cortes-Rodrigues, António Carlos Cortez, Francisco Alves da Costa, Francisco Costa (3), paulo da costa, Rui Costa, José Craveirinha (4), Luís Filipe Cristóvão, Frei Agostinho da Cruz, Júlio Dantas (2), Saul Dias (5), Mário Dionísio, Afonso Duarte (2), Américo Durão, José Emílio-Nelson (3), Florbela Espanca (3), Fernando Jorge Fabião (3), Leonel Fabião, José Fernandes Fafe, Admário Ferreira (3), José Gomes Ferreira, Jaime Ferreri, Campos de Figueiredo, Martins Fontes (3), José do Carmo Francisco (2), Natércia Freire, Manuel de Freitas (4), Sebastião da Gama (2), António Gedeão, Sérgio Godinho, Tiago Gomes, José Carlos González, Manuel Gusmão, Fernando Grade (2), Teresa Guedes, Cândido Guerreiro, António Pinheiro Guimarães, Delfim Guimarães, Fernando Guimarães, Alfredo Guisado, Ana Hatherly (2), Maria Teresa Horta (3), João Miguel Fernandes Jorge (2), Fausto José, Nuno Júdice, Tomaz Kim, Rui Knopfli (4), Alberto de Lacerda (6), Rui Lage, Manuel Laranjeira, Ângelo de Lima, Jorge de Lima, Teresa Rita Lopes, Pedro Ludgero, valter hugo mãe, Olegário Mariano, José-Alberto Marques, Carlos Matias, Mário Máximo, Pedro Homem de Mello, João Cabral de Melo Neto, Augusto Oliveira Mendes, José Tolentino Mendonça (4), João Pedro Mésseder (2), Isabel Meyrelles (3), Joseia de Matos Mira, Jorge Gomes Miranda (2), Sá de Miranda, Luís de Montalvor, Adolfo Casais Monteiro, João Paulo Monteiro (Ângelo Novo), Vinicius de Moraes, Joaquim Gomes Mota, Vasco Graça Moura (2), David Mourão-Ferreira (3), Sidónio Muralha, Carlos Nejar (4), Vitorino Nemésio, Agostinho Neto, Leonel Neves, Moreira das Neves, Carlos de Oliveira (8), José Alberto Oliveira (2), Alexandre O'Neill (6), Fernando Assis Pacheco (2), António Patrício, Luís Brito Pedroso, José Luís Peixoto, Miguel Serras Pereira, António Quadros, Carlos Queirós, Antero de Quental, Luís Quintais, Nuno Rebelo, José Régio, Jorge Reis-Sá, Jaime Rocha, Armindo Rodrigues (2), Daniel Maia-Pinto Rodrigues (2), Fernando Tavares Rodrigues, António Ramos Rosa (4), Isabel de Sá (4), Eduardo Salgueiro (2), José Carlos Ary dos Santos (3), Olga Savary, Artur do Cruzeiro Seixas (2), Jorge de Sena (5), Alberto de Serpa, Joaquim Manuel Pinto Serra, Maria Augusta Silva, Ana Maria Soares (2), António de Sousa, Pedro Tamen, José Correia Tavares, José Rui Teixeira (2), Paulo Teixeira, Nicolau Tolentino, Miguel Torga, Alexandre Pinheiro Torres, José Manuel Travado, J. O. Travanca-Rêgo, André Varga, José Veiga, Francisco José Viegas, Vergílio Alberto Vieira, Virgínia Vitorino (2), Duarte de Viveiros, Eno Theodoro Wanke.
António Graça de Abreu, Casimiro de Abreu, Paulo Abrunhosa, José Afonso, Sebastião Alba, Manuel Alegre (2), Ed. Bramão de Almeida (3), Adalberto Alves, Pedro Alvim, Ana Luísa Amaral (4), Fernando Pinto do Amaral, Carlos Drummond de Andrade, Eugénio de Andrade (3), Sophia de Mello Breyner Andresen (4), António Lobo Antunes, Mário Avelar (2), Manuel Bandeira, José Agostinho Baptista (2), António Barahona (4), Frederico Barbosa, João de Barros (7), Ruy Ferreira Bastos, Ruy Belo (4), Edmundo de Bettencourt, Rebelo de Bettencourt (2), Olavo Bilac, Manuel Maria Barbosa du Bocage, António Botto (4), Rosa Alice Branco, Fiama Hasse Pais Brandão (2), Francisco Bugalho, Fernando Cabrita, João Camilo, Luís de Camões (2), Álvaro de Campos, João Candeias, Luís Cardim, Luís Adriano Carlos, Papiniano Carlos, Armando Silva Carvalho, Gil Nozes de Carvalho, Afonso de Castro (2), Eugénio de Castro (3), Fernanda de Castro (2), Lourdes Borges de Castro, Catulo da Paixão Cearense, Mário Cesariny, Rui Coias, Levi Condinho, Alexandre de Córdova, Raimundo Correia, Cristino Cortes, Armando Cortes-Rodrigues, António Carlos Cortez, Francisco Alves da Costa, Francisco Costa (3), paulo da costa, Rui Costa, José Craveirinha (4), Luís Filipe Cristóvão, Frei Agostinho da Cruz, Júlio Dantas (2), Saul Dias (5), Mário Dionísio, Afonso Duarte (2), Américo Durão, José Emílio-Nelson (3), Florbela Espanca (3), Fernando Jorge Fabião (3), Leonel Fabião, José Fernandes Fafe, Admário Ferreira (3), José Gomes Ferreira, Jaime Ferreri, Campos de Figueiredo, Martins Fontes (3), José do Carmo Francisco (2), Natércia Freire, Manuel de Freitas (4), Sebastião da Gama (2), António Gedeão, Sérgio Godinho, Tiago Gomes, José Carlos González, Manuel Gusmão, Fernando Grade (2), Teresa Guedes, Cândido Guerreiro, António Pinheiro Guimarães, Delfim Guimarães, Fernando Guimarães, Alfredo Guisado, Ana Hatherly (2), Maria Teresa Horta (3), João Miguel Fernandes Jorge (2), Fausto José, Nuno Júdice, Tomaz Kim, Rui Knopfli (4), Alberto de Lacerda (6), Rui Lage, Manuel Laranjeira, Ângelo de Lima, Jorge de Lima, Teresa Rita Lopes, Pedro Ludgero, valter hugo mãe, Olegário Mariano, José-Alberto Marques, Carlos Matias, Mário Máximo, Pedro Homem de Mello, João Cabral de Melo Neto, Augusto Oliveira Mendes, José Tolentino Mendonça (4), João Pedro Mésseder (2), Isabel Meyrelles (3), Joseia de Matos Mira, Jorge Gomes Miranda (2), Sá de Miranda, Luís de Montalvor, Adolfo Casais Monteiro, João Paulo Monteiro (Ângelo Novo), Vinicius de Moraes, Joaquim Gomes Mota, Vasco Graça Moura (2), David Mourão-Ferreira (3), Sidónio Muralha, Carlos Nejar (4), Vitorino Nemésio, Agostinho Neto, Leonel Neves, Moreira das Neves, Carlos de Oliveira (8), José Alberto Oliveira (2), Alexandre O'Neill (6), Fernando Assis Pacheco (2), António Patrício, Luís Brito Pedroso, José Luís Peixoto, Miguel Serras Pereira, António Quadros, Carlos Queirós, Antero de Quental, Luís Quintais, Nuno Rebelo, José Régio, Jorge Reis-Sá, Jaime Rocha, Armindo Rodrigues (2), Daniel Maia-Pinto Rodrigues (2), Fernando Tavares Rodrigues, António Ramos Rosa (4), Isabel de Sá (4), Eduardo Salgueiro (2), José Carlos Ary dos Santos (3), Olga Savary, Artur do Cruzeiro Seixas (2), Jorge de Sena (5), Alberto de Serpa, Joaquim Manuel Pinto Serra, Maria Augusta Silva, Ana Maria Soares (2), António de Sousa, Pedro Tamen, José Correia Tavares, José Rui Teixeira (2), Paulo Teixeira, Nicolau Tolentino, Miguel Torga, Alexandre Pinheiro Torres, José Manuel Travado, J. O. Travanca-Rêgo, André Varga, José Veiga, Francisco José Viegas, Vergílio Alberto Vieira, Virgínia Vitorino (2), Duarte de Viveiros, Eno Theodoro Wanke.
quarta-feira, abril 16, 2008
Antologia Improvável #300 - Fernando Assis Pacheco (2)
MAS AGORA QUE VAI DESCER A NOITE NA MINHA VIDA
Triste de mim mais triste que a tristeza
triste como a mão que segura o copo
como a luz do farol esgarçando a névoa
triste como o cão manco
deixado na serra pelos caçadores
triste como a sopa entretanto azeda
mais triste que a idiotia congénita
ou que a palavra ampola
triste de mim triste e perdido
entre duas ruas
uma que vai para o Norte outra para o Sul
e ambas cortadas aos peões
que não cooperam devidamente
(com este governo de merda é claro)
triste como uma puta alentejana
num bar de Ourense
que me viu à cerveja e lesta
me chamou compadre
vozes que a gente colecciona
a tarde triste os anos tristes
a grande costura da tristeza
do esterno ao baixo ventre
triste e já sem nenhum reparo
a fazer à metafísica
senão que é um défice
porventura
do córtex cerebral
Triste de mim mais triste que a tristeza
triste como a mão que segura o copo
como a luz do farol esgarçando a névoa
triste como o cão manco
deixado na serra pelos caçadores
triste como a sopa entretanto azeda
mais triste que a idiotia congénita
ou que a palavra ampola
triste de mim triste e perdido
entre duas ruas
uma que vai para o Norte outra para o Sul
e ambas cortadas aos peões
que não cooperam devidamente
(com este governo de merda é claro)
triste como uma puta alentejana
num bar de Ourense
que me viu à cerveja e lesta
me chamou compadre
vozes que a gente colecciona
a tarde triste os anos tristes
a grande costura da tristeza
do esterno ao baixo ventre
triste e já sem nenhum reparo
a fazer à metafísica
senão que é um défice
porventura
do córtex cerebral
Lisboa
3/18-VII-91, 20/21-XI-91, 22-I-92
Respiração Assistida
(foto: Luísa Ferreira)
terça-feira, abril 15, 2008
Caracteres móveis - Graham Greene
domingo, abril 13, 2008
sábado, abril 12, 2008
Antologia Improvável #299 - Ed. Bramão de Almeida (3)
O "TIO VICENTE"
O «tio Vicente» colocou a albarda
No burro e lá vão ambos, praça em praça;
Ele vergando ao peso da desgraça,
E o burro ao da nabiça e da lombarda.
Igual destino o burro e o dono aguarda
Como se fossem ambos de igual raça;
Os trabalhos que um sofre o outro passa
Desde que rompe o dia a hora tarda.
As mesmas horas em dormir consomem,
Bate-os o mesmo sol, o mesmo vento,
Com ânsia igual, às mesmas horas comem...
Meu Deus! Talvez eu erre o pensamento;
Mas do que vale a um triste nascer homem,
Se leva vida igual à dum jumento?
Sonetos
O «tio Vicente» colocou a albarda
No burro e lá vão ambos, praça em praça;
Ele vergando ao peso da desgraça,
E o burro ao da nabiça e da lombarda.
Igual destino o burro e o dono aguarda
Como se fossem ambos de igual raça;
Os trabalhos que um sofre o outro passa
Desde que rompe o dia a hora tarda.
As mesmas horas em dormir consomem,
Bate-os o mesmo sol, o mesmo vento,
Com ânsia igual, às mesmas horas comem...
Meu Deus! Talvez eu erre o pensamento;
Mas do que vale a um triste nascer homem,
Se leva vida igual à dum jumento?
Sonetos
sexta-feira, abril 11, 2008
Figuras de estilo - Vergílio Ferreira
É bela uma noite de Inverno, muito certa, muito nítida. Venho à janela ver as estrelas, os campos escuros sem um ruído. Bom: então acho extraordinário que eu esteja vivo. E sinto-me bem eu. Mas não me sinto eu sozinho. Outras partes de mim estão em outro lado e são os filhos que dormem, ou os trabalhadores com quem falei, ou a terra que ajudei a trabalhar. E é como seu eu fosse só uma parte de qualquer coisa muito grande que vai para além das pessoas conhecidas e chega às pessoas conhecidas dessas e a outras e para o passado e para o futuro.
Aparição
quinta-feira, abril 10, 2008
quarta-feira, abril 09, 2008
terça-feira, abril 08, 2008
caderninho
segunda-feira, abril 07, 2008
Antologia Improvável #298 - Francisco Costa (3)
PÓ
Juntei o pó que as horas no meu seio
deixaram; e depois, com o suor da face
e as lágrimas dos olhos, amassei-o
até que em barro mole se tornasse.
E entre acessos de júbilo e receio,
dei-lhe forma, tentei que se animasse
nos meus dedos viris; -- e bafejei-o
p'ra que o meu fogo interno o calcinasse.
Depois expu-lo à turba. E nesse instante
vi-o baço e minúsculo e imperfeito
sob outra luz, mais crua e penetrante.
Acalmei a vaidade. E agora sei
que, muito antes de em pó eu ser desfeito,
se desfará o pó que eu amassei.
Verbo Austero
Juntei o pó que as horas no meu seio
deixaram; e depois, com o suor da face
e as lágrimas dos olhos, amassei-o
até que em barro mole se tornasse.
E entre acessos de júbilo e receio,
dei-lhe forma, tentei que se animasse
nos meus dedos viris; -- e bafejei-o
p'ra que o meu fogo interno o calcinasse.
Depois expu-lo à turba. E nesse instante
vi-o baço e minúsculo e imperfeito
sob outra luz, mais crua e penetrante.
Acalmei a vaidade. E agora sei
que, muito antes de em pó eu ser desfeito,
se desfará o pó que eu amassei.
Verbo Austero
domingo, abril 06, 2008
sábado, abril 05, 2008
Caracteres móveis - Octave Mirbeau
A adoração do milhão!... É um sentimento baixo, comum não só aos burgueses, mas também à maior parte de nós, os pequenos, os humildes, os que não têm onde cair mortos neste mundo. Eu própria, apesar das minhas ideias desempoeiradas e das minhas ameaças de partir tudo, não lhe escapo... Eu, a quem a riqueza oprime, que lhe devo as minhas amarguras, os meus vícios, os meus ódios, as mais amargas de todas as minhas humilhações, os meus sonhos impossíveis e o martírio eterno da minha vida... eu própria, repito, assim que me encontro na presença de um rico não posso deixar de o olhar como um ser excepcional e belo, como uma espécie de divindade maravilhosa, e, mal-grado meu, para além da minha vontade e da minha razão, sinto subir do mais fundo de mim mesma para esse rico, tantas vezes imbecil e perigoso, como que um incenso de admiração.
Diário de uma Criada de Quarto
(tradução de Adelino dos Santos Rodrigues)
sexta-feira, abril 04, 2008
quinta-feira, abril 03, 2008
quarta-feira, abril 02, 2008
Antologia Improvável #297 - Rui Knopfli (4)
O FIO DA VIDA
Há homens que rezam na penumbra
das catedrais dolentes e há outros
que do alto das pontes olham
a escuridão rumorejante das águas.
Há homens que esperam na orla
marítima e outros arrastando-se
no viscoso esterco dos subterrâneos.
Há homens debruçados em pleno azul
e outros que deslizam sobre densos verdes;
há os desatentos na atenção e os que
espreitam atentamente a ocasião.
Há homens por fora e por dentro
do cimento armado, suspensos
das mil ciladas do quotidiano voraz;
de encontro aos muros, às paredes,
ao sol do meio-dia, ao visco da noite,
às sediças solicitações de cada instante.
Há a impotência poderosa da oração
e a obsessão amarga dos suicidas
e, de permeio, os que, porque hesitam,
porque ignoram, porque não crêem,
não oram, nem se suicidam
e se quedam ante a impossibilidade de destrinça
entre o fio da vida e a vida por um fio.
Mangas Verdes com Sal / Obra Poética
Há homens que rezam na penumbra
das catedrais dolentes e há outros
que do alto das pontes olham
a escuridão rumorejante das águas.
Há homens que esperam na orla
marítima e outros arrastando-se
no viscoso esterco dos subterrâneos.
Há homens debruçados em pleno azul
e outros que deslizam sobre densos verdes;
há os desatentos na atenção e os que
espreitam atentamente a ocasião.
Há homens por fora e por dentro
do cimento armado, suspensos
das mil ciladas do quotidiano voraz;
de encontro aos muros, às paredes,
ao sol do meio-dia, ao visco da noite,
às sediças solicitações de cada instante.
Há a impotência poderosa da oração
e a obsessão amarga dos suicidas
e, de permeio, os que, porque hesitam,
porque ignoram, porque não crêem,
não oram, nem se suicidam
e se quedam ante a impossibilidade de destrinça
entre o fio da vida e a vida por um fio.
Mangas Verdes com Sal / Obra Poética
terça-feira, abril 01, 2008
caderninho
A imensa maioria da gente subordina a opinião ao interesse, como norma de vida, raramente subordinando o interesse à opinião. Se, por infelicidade para tua pessoa, pertences ao número, bem pequeno, dos que subordinam o interesse à opinião, lembra-te daquela verdade, para não seres sempre vítima. Emílio Costa
Filosofia Caseira
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