sábado, maio 31, 2008

Dicionário das ideias desfeitas - L

LEITE, Manuela Ferreira - Não é tecnocrata, tem um pensamento político (levar a mão à boca para esconder o sorriso), preocupações sociais (agora as duas mãos) e muita pena dos pobrezinhos. É uma social-democrata (dobrar-se sobre si próprio para não estoirar de riso).

Dicionário das ideias desfeitas - P

PSD - É um partido interclassista onde cabem todos. Dos trabalhadores ao Compromisso Portugal. Gays também, mas só solteiros (foi pena o pragmático Passos Coelho ter perdido...).

outros tons - Sérgio Godinho, «Domingo no mundo»

taxonomia

Todos os meus cães da mesma raça, sendo outros, são também o mesmo.

sexta-feira, maio 30, 2008

acordes nocturnos

caderninho



Uma pessoa pode chegar aos sessenta anos sem fazer uma ideia do que é um carácter. Nada é mais oculto do que as coisas com que continuamente andamos na boca. Hugo von Hofmannsthal
Livro dos Amigos (tradução de José A. Palma Caetano)

O Vale do Riff - Ella Fitzgerald, feat. Lou Levy, «Mr. Paganini»

quinta-feira, maio 29, 2008

acordes nocturnos

Antologia Improvável #311 - Alfredo Guisado (2)

A CARRUAGEM REAL

Na minha antiga casa de jantar,
Juntei os meus brinquedos mais queridos.
Uma rosa no teto: era o luar;
As cadeiras, esfinges. Véus caídos...

A mesa era a montanha que elevava
O castelo real. Brasões ao centro.
Em baixo, a carruagem esperava
O velho rei que não cabia dentro.

Nas portas tinha vidros e cortinas.
E os cavalos com rodas pequeninas
Andavam, a correr, larga distância.

E ainda que meu sonho me adormeça,
É numa carruagem como essa
Que às vezes eu regresso à minha infância.

A Lenda do Rei Boneco / Líricas Portuguesas. 2.ª Série
(edição de Cabral do Nascimento)

O Vale do Riff - Tom Petty and The Heartbreakers, «Don't Come Around Here No More»

quarta-feira, maio 28, 2008

Figuras de estilo - José Régio

Nasci antes do tempo. A mim próprio me pergunto hoje se não teria antes nascido depois. A verdade é que muitas vezes ando de candeias às avessas com o tempo em que vivo, sem saber se lhe estou atrasado ou adiantado, -- e entre mim e o Tempo há entendimentos e lutas que não percebo muito bem eu próprio.


Confissão dum Homem Religioso

O Vale do Riff - U2, «With Or Without You»

terça-feira, maio 27, 2008

estampa CXXXVII

Jan Vermeer, A Carta
Rijksmuseum, Amsterdão

jornal

Estava tudo para acontecer ainda, quando lias o Diário de Lisboa, nesse tempo em que o herói das tiras era o Tio Carlos. As inundações de 67, o sismo de 69, o 25 de Abril de 74.
A vida já era complicada, mas eu não lhe ligava muito.

A vida é complicada e eu não lhe ligo nada. No fundo, só me apetece pegar de novo no Diário de Lisboa e ir à procura de mais uma aventura do Tio Carlos.

O Vale do Riff - The Who, «Won't Get Fooled Again»

segunda-feira, maio 26, 2008

Antologia Improvável #310 - Lourdes Borges de Castro (2)

A CONSCIÊNCIA

Nas poucas vezes em que saio à rua
Tenho a impressão de que caminho nua.
O meu passo é incerto e vacilante.
Sinto mil olhos por trás das vidraças
A devassar a alma de quem passa...
E oiço um riso frio, feroz, cortante...
Caminho devagar, descontrolada.
Confusa, inconfortável, perturbada,
Possuída de medo e de ansiedade.
Mas esses olhos, cheios de inclemência,
São os olhos da minha consciência:
Severos... porque sabem a verdade...

Eterna no Tempo

O Vale do Riff - The Mills Brothers, «I Ain't Got Nobody (And Nobody Cares For Me)»

domingo, maio 25, 2008

caderninho



Um coração tranquilo é a vida do corpo, / mas a inveja é a cárie dos ossos. Livro dos Provérbios - Colecção Salomónica
Bílblia Sagrada (Missionários Capuchinhos)

hype, hype...

sábado, maio 24, 2008

sexta-feira, maio 23, 2008

tardes

O sol ainda aquecia pelas sete
das tardes de Setembro. A praia
estava por nossa conta e não
queríamos voltar para casa.
Entrávamos na água com o
estrondo a ecoar no areal vazio.

Soltávamos insultos, a nós e
às nossas mães. Quebrávamos
os interditos cheios de inocência.

A vileza vinha longe.

O Vale do Riff - Stevie Wonder, «Superstition»

quinta-feira, maio 22, 2008

Figuras de estilo - Fernando Lopes-Graça

Classicismo, romantismo, simbolismo, futurismo, nacionalismo e todos os demais ismos passados, presentes e futuros, quando não são rótulos, são atitudes nossas a que a obra de arte, na sua realidade e na sua essência imediata, é absolutamente estranha, indiferente. Aceito, pois, o nacionalismo, como aceito todas as outras escolas, doutrinas e teorizações estéticas, desde que me apresentem obras que sejam apenas e simplesmente... obras de arte.


A Caça aos Coelhos e Outros Escritos Polémicos

acordes nocturnos


O Vale do Riff - Michael Brecker, «Delta City Blues»

quarta-feira, maio 21, 2008

Antologia Improvável #309 - Carlos de Oliveira (9)

BOLOR

Os versos
que te digam
a pobreza que somos
o bolor
nas paredes
deste quarto deserto
os rostos a apagar-se
no frémito
do espelho
e o leito desmanchado
o peito aberto
a que chamaste
amor.

Cantata / Trabalho Poético

O Vale do Riff - Jimmy Page, «Emerald Eyes»

terça-feira, maio 20, 2008

acordes diurnos

Que bem!..

Anda-se às voltas na blogosfera, e de repente topa-se com surpresas como esta: a minha filha Teresinha, num blogue dedicado ao atletismo...

O Vale do Riff - Van Der Graaf Generator, «Killer»

mais acordes nocturnos

caderninho


De Rusticus: ter tomado consciência de que tinha necessidade de educar o meu carácter e ocupar-me dele assiduamente; não ter caído na paixão da sofística; não ter composto tratados retóricos nem dessas obras que visam persuadir; não procurar impressionar as pessoas com uma ostentação de actividade ou beneficência; ter renunciado à retórica, à poesia, ao estilo demasiado elegante; não passear por casa de toga e interdizer-me tais vaidades; escrever com simplicidade as minhas cartas, como as que ele próprio escreveu de Sinuessa a minha mãe; estar sempre pronto, com os que foram bruscos ou indelicados, a responder à primeira chamada e reconciliar-me, desde que o desejassem; ler com muita atenção, sem me contentar com uma visita sumária; não conceder um pronto acolhimento às pessoas que tagarelam a torto e a direito; ter podido ler os livros que nos conservam as lições de Epicteto, livros que ele me emprestou da sua biblioteca. Marco Aurélio
Pensamentos para Mim Próprio (tradução de José Botelho)

acordes nocturnos

domingo, maio 18, 2008

acordes diurnos


imagem daqui

Antologia Improvável #308 - Augusto Casimiro

JOCONDA

Essa que deve ser silenciosa
Como um perfume embriagante e raro,
Doce -- como a tristeza vagarosa,
Alegre -- como o azul do céu mais claro...

Essa que é toda Amor, sendo incerteza,
Toda luz e mistério e graça e alma
-- Forma florida e vaga de Beleza,
Num sorriso divino, e triste e calma...

Essa que eu adivinho e, vaga, ondeia
pela minha emoção, na minha ideia,
No meu Amor, na minha arte e em mim;

Talvez seja -- quem sabe? -- a reflectida
Infinita saudade de outra Vida
Mais perfeita do que esta e de onde eu vim!


Primavera de Deus / Líricas Portuguesas - III Série
(edição de Cabral do Nascimento)

hype, hype...

sábado, maio 17, 2008

acordes nocturnos

chuva

e havia
aquelas tardes de
outono quando
a chuva aparecia
sem avisar a praia
convidava ao puro
repouso sem outra
coisa em mente que
não o escorregar da
areia por entre os
dedos à cadência de
cada onda a
estatelar-se com
estrondo


ficávamos
por ali, indiferentes
à moinha, gratos
pelo que a vida
nos dava, sem
pedir nada em
troca

sexta-feira, maio 16, 2008

acordes nocturnos

Caracteres móveis - Amos Oz

Quando o meu pai era criança, na Polónia, as ruas da Europa estavam cobertas de inscrições, tais como JUDEUS, VÃO PARA A PALESTINA!, e, às vezes, de outras menos amáveis: MALDITOS JUDEUS, VÃO PARA A PALESTINA! Quando o meu pai regressou à Europa, cinquenta anos depois, os muros estavam cobertos de incrições: JUDEUS, FORA DA PALESTINA!


Contra o Fanatismo
(tradução de Henrique Tavares e Castro)

O Vale do Riff - Talking Heads, «Psycho Killer»

quinta-feira, maio 15, 2008

quarta-feira, maio 14, 2008

Antologia Improvável # 307 - António Botto (5)

Por ti, eu passo as noites meditando
Lá onde o mar
Cantarolando e crescendo
Vem tombar sobre o meu corpo
E mo afaga lambendo...
Por ti, vivo na chama dos amores
Mais perversos.
E acho alegria nas dores,
E morro de saudade nos meus versos.
Por ti, me arrasto
De vício em vício -- que vibrante romaria! --
Até que a morte se lembre
De me levar, -- um dia.

Canções

O Vale do Riff - Mike Oldfield, «Taurus 1»



6 palavras

Pedem-me a T, dos Dias que Voam e o Paulo Cunha Porto , de As Afinidades Efectivas, seis palavras que me definam, com uma imagem, de preferência, a ilustrar.
O mar, instável, por vezes temperamental e desatento, outras vezes caloroso, sempre insubmisso, talvez ilustre o que em tempos fui. Hoje, contento-me, e como, em viver feliz entre os meus. Falta-me uma palavra, e essa pode ser «justiça». Ser justo, mesmo contra os meus impulsos e preconceitos, foi o que sempre tenho procurado, com mais ou menos êxito.
Agora acho que tenho de bater a cinco portas: Addiragram, Estrelícia Esse, Huckleberry Friend, Purpurina , Sofia . Não se esqueçam: seis palavras e uma imagem, se possível.

terça-feira, maio 13, 2008

Figuras de estilo - Ferreira de Castro

Três dias a navegar no mar de Bengala, com o Himalaia à esquerda e, à direita, lá ao começo do golfo esverdeado, a Ceilão de exuberantes florestas, o «Koroa» aponta, uma tarde, a nova terra. Divisa-se, primeiro, um alto farol e, mais adiante, cinzenta mancha à tona de água. É a Birmânia, país quase de lenda, cujas múltiplas expressões de vida ninguém, até hoje, conheceu integralmente.


A Volta ao Mundo
(foto: San-Payo)

O Vale do Rif - Louis Armstrong, feat. Edmond Hall & Trummy Young, «Muskrat Ramble»

capismo

Fred Kradolfer, capa para a colecção «Novelas "Inquérito"»
(n.º 11 - Georges Duhamel, Um Mártir)
Editorial Inquérito, Lisboa, 1940

domingo, maio 11, 2008

Janry e Tome (texto), Le Petit Spirou -- Fais de Beaux Rêves!

Antologia Improvável #306 - Maria Teresa Horta (5)

PERCA

Não há dor maior
que aquela de perder-te
nem na cor mais cor
que nos teus olhos

Nem na cidade
saudade que se invente
que seja mais saudade
que aquela de não ver-te

Jardim de Inverno / Poesia Completa - 1

hype, hype...

sábado, maio 10, 2008

Figuras de estilo - Miguel Real

[...] durante meia hora olhei Salazar nos olhos, ora dele me apiedando, um camponês vindo do princípio do século para endireitar o tempo torto do fim do Império, ora representando-o como um espectro cuja presença bloqueara Portugal [...]


O Último Minuto na Vida de S.

sexta-feira, maio 09, 2008

estampa CXXXVI

Júlio Pomar, Gadanheiro
Centro de Arte Manuel de Brito, Algés
(imagem daqui)

não?


E o Patinha Antão?...
...não?

O Vale do Riff - The Troggs, «Wild Thing»

quinta-feira, maio 08, 2008

caderninho



Procuramos por toda a parte o que está para lá das coisas, e o que encontramos são apenas coisas. Novalis
Fragmentos São Sementes (tradução de João Barrento)

Blog da semana

O meu amigo João Villalobos não tem emenda. O Abencerragem é blog da semana no Corta-fitas. O blogue agradece e o site meter também...
E um abraço cá do administrador!

O Vale do Riff - The Rolling Stones, «Get Off Of My Cloud»

quarta-feira, maio 07, 2008

Antologia Improvável # 305 - Alexandre O'Neill (8)

OLHO AZUL

Com modos práticos, mas finos,
vais tesourando às escondidas
esses canteiros femininos.

Mais corsário que jardineiro,
para o meio de muitas vidas
desejo impele o teu veleiro.

E exclamam elas, navegadas:
-- Esse olho azul é que é culpado!
Esse olho de azul transtornado
em nós, maternais, coitadas!...

E assim as tens, crucificadas
no teu celeste mau olhado...

Abandono Vigiado

O Vale do Riff - The Thad Jones / Mel Lewis Jazz Orchestra, «Once Around»

segunda-feira, maio 05, 2008

caderninho


O homem que não tem Capital, se é forte como o touro, carregará pelos ombros um fardo mais pesado. Se é laborioso como a formiga, verá a tarefa dobrada. Se é sóbrio como o burro, terá a alimentação reduzida. Paul Lafargue
A Religião do Capital (tradução de J. Mega)

O Vale do Riff - Sinéad O'Connor & The Chieftains, «The Foggy Dew»

domingo, maio 04, 2008

Não deixo que mais ninguém dispute estas lágrimas
(José do Carmo Francisco sobre Sandy Denny -- aqui)
foto: Anders Folke

Antologia Improvável # 304 - Ângelo de Lima (2)

SONETO

Pára-me de repente o pensamento
Como que de repente refreado
Na doida correria em que levado
Ia em busca da paz, do esquecimento...

Pára surpreso, escrutador, atento,
Como pára um cavalo alucinado
Ante um abismo súbito rasgado...
Pára e fica e demora-se um momento.

Pára e fica na doida correria...
Pára à beira do abismo e se demora
E mergulha na noite escura e fria.

Um olhar de aço que essa noite explora...
Mas a espora da Dor seu flanco estria
E ele galga e prossegue sob a espora.


Líricas Portuguesas - 2.ª Série
(edição de Cabral do Nascimento)

quinta-feira, maio 01, 2008